Continuous and bimonthly publication
ISSN (on-line): 1806-3756

Licença Creative Commons
8739
Views
Back to summary
Open Access Peer-Reviewed
Artigo Original

The Manchester Respiratory Activities of Daily Living questionnaire para o uso em pacientes com DPOC: tradução e adaptação cultural para a língua portuguesa falada no Brasil

The Manchester Respiratory Activities of Daily Living questionnaire for use in COPD patients: translation into Portuguese and cross-cultural adaptation for use in Brazil

Maíra Junkes-Cunha1, Anamaria Fleig Mayer2,3, Cardine Reis1, Abebaw M. Yohannes4, Rosemeri Maurici1

DOI: 10.1590/S1806-37562016000000029

ABSTRACT

Objective: To translate The Manchester Respiratory Activities of Daily Living (MRADL) questionnaire into Portuguese and to create a version of the MRADL that is cross-culturally adapted for use in Brazil. Methods: The English-language version of the MRADL was translated into Portuguese by two health care researchers who were fluent in English. A consensus version was obtained by other two researchers and a pulmonologist. That version was back-translated into English by another translator who was a native speaker of English and fluent in Portuguese. The cognitive debriefing process consisted in having 10 COPD patients complete the translated questionnaire in order to test its understandability, clarity, and acceptability in the target population. On the basis of the results, the final Portuguese-language version of the MRADL was produced and approved by the committee and one of the authors of the original questionnaire. Results: The author of the MRADL questioned only a few items in the translated version, and some changes were made to the mobility and personal hygiene domains. Cultural differences regarding the domestic activities domain were found, in particular regarding the item "Do you have the ability to do a full clothes wash and hang them out to dry?", due to socioeconomic and climatic issues. The item "Do you take care of your garden?" was questioned by the participants who lived in apartments, being modified to "Do you take care of your garden or plants in your apartment?" Conclusions: The final Portuguese-language version of the MRADL adapted for use in Brazil was found to be easy to understand and easily applied.

Keywords: Activities of daily living; Questionnaires; Translations; Pulmonary disease, chronic obstructive.

RESUMO

Objetivo: Traduzir para a língua portuguesa e fazer a adaptação cultural do questionário The Manchester Respiratory Activities of Daily Living (MRADL) para uso no Brasil. Métodos: A versão em língua inglesa do MRADL foi traduzida por duas pesquisadoras da área da saúde com fluência na língua inglesa. Uma versão de consenso foi obtida por outras duas pesquisadoras e uma médica pneumologista. Essa versão foi retrotraduzida para o inglês por um tradutor nascido em um país de língua inglesa e fluente em português. O processo de desdobramento cognitivo consistiu em testar a compreensão, a clareza e a aceitabilidade do questionário traduzido na população alvo, aplicando-o em dez indivíduos com DPOC. Com base nos resultados, foi realizada a formulação da versão brasileira do MRADL após sua aprovação pelo comitê e um dos autores do questionário original. Resultados: Poucos itens foram questionados pelo autor da escala original, e algumas modificações relacionadas aos domínios mobilidade e higiene pessoal foram realizadas. Foram observadas diferenças culturais quanto ao domínio atividades domésticas, em especial o item "Consegue lavar a roupa e estendê-la para secar?" devido a condições socioeconômicas e climáticas. O item "cuida do seu jardim?" foi questionado pelos participantes que moravam em apartamentos, sendo modificado para "cuida do seu jardim ou plantas em seu apartamento?". Conclusões: A versão final do MRADL, traduzido e adaptado para uso no Brasil, mostrou ser de fácil compreensão e aplicação.

Palavras-chave: Atividades cotidianas; Questionários; Traduções; Doença pulmonar obstrutiva crônica.

INTRODUÇÃO

A DPOC é caracterizada pela obstrução irreversível ao fluxo de ar nas vias aéreas, normalmente progressiva, e piora com a inalação de fumaça e gases nocivos.(1) Essa doença é prevenível e tratável, apresentando diversas manifestações sistêmicas como a disfunção muscular esquelética relacionada à diminuição da capacidade de exercí-cio que, associada à dispneia, tende a causar limitações na realização de atividades de vida diária (AVD).(2,3)

As limitações das AVD nesses indivíduos podem ser avaliadas pelo teste de caminhada de seis minutos, já que a distância percorrida é considerada um bom marcador da capacidade funcional.(4) No entanto, esse teste não identifi-ca em quais atividades específicas a limitação está presente e nem avalia a limitação das atividades realizadas com os membros superiores, os quais estão invariavelmente envolvidos nas AVD.

Poucas são as ferramentas validadas para avaliar a limitação das AVD em pacientes com DPOC. Os instrumentos disponíveis têm pouca aplicabilidade para pacientes gravemente limitados(5) ou são pouco sensíveis a mudanças após intervenções, como a reabilitação pulmonar.(6)

Yohannes et al.(7) desenvolveram o questionário The Manchester Respiratory Activities of Daily Living (MRADL), o qual tem sido utilizado como uma escala de incapacidade física em pacientes idosos com DPOC,(8) sendo composta por quatro domínios: mobilidade (7 itens), atividades na cozinha (4 itens), tarefas domésticas (6 itens) e atividades de lazer (4 itens). O MRADL tem a finalidade de avaliar a limitação das AVD em pacientes com DPOC. Sua pontua-ção varia entre 0 e 21, sendo que o escore máximo significa ausência de incapacidade física. Foi desenvolvido a partir da combinação e adaptação do Nottingham Extended Activities of Daily Living Questionnaire e do Breathing Problems Questionnaire.(7) O MRADL é válido, confiável, reprodutível, de fácil e rápida aplicação (dez minutos), além de fazer a distinção entre indivíduos com DPOC e idosos saudáveis e ser sensível à reabilitação pulmonar. (7,8) Apre-senta boa consistência interna (coeficiente alfa de Cronbach = 0,91),(7) sendo que baixos valores na pontuação final representam dificuldades nas AVD. Um escore ≤ 7,5 é considerado como preditor de mortalidade. (9) Porém, por se tratar de um instrumento desenvolvido originalmente na língua inglesa, o questionário MRADL deve ser traduzido e adaptado às circunstâncias sociais e culturais do local onde se pretende utilizá-lo.(10-13)

Com base nesse contexto, o presente estudo teve como objetivo a tradução para a língua portuguesa e a adapta-ção cultural do questionário MRADL para seu uso no Brasil.

MÉTODOS

A população do estudo foi intencionalmente composta por 10 pacientes de ambos os sexos, com diagnóstico de DPOC atendidos no ambulatório de pneumologia do Hospital Universitário da Universidade Federal de Santa Catari-na, em Florianópolis (SC), Brasil. Os critérios de inclusão foram os seguintes: ter diagnóstico prévio de DPOC por meio de espirometria segundo os critérios da Global Initiative for Chronic Obstructive Lung Disease(1) (relação VEF1/CVF < 0,70 após o uso de broncodilatador), apresentar estabilidade clínica dos sinais e sintomas da doença nas últimas quatro semanas, estar livre de infecção respiratória ou exacerbação da doença nos últimos três meses e ser capaz de compreender os procedimentos do estudo. Foram excluídos os pacientes que apresentaram outras doenças respiratórias que não DPOC, doenças inflamatórias sistêmicas, doença mental e/ou déficit de compreensão ou de linguagem que impedisse o sujeito de responder às perguntas do instrumento. Os sintomas e/ou estado de saúde foram avaliados por meio do COPD Assessment Test (CAT, Teste de Avaliação da DPOC),(14) e os pacientes também foram avaliados quanto aos sintomas de dispneia pelo escore da escala de dispneia modified Medical Research Council (mMRC)(15) para a classificação da gravidade da doença.

O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa com Seres Humanos da Universidade Federal de Santa Catarina (protocolo 800.310). A tradução e a adaptação cultural do MRADL seguiram os pressupostos publicados por Guillemin et al.(16) e Wild et al.(17) No Brasil, Felisbino et al. utilizaram essa metodologia para a tradução e adaptação cultural de um questionário sobre tosse crônica para a língua portuguesa falada no Brasil.(18)

As etapas realizadas para o processo de adaptação cultural foram seguidas rigorosamente conforme sugestões in-ternacionalmente aceitas(17): autorização e cessão de direitos de uso por um dos autores da escala original; tradução da língua inglesa para a língua portuguesa do MRADL; reconciliação; retrotradução; revisão e harmonização da retrotradução; aprovação do autor do MRADL; revisão da versão em português do MRADL por especialistas; desdo-bramento cognitivo; e reconciliação para a elaboração da versão final.

Primeiramente, foi realizada a tradução do MRADL da língua inglesa para o português por duas pesquisadoras bi-língues participantes do presente estudo e, em seguida, foi realizada uma reunião do comitê revisor para a confec-ção da primeira versão na língua portuguesa. Posteriormente, as principais dúvidas e dificuldades encontradas foram discutidas com o autor da escala, chegando-se a uma segunda versão.

Foi realizada a retrotradução dessa versão em português para o inglês por um tradutor nascido em país de língua inglesa e com fluência na língua portuguesa. Em seguida, foi realizada uma nova revisão pelo comitê revisor e ela-borada a segunda versão do MRADL para a língua portuguesa. A versão retrotraduzida para o inglês foi enviada a um dos autores do MRADL original para sua avaliação e, após sua aprovação, foi elaborada a terceira versão na língua portuguesa do MRADL. Essa versão foi revisada por um comitê de especialistas, composto por uma médica pneumologista bilíngue e duas tradutoras brasileiras com fluência na língua inglesa, que realizaram a tradução de forma independente, sendo posteriormente elaborada a quarta versão do MRADL em português. Com essa versão foi realizado o desdobramento cognitivo, aplicando-se o questionário aos participantes do estudo. Foram investigadas possíveis dúvidas e dificuldades em relação ao texto e, ao final dessa etapa, foi elaborada a quinta versão. Após a reconciliação, foi elaborada a versão final do MRADL na língua portuguesa (Figura 1).
 



O desdobramento cognitivo consistiu em uma prova preliminar, ou seja, um pré-teste a fim de evidenciar possíveis falhas na redação do questionário (complexidade das questões, imprecisão na redação, desnecessidade das ques-tões, constrangimentos ao informante, exaustão, etc.)(19) e oferecer soluções para facilitar seu entendimento. Para isso, foram escolhidos 10 indivíduos com DPOC, por pertencerem à população estudada,(19,20) com os quais foi reali-zada a aplicação do questionário traduzido com o objetivo de se avaliar a clareza e a precisão dos termos; a forma, o desmembramento e a ordem das questões e a introdução do questionário.(19) Nessa etapa também foram verifica-dos os seguintes elementos: fidedignidade (qualquer pessoa que o aplique obterá sempre os mesmos resultados); validade (os dados recolhidos são necessários à pesquisa); e operacionalidade (vocabulário acessível e significado claro).(20) Na visita, o estudo foi detalhadamente explicado, e os indivíduos que concordaram participar do estudo assinaram o termo de consentimento livre e esclarecido. Durante a visita, foram coletados dados antropométricos, foi realizada a espirometria para o diagnóstico da DPOC e foram aplicados o CAT e a escala mMRC. O MRADL foi apli-cado pela mesma pesquisadora a cada participante. Os indivíduos foram informados de que não deveriam se preo-cupar com a acurácia das respostas, mas apenas mostrar o que compreenderam, quais as dificuldades de cada per-gunta ou afirmação do questionário e sua aceitação ao mesmo. Durante as aplicações do MRADL, a avaliadora e o paciente ficaram a sós. A avaliadora leu as questões para os participantes, limitando-se a repetir a leitura quando necessário, mas sem explicá-las.

Ao final, na etapa de reconciliação, o comitê revisor e de especialistas reuniram-se para produzir a versão final do MRADL na língua portuguesa, sendo o instrumento revisto item por item. Foram discutidos os achados do desdobra-mento cognitivo entre os autores do estudo e o autor do questionário original, sendo realizadas as modificações pertinentes para a confecção da versão final do instrumento. Dessa forma, foi elaborada a versão final do instrumen-to adaptado para uso no Brasil. As etapas do estudo podem ser visualizadas na Figura 1.

RESULTADOS

Dos 10 pacientes entrevistados para a etapa do desdobramento cognitivo, 7 eram do sexo feminino, todos eram da raça branca e procedentes da grande Florianópolis. As características gerais, antropométricas e clínicas dos partici-pantes estão listadas na Tabela 1.
 



Durante a etapa de tradução do MRADL houve algumas dúvidas e sugestões para modificações, sendo que as cor-reções foram feitas mediante a aprovação do autor. O item "Do you cross roads?" foi modificado para "Do you cross the street?". O item "Do you wash and dry yourself?" foi modificado para "Do you carry out personal hygiene (brush your teeth, wash your face, comb your hair)?", ampliando o sentido da questão para a capacidade de o indivíduo realizar sua higiene pessoal em geral. Os itens alterados após a tradução da escala original podem ser visualizados na Tabela 2. Ainda nessa etapa, o item "Do you cross roads?" foi questionado pelos especialistas pelo fato de "ruas" e "estradas" serem consideradas os mesmos tipos de vias no Brasil, sendo modificado para "Do you cross the street?". "Do you wash and dry yourself?" foi primeiramente traduzido para "Você se lava e se seca?"; porém, as tradutoras discutiram e questionaram o autor da escala original devido à equivalência com o item "Do you have a bath?", sendo que ambos apresentam a finalidade de identificar a capacidade do indivíduo em conseguir tomar ba-nho. No entanto, "Do you have a bath?" significa tomar banho na banheira, o que não é muito comum no Brasil pelo fato de a maioria dos indivíduos não ter banheira. Portanto, esse item foi modificado para "Do you carry out personal hygiene (brush your teeth, wash your face, comb your hair)?", o que pode identificar a limitação ao realizar a higiene pessoal em geral.
 



Na retrotradução para a língua inglesa do MRADL, os seguintes itens sofreram modificações: "Do you walk around outside?" foi retrotraduzido como "Do you go hiking outdoors?"; porém, o autor sugeriu manter como consta na ver-são original. O item "Do you walk over uneven ground?", retrotraduzido como "Do you walk on irregular terrain?" foi mantido como na versão original porque o autor não concordou com a palavra "terrain", arguindo que mudaria o significado original da pergunta. O subtítulo referente ao domínio sobre atividades domésticas foi retrotraduzido para "home chores", não havendo mudança no seu significado na língua portuguesa. A retrotradução do item "Do you wash small items of clothing?" para "Do you wash small garments?" foi descartada pelo autor da escala original por considerar o termo "garments" inadequado.

A revisão do comitê de especialistas apontou alguns erros gramaticais e sugestões conceituais, sendo que o item "Do you walk around outside?" foi questionado quanto ao seu significado estar relacionado à mobilidade (confiança em sair de casa) ou à atividade física (caminhada), sendo esclarecido pelo autor que está relacionado a ambos como também à interação social e, portanto, foi modificado para "Do you walk outside the house?". O item "Do you do a full clothes wash?" foi modificado para "Do you have the ability to do a full clothes wash and hang them out to dry?" devido à questão socioeconômica, pois no Brasil nem todas as pessoas possuem máquina de lavar roupas, e à ques-tão climática, considerando que a maioria das pessoas penduram a roupa no varal para secar e não possuem má-quina para secar roupas. Os itens modificados após a revisão do comitê de especialistas estão listados na Tabela 3.
 



No desdobramento cognitivo, houve algumas dúvidas dos participantes com relação ao texto. O item "Do you get in and out of the car?" foi questionado pelo fato de alguns indivíduos apresentarem dificuldade em apenas umas dessas atividades. Todavia, o autor da escala original sugeriu que esse item fosse mantido, devendo já ser considerada como dificuldade apenas a existência de uma das atividades. No item "Do you bend over from standing?", houve necessidade de explicar e até simular o movimento, o qual foi modificado para "Do you bend over from standing position to pick up an object?" para melhor compreensão. O item "Do you do the washing up?" foi questionado pelo fato de essa atividade ser realizada majoritariamente pelas mulheres no Brasil por motivo cultural; porém, o autor sugeriu manter, sendo que esse item se refere à capacidade do sujeito em realizar a atividade, mesmo que não a faça frequentemente. Os itens "Do you wash small items of clothing?" e "Do you have the ability to do a full clothes wash and hang them out to dry?" foram mantidos e devem ser considerados mesmo que o paciente use a máquina de lavar, devendo ser avaliada a sua capacidade de colocar e retirar a roupa da máquina para pendurá-la no varal. Por último, o item "Do you manage your own garden?" foi questionado pelos indivíduos que moram em apartamento e não terem jardim, e percebeu-se que alguns indivíduos da amostra apresentariam um baixo escore total, sendo esse item então modificado para "Do you manage your own garden or flower pots in your apartment?" Os itens alterados após o desdobramento cognitivo podem ser visualizados na Tabela 4.
 



Na avaliação da última versão do MRADL, o autor original do instrumento sugeriu as seguintes modificações nas suas instruções: "This scale was elaborated" para "This scale is designed" e "Circle the most appropriate response that best describes you" para "Reply with one tick (√) that best describes you". A versão final traduzida para o portu-guês do Brasil do MRADL encontra-se no Quadro 1.
 



DISCUSSÃO

No presente estudo, foram realizadas a tradução para a língua portuguesa e a adaptação cultural do questionário MRADL para uso no Brasil, com algumas ressalvas e modificações.

Existem alguns instrumentos validados para avaliar a incapacidade funcional de pacientes com DPOC; porém, es-ses apresentam pouca aplicabilidade para pacientes gravemente limitados.(21) Esse fato justifica a importância do instrumento traduzido no presente estudo, pois o mesmo apresenta a finalidade de avaliar a limitação das AVD em indivíduos com DPOC, sendo capaz de identificar as limitações gerais, inclusive de indivíduos graves. Os indivíduos do presente estudo apresentaram uma média no escore do CAT e da escala de dispneia mMRC de 18,3 ± 7,9 pontos e 1,4 ± 0,9, respectivamente, o que demonstra a sua gravidade da doença, considerando que um escore CAT ≥ 10 e um escore mMRC ≥ 2 são indicativos de alto impacto dos sintomas.(1)

Entre os instrumentos disponíveis validados para uso no Brasil, poucos avaliam a limitação das AVD especifica-mente para pacientes com DPOC.(15,21-23) Um dos questionários desenvolvidos especificamente para avaliação das limitações nas AVD de pacientes com DPOC - Pulmonary Functional Status and Dyspnea Questionnaire - Modified version - é composto por três domínios (influência da dispneia nas AVD, influência da fadiga nas AVD e mudança nas AVD em comparação ao período anterior à doença).(23) Entretanto, esse instrumento não é adequado para a avaliação de indivíduos idosos e/ou gravemente limitados, pois apresenta perguntas referentes a tarefas mais com-plexas.

Há diferentes fatores que predizem o prognóstico em indivíduos com DPOC, tais como índice de massa magra, fre-quência de hospitalizações por exacerbações agudas e classificação de sintomas.(24) O teste de caminhada de seis minutos também é bastante utilizado(23); porém, seu uso é limitado por não avaliar a capacidade funcional de paci-entes mais graves. O MRADL se mostrou útil na avaliação da incapacidade física como um fator preditor de mortali-dade em indivíduos idosos com DPOC,(24) o que sugere maiores benefícios desse instrumento na prática clínica.

Dos pacientes entrevistados para a etapa do desdobramento cognitivo, 70% eram do sexo feminino, e todos eram procedentes da grande Florianópolis. Essa região concentra 18% do total da população do estado de Santa Catarina, que, nos últimos anos, apresentou baixa fecundidade e tendência ascendente do número de idosos; além disso, Santa Catarina possui uma maior proporção de pessoas do sexo feminino nessa faixa etária, fato que pode ser explicado devido à̀ maior exposição dos homens a um conjunto de fatores de riscos, como o uso do álcool, tabagis-mo e mortes violentas.(25) Portanto, a amostra do presente estudo parece não ser representativa da prevalência da DPOC, que é maior em homens.(26)

Uma das dificuldades encontradas foi em relação à diferenciação da resposta para cada AVD pelos indivíduos da amostra, pois alguns relataram não realizar algumas atividades porque alguém as fazia por eles e não por incapaci-dade de executá-las. Dificuldades de interpretação dos itens avaliados também são identificadas em outros estudos, e esses itens necessitam de adaptações de linguagem para se tornarem mais compreensíveis.(21,22)

Na última reconciliação dos especialistas para a elaboração da versão final do MRADL, foi sugerida a inserção de uma opção de resposta "não aplicável" para minimizar possíveis interpretações equivocadas das respostas, pois, no Brasil, as mulheres constituem mais de 90% de todos os trabalhadores domésticos, mostrando a sua predominância em comparação aos homens nesse setor.(27) Porém, essa sugestão não foi aceita pelo autor do instrumento original devido ao fato de que o objetivo principal desse é identificar os indivíduos gravemente acometidos pela DPOC e que isso prejudicaria o sistema de pontuação pela dificuldade em quantificar os resultados. Um estudo de validação se faz necessário a fim de avaliar seu uso, pontuação e escores para ambos os sexos. Talvez outro escore deva ser contemplado para os indivíduos do sexo masculino a fim de reduzir as limitações nos itens que compõem o domínio "atividades domésticas".

Em um estudo de tradução e adaptação transcultural(21) de outro instrumento para avaliar a incapacidade funcional de pacientes com DPOC, a escala London Chest Activity of Daily Living, foi elaborada uma pontuação alternativa para o item "não executo essa atividade (porque nunca precisei fazer isso ou é irrelevante)" a fim de desconsiderar as questões nas quais o paciente pontuaria zero e evitar que os homens que respondam ao instrumento apresentem um escore que não reflita sua real limitação funcional, identificando assim os indivíduos que não realizam determi-nadas atividades por outros motivos que não estão relacionados à doença pulmonar.

Os participantes do estudo, segundo os critérios utilizados no presente estudo, foram classificados como pacientes com DPOC grave (Tabela 1).(1) Isso impossibilitou a avaliação do MRADL quanto a sua aplicabilidade em indivíduos com doença leve. O objetivo do presente estudo foi realizar a tradução para a língua portuguesa e a adaptação cultural do questionário MRADL para uso no Brasil. Apesar de ser autoaplicável, optou-se por realizar a entrevista para receber as sugestões dos participantes. Para a sua aplicabilidade, está sendo realizado um estudo da avaliação da validação interna por meio da investigação da variabilidade interobservador e intraobservador,(28) bem como a avaliação de sua reprodutibilidade. Será determinada uma amostra por conveniência maior para essas etapas.(29)

Os comentários realizados pelos entrevistados sobre o instrumento foram bastante úteis. As sugestões foram perti-nentes e fundamentais para as modificações feitas. Dessa forma, o questionário MRADL encontra-se traduzido e adaptado para seu uso no Brasil. A versão final adaptada para a língua portuguesa mostrou-se simples e de fácil compreensão e aplicação, sendo esse um instrumento útil para avaliar as limitações físicas e predizer o prognóstico de indivíduos com DPOC.

REFERÊNCIAS

1. Global Initiative for Chronic Obstructive Lung Disease - GOLD [homepage on the Internet]. Bethesda: GOLD [cited 2015 Jan 21]. Global Strategy for the Diagnosis, Management, and Prevention of COPD Updated 2013. [Adobe Acrobat document, 99p.]. Available from: http://www.goldcopd.org/uploads/users/files/GOLD_Report_2013_Feb20.pdf
2. Garcia-Aymerich J, Lange P, Benet M, Schnohr P, Antó JM. Regular physical activity reduces hospital admission and mortality in chronic obstructive pulmonary disease: a population based cohort study. Thorax. 2006;61(9):772-8. http://dx.doi.org/10.1136/thx.2006.060145
3. Hamilton AL, Killian KJ, Summers E, Jones NL. Symptom intensity and subjective limitation to exercise in patients with cardiorespiratory disorders. Chest. 1996;110(5):1255-63. http://dx.doi.org/10.1378/chest.110.5.1255
4. Pitta F, Troosters T, Spruit MA, Probst VS, Decramer M, Gosselink R. Characteristics of physical activities in daily life in chronic obstructive pulmonary disease. Am J Respir Crit Care Med. 2005;171(9):972-7. http://dx.doi.org/10.1164/rccm.200407-855OC
5. Lareau SC, Carrieri-Kohlman V, Janson-Bjerklie S, Roos PJ. Development and testing of the Pulmonary Functional Status and Dyspnea Questionnaire (PFSDQ). Heart Lung. 1994;23(3):242-50.
6. Wedzicha JA, Bestall JC, Garrod R, Garnham R, Paul EA, Jones PW. Randomized controlled trial of pulmonary rehabilitation in severe chronic obstructive pulmonary disease patients, stratified with the MRC dyspnoea scale. Eur Respir J. 1998;12(2):363-9. http://dx.doi.org/10.1183/09031936.98.12020363
7. Yohannes AM, Roomi J, Winn S, Connolly MJ. The Manchester Respiratory Activities of Daily Living Questionnaire: development, reliability, validity and responsiveness to pulmonary rehabilitation. J Am Geriatr Soc. 2000;48(11):1496-1500.
8. Yohannes AM, Greenwood YA, Connolly MJ. Reliability of the Manchester Respiratory Activities of Daily Living Questionnaire as a postal questionnaire. Age Ageing. 2002;31(5):355-8. http://dx.doi.org/10.1093/ageing/31.5.355
9. Yohannes AM, Baldwin RC, Connoly MJ. Predictors of 1-year mortality in patients discharged from hospital following acute exacerbation of chronic obstructive pulmonary disease. Age Ageing. 2005;34(5):491-6. http://dx.doi.org/10.1093/ageing/afi163
10. Sousa TC, Jardim JR, Jones P. Validation of the Saint George's Respiratory Questionnaire in patients with chronic obstructive pulmonary disease in Brazil [Article in Portuguese]. J Pneumol. 2000;26(3):119-28. http://dx.doi.org/10.1590/S0102-35862000000300004
11. Mathias SD, Fifer SK, Patrick DL. Rapid translation of quality of life measures for international clinical trials: avoiding errors in the minimalist approach. Qual Life Res. 1994;3(6):403-12. http://dx.doi.org/10.1007/BF00435392
12. Ciconelli RM, Ferraz MB, Santos W, Meinão I, Quaresma MR. Brazilian-Portuguese version of the SF-36. A reliable and valid quality of life outcome measure [Article in Portuguese]. Rev Bras Reumatol. 1999;39(3):143-50.
13. Camelier A, Rosa F, Jones P, Jardim JR. Validation of the Airways questionnaire 20 - AQ20 in patients with chronic obstructive pulmonary disease (COPD) in Brazil [Article in Portuguese]. J Pneumol. 2003;29(1):28-35. http://dx.doi.org/10.1590/s0102-35862003000100007
14. COPD Assessment Test - CAT [homepage on the Internet]. Brentford (UK): GlaxoSmithKline; c2009 [cited 2015 Jan 21]. COPD Assessment Test. Available from: www.catestonline.org
15. Kovelis D, Segretti NO, Probst VS, Lareau SC, Brunetto AF, Pitta F. Validation of the Modified Pulmonary Functional Status and Dyspnea Questionnaire and the Medical Research Council scale for use in Brazilian patients with chronic obstructive pulmonary disease. J Bras Pneumol. 2008;34(12):1008-18. http://dx.doi.org/10.1590/S1806-37132008001200005
16. Guillemin F, Bombardier C, Beaton D. Cross-cultural adaptation of health-related quality of life measures: literature review and proposed guidelines. J Clin Epidemiol. 1993;46(12):1417-32. http://dx.doi.org/10.1016/0895-4356(93)90142-N
17. Wild D, Grove A, Martin M, Eremenco S, McElroy S, Verjee-Lorenz A, et al. Principles of Good Practice for the Translation and Cultural Adaptation Process for Patient-Reported Outcomes (PRO) Measures: report of the ISPOR Task Force for Translation and Cultural Adaptation. Value Health. 2005;8(2):94-104. http://dx.doi.org/10.1111/j.1524-4733.2005.04054.x
18. Felisbino MB, Steidle LJ, Gonçalves-Tavares M, Pizzichini MM, Pizzichini E. Leicester Cough Questionnaire: translation to Portuguese and cross-cultural adaptation for use in Brazil. J Bras Pneumol. 2014;40(3):213-21. http://dx.doi.org/10.1590/S1806-37132014000300003
19. Gil AC. Métodos e técnicas de pesquisa social. 6th edition. São Paulo: Atlas; 2010.
20. Marconi MA, Lakatos EM. Fundamentos de Metodologia Científica. 7th edition. São Paulo: Atlas; 2010.
21. Carpes MF, Mayer AF, Simon KM, Jardim JR, Garrod R. The Brazilian Portuguese version of the London Chest Activity of Daily Living scale for use in patients with chronic obstructive pulmonary disease. J Bras Pneumol. 2008;34(3):143-51. http://dx.doi.org/10.1590/S1806-37132008000300004
22. Dolan S, Varkey B. Prognostic factors in chronic obstructive pulmonary disease. Curr Opin Pulm Med. 2005,11(2):149-52. http://dx.doi.org/10.1097/01.mcp.0000153548.36054.8f
23. Takigawa N, Tada A, Soda R, Date H, Yamashita M, Endo S, et al. Distance and oxygen desaturation in 6-min walk test predict prognosis in COPD patients. Respir Med. 2007;101(3):561-7. http://dx.doi.org/10.1016/j.rmed.2006.06.017
24. Yohannes AM, Baldwin RC, Connolly M. Mortality predictors in disabling chronic obstructive pulmonary disease in old age. Age Ageing. 2002;31(2):137-40. http://dx.doi.org/10.1093/ageing/31.2.137
25. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística [homepage on the Internet]. Brasília: IBGE [cited 2015 Jan 21]. Available from: http://www.ibge.gov.br/home/
26. World Health Organization [homepage on the Internet]. Geneva: WHO; c2015 [cited 2015 Jan 24]. Chronic Respiratory Diseases [about 2 screens]. Available from: http://www.who.int/respiratory/copd/burden/en/
27. International Labour Office - ILO [homepage on the Internet]. Geneva: ILO; c2013 [cited 2015 Jan 24]. Domestic workers across the world: global and regional statistics and the extent of legal protection. [Adobe Acrobat document, 147p.]. Available from: http://www.ilo.org/wcmsp5/groups/public/---dgreports/---dcomm/---publ/documents/publication/wcms_173363.pdf
28. Bartlett W, Frost C. Reliability, repeatability and reproducibility: analysis of measurement errors in continuous variables. Ultrasound Obstet Gynecol. 2008;31(4):466-75 http://dx.doi.org/10.1002/uog.5256
29. Hopkins WG. Measures of reliability in sports medicine and science. Sports Med. 2000;30(1):1-15. http://dx.doi.org/10.2165/00007256-200030010-00001

Indexes

Development by:

© All rights reserved 2024 - Jornal Brasileiro de Pneumologia