Continuous and bimonthly publication
ISSN (on-line): 1806-3756

Licença Creative Commons
7975
Views
Back to summary
Open Access Peer-Reviewed
Artigo Original

Prevalência da infecção latente por Mycobacterium tuberculosis em pessoas privadas de liberdade

Prevalence of latent Mycobacterium tuberculosis infection in prisoners

Pedro Daibert de Navarro1,2, Isabela Neves de Almeida1, Afrânio Lineu Kritski3, Maria das Graças Ceccato4, Mônica Maria Delgado Maciel1, Wânia da Silva Carvalho4, Silvana Spindola de Miranda5

DOI: http://dx.doi.org/10.1590/S1806-37562016000000001

ABSTRACT

Objective: To determine the prevalence of and the factors associated with latent Mycobacterium tuberculosis infection (LTBI) in prisoners in the state of Minas Gerais, Brazil. Methods: This was a cross-sectional cohort study conducted in two prisons in Minas Gerais. Tuberculin skin tests were performed in the individuals who agreed to participate in the study. Results: A total of 1,120 individuals were selected for inclusion in this study. The prevalence of LTBI was 25.2%. In the multivariate analysis, LTBI was associated with self-reported contact with active tuberculosis patients within prisons (adjusted OR = 1.51; 95% CI: 1.05-2.18) and use of inhaled drugs (adjusted OR = 1.48; 95% CI: 1.03-2.13). Respiratory symptoms were identified in 131 (11.7%) of the participants. Serological testing for HIV was performed in 940 (83.9%) of the participants, and the result was positive in 5 (0.5%). Two cases of active tuberculosis were identified during the study period. Conclusions: Within the prisons under study, the prevalence of LTBI was high. In addition, LTBI was associated with self-reported contact with active tuberculosis patients and with the use of inhaled drugs. Our findings demonstrate that it is necessary to improve the conditions in prisons, as well as to introduce strategies, such as chest X-ray screening, in order to detect tuberculosis cases and, consequently, reduce M. tuberculosis infection within the prison system.

Keywords: Prisons; Tuberculin test; Latent tuberculosis, HIV.

RESUMO

Objetivo: Determinar a prevalência e os fatores associados à infecção latente por Mycobacterium tuberculosis (ILTB) em pessoas privadas de liberdade no Estado de Minas Gerais. Métodos: Estudo de coorte transversal realizado em duas penitenciárias em Minas Gerais. Foi realizada a prova tuberculínica nos indivíduos que aceitaram participar do estudo. Resultados: Foram selecionados 1.120 indivíduos para a pesquisa. A prevalência da ILTB foi de 25,2%. Na análise multivariada, a ILTB esteve associada com relato de contato com caso de tuberculose ativa dentro da penitenciária (OR ajustada = 1,51; IC95%: 1,05-2,18) e uso de drogas inaláveis (OR ajustada = 1,48; IC95%: 1,03-2,13). Foram identificados 131 pacientes sintomáticos respiratórios (11,7%). O teste anti-HIV foi realizado em 940 (83,9%) dos participantes, sendo positivo em 5 indivíduos (0,5%). Dois casos de tuberculose ativa foram identificados no período do estudo. Conclusões: A prevalência de ILTB dentro das penitenciárias estudadas foi alta. Além disso, a ILTB estava associada ao relato de contato com casos de tuberculose e ao uso de drogas inaláveis. Nossos achados demonstram que é necessária a melhoria das condições de encarceramento e a utilização de outras estratégias, como a triagem por radiografia de tórax, para a descoberta de casos de tuberculose e redução da infecção pelo M. tuberculosis no sistema penitenciário.

Palavras-chave: Prisões; Teste tuberculínico; Tuberculose latente; HIV.

INTRODUÇÃO

Em 2014, foram estimados 9,4 milhões de casos novos de tuberculose no mundo, sendo 12,0% coinfectados com HIV e a ocorrência de 1,5 milhão de mortes.(1) O Brasil é um dos 22 países que concentram aproximadamente 80,0% da carga global dessa enfermidade.(1) Minas Gerais é o quarto estado com o maior número de casos do país.(2) A principal estratégia mundial para o controle da tuberculose, proposta pela Organização Mundial da Saúde (OMS), denominada Stop TB,(1) destaca em um dos seus componentes a necessidade de promover ações de controle da doença para as pessoas privadas de liberdade (PPL) pelo alto risco da infecção latente por Mycobacterium tuberculo-sis (ILTB) e de desenvolvimento da tuberculose doença, pois esse é um grave problema de saúde pública nas insti-tuições penitenciárias.(3-6)

A presença da tuberculose no sistema prisional tem sido descrita como uma ameaça. Alguns autores sugerem que não será possível controlar a tuberculose na comunidade se não forem efetivas as ações para o seu enfrentamento nas unidades prisionais/penitenciárias (UP/Ps). Nesses locais, a tuberculose não se limita apenas às PPL, pois afeta também a comunidade com que se relacionam, familiares e funcionários dessas instituições, durante e após a deten-ção.(3,5-9) No Brasil, a incidência da doença no sistema penitenciário é 28 vezes maior que na população em geral.(10) A prevalência de ILTB também apresenta taxas elevadas nesses locais,(5,7-9,11-13) realidade ainda desconhecida na maioria das regiões brasileiras devido à inexistência de estudos.

A identificação de ILTB nas PPL deve ser priorizada para que medidas preventivas sejam adotadas, principalmente em grupos com condições associadas a elevados riscos de adoecimento nas UP/Ps, tais como soropositividade para o HIV, diabetes mellitus, doença renal crônica, uso de imunossupressores, entre outros.(6,9,14) O método para a iden-tificação de casos suspeitos da tuberculose deve ser estimado em cada cenário, dependendo do contexto local e dos recursos existentes.(3,8,9,15-17) As principais estratégias de triagem são baseadas em sintomas, radiografia de tórax e prova tuberculínica (PT).(3,8,9,14,15) Cada uma delas apresenta vantagens e limitações.(3,8,9,15-18) A busca ativa de indivíduos com tuberculose doença, por meio de triagem, deve ser realizada não somente no ingresso das PPL no sistema penitenciário, mas também após a sua entrada. O intuito dessa ação é examinar os indivíduos com maior probabilidade de apresentar a doença, como os sintomáticos respiratórios (SRs), identificar os casos bacilíferos e tratá-los adequadamente. Tais medidas interrompem a cadeia de transmissão e diminuem a incidência da doen-ça. (6,11,18) O objetivo do presente estudo foi estimar a prevalência e os fatores associados com a ILTB em PPL no principal polo prisional de Minas Gerais.

MÉTODOS

Delineamento do estudo

Trata-se de um estudo de corte transversal, realizado nas duas maiores UP/Ps (presos julgados), localizadas no principal polo prisional do Estado de Minas Gerais, no município de Ribeirão das Neves, e que representam 8,4% das PPL do estado. Foram incluídos no presente estudo 1.492 detentos (67,0% da PPL das UP/Ps incluídas e 5,8% da PPL do estado) (19-21) no período entre abril e junho de 2013. Os critérios de elegibilidade foram os seguintes: PPL sem história de tratamento anterior para tuberculose, sem tuberculose doença no momento do estudo e sem nunca ter realizado a PT.

Administração e medida da PT

Foi realizada a PT com PPD RT23 do M. tuberculosis, 2 unidades de tuberculina (State Serum Institute, Copenha-gue, Dinamarca) na dose de 0,1 ml pela técnica de Mantoux no antebraço esquerdo. A leitura ocorreu em 72 h após a aplicação da PT, com a medida do maior diâmetro transverso da enduração com régua milimetrada padronizada. A prova foi considerada positiva quando o diâmetro era ≥ 10 mm para indivíduos não infectados com HIV e ≥ 5 mm para aqueles infectados.(14) A prevenção com isoniazida foi indicada para todos as PPL com o risco de desenvolver tuberculose ativa.(6) A aplicação e a leitura da PT foram realizadas por profissionais treinados e certificados para sua participação em projetos de pesquisa.

Coleta e exames bacteriológicos

As amostras de escarro foram coletadas dos indivíduos com história de tosse, independentemente do tempo, para a realização de baciloscopia e cultura para micobactérias. O teste de identificação e de sensibilidade aos fármacos foi realizado caso a cultura fosse positiva, seguindo as normas laboratoriais da OMS.

Teste sorológico anti-HIV

O exame de sorologia para o HIV foi ofertado para todos os entrevistados, com aconselhamento pré- e pós-teste.(22) Os resultados positivos pelo método de ELISA foram confirmados pelo método de Western Blot.

Coleta de dados

Foram desenvolvidas ações educacionais e de sensibilização para a equipe de profissionais e as PPL a respeito do tema. Os indivíduos responderam a um questionário relacionado com as características sociodemográficas (idade, sexo, estado civil, escolaridade, profissão antes do ingresso e tempo de permanência no sistema prisional), compor-tamentais (uso de drogas lícitas e ilícitas, alcoolismo - avaliado pelo questionário de triagem Cut down, Annoyed by criticism, Guilty e Eye-opener -(23) tabagismo e contato com tuberculose pulmonar na penitenciária ou fora dela), história de saúde (tratamento anterior de tuberculose ativa, vacinação com BCG, infecção por HIV, presença de diabetes mellitus ou de outras enfermidades e uso de medicamentos) e sintomas sugestivos de tuberculose pulmonar (tosse, tempo de tosse, expectoração, hemoptise, febre, adinamia, cianose, anorexia, emagrecimento e sudorese noturna). Os prontuários de saúde disponíveis nas unidades foram consultados para elucidar informações incomple-tas.

Análise estatística

Foi realizada uma análise descritiva, segundo as características selecionadas, estratificadas por sexo, por meio de distribuição de frequências, assim como medidas de tendência central e de dispersão para as características elenca-das. O teste t de Student foi utilizado para comparar diferenças de médias para as variáveis contínuas, e o teste qui-quadrado de Pearson, para comparar proporções das variáveis categóricas. O programa IBM SPSS Statistics, versão 21.0 (IBM Corp., Armonk, NY, EUA) foi utilizado para a análise estatística, e os dados foram organizados em forma de tabelas. A magnitude da associação entre as variáveis explicativas selecionadas e o evento ILTB foi estimada por OR com IC95%. As variáveis com valores de p ≤ 0,25 no teste de Wald na análise univariada foram selecionadas manualmente para iniciar o modelo multivariado, utilizando o procedimento passo a passo com seleção para trás. O nível de significância exigido para a inclusão no modelo final das variáveis selecionadas foi de 0,05 para melhor ajustar potenciais fatores de confusão. Permaneceram no modelo final apenas as variáveis que demonstraram uma associação independente significativa com o evento de interesse. Foi utilizado o teste da razão de verossimilhança para comparar os modelos. A adequação dos modelos finais foi avaliada pelo teste de Hosmer-Lemeshow.

Diretrizes éticas

A pesquisa foi aprovada no Comitê de Ética da Universidade Federal de Minas Gerais sob o número 0617.0.203.000-09 em 5 de abril de 2010.

RESULTADOS

Características da população

A maioria das PPL aceitou participar do estudo (N = 1.431; 96,0%), sendo que 1.120 (78,0%) dessas foram incluí-das na amostra final. Do total de indivíduos excluídos (n = 311) da pesquisa, 68 (21,8%) realizaram a PT anterior-mente, enquanto, em 243 (78,1%), a PT não foi aplicada devido a um quadro anterior de tuberculose (35/243; 14,4%), tuberculose em tratamento (4/243; 1,6%), transferência para outra UP/P (13/243; 5,3%) ou recusa (191/243; 78,6%; Figura 1).
 



Na população (Tabela 1), a média de idade foi de 29 ± 7 anos, e a maioria possuía menos de 7 anos de escolari-dade (90,0%). O tempo de permanência no sistema prisional foi maior que 12 meses em 57,0% dos indivíduos en-trevistados, com média igual a 28 ± 25 meses. Em relação ao contato com tuberculose pulmonar, esse ocorreu fora e dentro do sistema prisional, respectivamente, em 10,0% e 15,0% dos casos. A proporção de tabagismo e alcoolismo pré-encarceramento foi de 61,1% e 24,8%, respectivamente. O uso de drogas ilícitas foi relatado por 75,0% dos detentos. Desses, 97,0% informaram o uso de drogas inaláveis, 2,0%, de injetáveis, e 1,0%, de inaláveis e injetá-veis.
 



As PPL relataram a presença de diabetes mellitus, de insuficiência renal crônica, de silicose e uso de medicamen-tos imunossupressores em 1,2%, 0,7%, 0,1% e 2,9% dos casos, respectivamente. O teste anti-HIV foi realizado em 83,9%, sendo que a positividade foi de 0,5%.

Na análise univariada, observou-se associações da ILTB com as seguintes variáveis: sexo, estado civil, contato com doente com tuberculose fora da penitenciária, alcoolismo pré-encarceramento, uso de drogas ilícitas inaláveis, diabetes mellitus, insuficiência renal crônica e uso crônico de corticoide e/ou imunossupressor (Tabelas 1 e 2).
 



Prevalência e fatores associados com a ILTB

A prevalência da ILTB foi de 25,2%. Na análise multivariada, a ocorrência de ILTB esteve associada com o relato de contato com doente de tuberculose dentro da penitenciária (OR ajustada = 1,51; IC95%: 1,05-2,18) e uso de drogas inaláveis (OR ajustada = 1,48; IC95%: 1,03-2,13; Tabela 2). A PT foi negativa em todos os indivíduos que tiveram o resultado do teste anti-HIV positivo.

Medidas de frequência de sintomas sugestivos de tuberculose latente e de tuberculose doença

O relato de pelo menos um dos sintomas sugestivos de tuberculose (tosse, emagrecimento, perda do apetite e dor torácica) ocorreu em 68,0% da população. A tosse e a perda de peso recente foram os sintomas mais comuns, as quais ocorreram em 27,0% e 25,0% dos entrevistados, respectivamente. Daqueles que relataram tosse, 43,0% apre-sentavam o sintoma por duas ou mais semanas, correspondendo a 131 indivíduos do total de PPL (11,7%). Dois casos foram diagnosticados com tuberculose, e as cepas eram sensíveis aos fármacos (rifampicina, estreptomicina, isoniazida e etambutol).

DISCUSSÃO

A magnitude da ILTB no sistema prisional brasileiro, como descrita anteriormente, é pouco conhecida. A prevalên-cia observada (25,2%) foi maior que as descritas em prisões de países como os EUA (17,0%),(24) Austrália (14,0%),(25) Itália (17,9%)(26) e no Estado do Mato Grosso do Sul no Brasil (20,8%). (13) Entretanto, essa foi menor que a identificada na Espanha (40,3%),(27) Suíça (46,9%)(28) e em outros estados no Brasil (Bahia, Mato Grosso do Sul e São Paulo), que variou de 30,9-61,5%.(29-31) Essas divergências realçam a necessidade de se estudar a ILTB em regiões diferentes. Não há estudos que apontem a prevalência da ILTB na região das UP/Ps selecionadas. Além do mais, os resultados do presente estudo têm importância não só para Minas Gerais, mas também para outras regiões do Brasil cujas UP/Ps possuem os mesmos cenários.

Apesar do debate a respeito da utilização da PT em locais onde há vacinação em massa por BCG, a OMS sugere a utilização desse teste para detectar a ILTB em locais onde a PT é preconizada, principalmente a ser utilizada em adultos. No presente estudo, entre os participantes, 89,2% haviam sido vacinados há mais de 10 anos (média de 30 anos). Portanto, a BCG provavelmente contribuiu pouco para a positividade da PT, pois a resposta ao teste é prati-camente nula após 8-10 anos de vacinação.(32,33) O uso da PT em pessoas que vivem com HIV e que não estão em uso de antirretrovirais pode ser negativo, pois a PT baseia-se na resposta imune do indivíduo(14); provavelmente, esse pode ser o motivo pelo qual não foi identificada a ILTB nos detentos recém-diagnosticados com a infecção pelo HIV.

Diversos fatores proporcionam um contexto favorável para o aumento da prevalência da ILTB em PPL.(11,30,34) Co-mo analisado, essa população é predominantemente formada de adultos jovens, provenientes de comunidades menos favorecidas socioeconomicamente e com altas taxas de tuberculose ativa. Entre outros elementos de maior risco para o adoecimento por tuberculose, a taxa de alcoolismo (24,8%) foi menor que a descrita em outros estudos (39,2-44,1%),(30) enquanto a de tabagismo (61,1%) foi semelhante.(30) O uso de drogas ilícitas inaláveis (97,0%) foi maior que o relatado por outros autores (25,2-45,2%), enquanto o de drogas injetáveis (2,0%) foi menor (7,5-13,1%).(27)

A infecção por HIV descrita nas PPL, de 0,5%, foi semelhante à média estimada para a população brasileira (0,4%)(35); porém, foi menor que a descrita por outros autores (1,0-11,3%).(18,27,34,36) Assim, é importante que se detecte a ILTB nessa população para que sejam tomadas as medidas de prevenção, pois esses indivíduos possuem de 8,0-10,0% de risco anual de desenvolver tuberculose ativa, bem como os usuários de drogas inaláveis. Já os não portadores do HIV possuem 10,0% de risco estimado de desenvolver a tuberculose ao longo da vida.(18,37)

O tratamento da ILTB nas PPL com diabetes mellitus, doença renal crônica ou sob o uso de imunossupressores não era adotado nas UP/Ps selecionadas, apesar de a terapia de prevenção estar indicada nesses grupos, considerados de elevado risco de adoecimento.(6,9,14)

Entre as condições do meio ambiente prisional que podem favorecer a disseminação da doença, destacam-se a limitação de exposição à luz solar,(5,6) a superlotação(5,6,8,18,30,34) e a ventilação inadequada.(5,6,30) Somam-se a esse contexto a ausência de capacitação da equipe de saúde prisional nas ações de controle da tuberculose(5) e a dificul-dade de acesso aos serviços de saúde nas UP/Ps.(30,34) Portanto, devem-se modificar as estruturas físicas das UP/Ps e capacitar a equipe da saúde para o controle da tuberculose.

No presente estudo foi encontrada uma maior chance de ILTB quando as PPL relataram contato com tuberculose doença, achado que também é descrito por vários autores.(3,13,34) Esse fato pode sinalizar uma maior percepção das PPL do risco sanitário relacionado à doença, uma vez que há uma maior frequência de tuberculose no ambiente.(38) Em relação ao uso de drogas ilícitas inaláveis, houve uma associação com a ILTB, o que não foi observado com o tabagismo; provavelmente o uso dessas drogas pode levar a maior dano tecidual e deficiência da ação mucociliar, que é a primeira proteção do organismo quando os bacilos entram nas vias respiratórias.(39)

A taxa esperada de pacientes SRs no Brasil é de 1,0% na população geral.(6) Nas PPL constatou-se uma proporção de SRs 11,7 vezes maior que na população geral; porém, menor que a descrita em outros estudos no Brasil (20,6-36,1%).(13,30,34) Isso pode ser explicado pelas precárias condições de infraestrutura das UP/Ps e os altos índices de tabagismo e de uso de drogas inaláveis.

Não há um consenso na literatura científica a respeito do mecanismo ideal para reconhecer as pessoas com maior chance de adoecer por tuberculose nas PPL. (5,6,9,15,16) Entretanto, a identificação da tosse crônica é utilizada como um instrumento de triagem.(15,16,36) Alguns autores relatam que somente esse sintoma não é relevante para a suspeição de tuberculose nessa população.(38) A busca de casos de tuberculose pulmonar deve incluir, preferencialmente, uma combinação de sintomas, ao invés de considerar somente a tosse crônica (febre, emagrecimento e astenia, por exemplo).(30,40) A abordagem dos sintomas é o único instrumento de triagem disponível na maioria das localidades onde os recursos são limitados.(5,6,8,15-18) Além disso, sintomas sugestivos de tuberculose podem não ser específicos onde há altas taxas de outras condições associadas com doenças respiratórias, como o tabagismo.(8)

Minas Gerais, a despeito de possuir a segunda maior população geral, apresenta a quarta menor taxa de incidên-cia da doença do país. As UP/Ps selecionadas, possivelmente, não apresentam as taxas elevadas de prevalência de ILTB e de tuberculose ativa encontradas por outros autores devido ao contexto epidemiológico local.

O presente estudo tem como limitação o fato de a coleta de dados sobre a exposição e o desfecho ter ocorrido si-multaneamente, dificultando o conhecimento da relação temporal existente entre eles e fornecendo uma visão estáti-ca da dimensão do problema. Outra limitação foi que as taxas de incidência de ILTB e tuberculose doença não foram avaliadas.

Concluímos que a prevalência de ILTB foi alta entre as PPL das duas maiores UP/Ps de Minas Gerais e que estava associada ao relato de contato com pacientes com tuberculose dentro dessas unidades e ao uso de drogas inaláveis. Os achados indicam que é necessária a melhoria das condições de encarceramento e a utilização de outras estraté-gias, como a triagem por radiograma de tórax, para a descoberta de casos de tuberculose e a subsequente redução da infecção pelo M. tuberculosis no sistema penitenciário.

AGRADECIMENTOS

Os autores agradecem aos participantes do Grupo de Pesquisa em Micobacterioses, às equipes do Laboratório de Pesquisa em Micobactérias da Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Minas Gerais e do Laboratório Central de Saúde Pública do Estado de Minas Gerais, Instituto Octávio Magalhães, Fundação Ezequiel Dias (FUNED), às Secretarias de Estado de Saúde e Defesa Social do Governo de Minas Gerais e ao Programa de Pós-Graduação em Saúde do Adulto da Faculdade de Medicina da mesma universidade federal.

REFERÊNCIAS

1. World Health Organization. Global tuberculosis report 2015. Geneva: World Health Organization; 2015
2. .Brasil. Ministério da Saúde. Portal da Saúde [homepage on the Internet]. Brasília: Ministério da Saúde [cited 2013 Jan 31]. Programa Nacional de Controle da Tuberculose: Apresentação Padrão. Available from: http://portal.saude.gov.br/portal/saude/profissional/area.cfm?id_area=1527
3. Organización Panamericana de la Salud (OPS). Plan Regional de Tuberculosis 2006-2015. Washington, DC: OPS; 2006.
4. World Health Organization. Working together with businesses: guidance on TB and TB/HIV prevention, diagnosis, treatment and care in the workplace. Geneva: World Health Organization; 2012.
5. Organización Panamericana de la Salud (OPS). Guía para el control de la tuberculosis en poblaciones privadas de libertad de América Latina y el Caribe. Washington, DC: OPS; 2008.
6. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Departamento de Vigilância Epidemiológica. Manual de recomendações para o controle da tuberculose no Brasil. Brasília: Ministério da Saúde; 2011.
7. Baussano I, Williams BG, Nunn P, Beggiato M, Fedeli U, Scano F. Tuberculosis incidence in prisons: a systematic review. PLoS Med. 2010;7(12):e1000381. http://dx.doi.org/10.1371/journal.pmed.1000381
8. Bone A, Aerts A, Grzemska M, Kimerling M, Kluge H, Levy M, et al. Tuberculosis control in prisons; a manual for programme managers. Geneva: World Health Organization; 2000.
9. Centers for Disease Control and Prevention (CDC); National Center for HIV/AIDS, Viral Hepatitis, STD, and TB Prevention. Prevention and control of tuberculosis in correctional and detention facilities: recommendations from CDC. Endorsed by the Advisory Council for the Elimination of Tuberculosis, the National Commission on Correctional Health Care, and the American Correctional Association. MMWR Recomm Rep. 2006;55(RR-9):1-44.
10. Brasil. Ministério da Saúde. Portal da Saúde [homepage on the Internet]. Brasília: Ministério da Saúde [cited 2015 Dec 8]. Programa Nacional de Controle da Tuberculose: Apresentação Padrão. Available from: http://portal.saude.gov.br/index.php/o-ministerio/principal/743-secretaria-svs
11. Aerts A, Habouzit M, Mschiladze L, Malakmadze N, Sadradze N, Menteshashvili O, et al. Pulmonary tuberculosis in prisons of the ex-USSR state Georgia: results of a nation-wide prevalence survey among sentenced inmates. Int J Tuberc Lung Dis. 2000;4(12):1104-10.
12. Nogueira PA, Abrahão RM. Tuberculosis infection and the length of stay of County Jails prisoners in the western sector of the city of São Paulo. Rev Bras Epidemiol. 2009;12(1):30-8. http://dx.doi.org/10.1590/S1415-790X2009000100004
13. Carbone Ada S, Paião DS, Sgarbi RV, Lemos EF, Cazanti RF, Ota MM, et al. Active and latent tuberculosis in Brazilian correctional facilities: a cross-sectional study. BMC Infect Dis. 2015;15:24. http://dx.doi.org/10.1186/s12879-015-0764-8
14. Targeted tuberculin testing and treatment of latent tuberculosis infection. This official statement of the American Thoracic Society was adopted by the ATS Board of Directors, July 1999. This is a Joint Statement of the American Thoracic Society (ATS) and the Centers for Disease Control and Prevention (CDC). This statement was endorsed by the Council of the Infectious Diseases Society of America. (IDSA), September 1999, and the sections of this statement. Am J Respir Crit Care Med. 2000;161(4 Pt 2):S221-47.
15. Lönnroth K, Corbett E, Golub J, Godfrey-Faussett P, Uplekar M, Weil D, et al. Systematic screening for active tuberculosis: rationale, definitions and key considerations. Int J Tuberc Lung Dis. 2013;17(3):289-98. http://dx.doi.org/10.5588/ijtld.12.0797
16. Golub JE, Mohan CI, Comstock GW, Chaisson RE. Active case finding of tuberculosis: historical perspective and future prospects. Int J Tuberc Lung Dis. 2005;9(11):1183-203.
17. Legrand J, Sanchez A, Le Pont F, Camacho L, Larouze B. Modeling the impact of tuberculosis control strategies in highly endemic overcrowded prisons. PLoS One. 2008;3(5):e2100. http://dx.doi.org/10.1371/journal.pone.0002100
18. Kendig N. Tuberculosis control in prisons. Int J Tuberc Lung Dis. 1998;2(9 Suppl 1):S57-S63.
19. Brasil. Ministério da Justiça. Departamento Penitenciário Nacional. Levantamento nacional de informações penitenciárias. Brasília: Ministério da Justiça; 2014. p. 17-21.
20. Ministério Público do Estado de Minas Gerais. [homepage on the Internet]. Belo Horizonte: o Ministério [cited 2016 Apr 1]. Presídio Dutra Ladeira está proibido de receber novos presos até regularizar superlotação. Available from: https://www.mpmg.mp.br/comunicacao/noticias/presidio-dutra-ladeira-esta-proibido-de-receber-novos-presos-ate-regularizar-superlotacao.htm.V777m_krLIV
21. Freitas CR. O cárcere feminino: do surgimento às recentes modificações introduzidas pela lei de execução penal. Rev Fac Arnaldo Janssen Direito. 2014;4(4):125-45.
22. Ministério da Saúde. Instrução Normativa n. 1.626, de 10 de julho de 2007. Regulamenta os procedimentos e condutas para a abordagem consentida a usuários que procuram os serviços de saúde com vistas a realizar testes de HIV e outras DST, bem como aos que não comparecem ao tratamento já em curso. Brasília: Diário Oficial da União; 2007.
23. Mayfield D, McLeod G, Hall P. The CAGE questionnaire: validation of a new alcoholism screening instrument. Am J Psychiatry. 1974;131(10):1121-3.
24. Lobato MN, Leary LS, Simone PM. Treatment for latent TB in correctional facilities: a challenge for TB elimination. Am J Prev Med. 2003;24(3):249-53. http://dx.doi.org/10.1016/S0749-3797(02)00583-4
25. Levy MH, Butler TG, Zhou J. Prevalence of Mantoux positivity and annual risk of infection for tuberculosis in New South Wales prisoners, 1996 and 2001. N S W Public Health Bull. 2007;18(7-8):119-24. http://dx.doi.org/10.1071/NB07051
26. Carbonara S, Babudieri S, Longo B, Starnini G, Monarca R, Brunetti B, et al. Correlates of Mycobacterium tuberculosis infection in a prison population. Eur Respir J. 2005;25(6):1070-6. http://dx.doi.org/10.1183/09031936.05.00098104
27. Marco A, Solé N, Orcau A, Escribano M, del Baño L, Quintero S, et al. Prevalence of latent tuberculosis in inmates recently incarcerated in a men's prison in Barcelona. Int J Tuberc Lung Dis. 2012;16(1):60-4. http://dx.doi.org/10.5588/ijtld.11.0007
28. Ritter C, Elger BS. Prevalence of positive tuberculosis skin tests during 5 years of screening in a Swiss remand prison. Int J Tuberc Lung Dis. 2012;16(1):65-9. http://dx.doi.org/10.5588/ijtld.11.0159
29. Ferreira MM, Ferrazoli L, Palaci M, Salles PS, Medeiros LA, Novoa P, et al. Tuberculosis and HIV infection among female inmates in São Paulo, Brazil: a prospective cohort study. J Acquir Immune Defic Syndr Hum Retrovirol. 1996;13(2):177-83. http://dx.doi.org/10.1097/00042560-199610010-00009
30. Lemos AC, Matos ED, Bittencourt CN. Prevalence of active and latent TB among inmates in a prison hospital in Bahia, Brazil. J Bras Pneumol. 2009;35(1):63-8. http://dx.doi.org/10.1590/S1806-37132009000100009
31. Estevan AO, Oliveira SM, Croda J. Active and latent tuberculosis in prisoners in the Central-West Region of Brazil. Rev Soc Bras Med Trop. 2013;46(4):515-8. http://dx.doi.org/10.1590/0037-8682-1441-2013
32. Menzies D, Gardiner G, Farhat M, Greenaway C, Pai M. Thinking in three dimensions: a web-based algorithm to aid the interpretation of tuberculin skin test results. Int J Tuberc Lung Dis. 2008;12(5):498-505.
33. Ruffino-Netto A. Interpretation of the tuberculin test [Article in Portuguese]. Rev Saude Publica. 2006;40(3):546-7. http://dx.doi.org/10.1590/S0034-89102006000300026
34. Kuhleis D, Ribeiro AW, Costa ER, Cafrune PI, Schmid KB, Costa LL, et al. Tuberculosis in a southern Brazilian prison. Mem Inst Oswaldo Cruz. 2012;107(7):909-15. http://dx.doi.org/10.1590/S0074-02762012000700012
35. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Departamento de DST, Aids e Hepatites Virais. Boletim Epidemiológico Aids e DST. Brasília: o Ministério; 2013.
36. Reichard AA, Lobato MN, Roberts CA, Bazerman LB, Hammett TM. Assessment of tuberculosis screening and management practices of large jail systems. Public Health Rep. 2003;118(6):500-7. http://dx.doi.org/10.1016/S0033-3549(04)50286-8
37. Smieja MJ, Marchetti CA, Cook DJ, Smaill FM. Isoniazid for preventing tuberculosis in non-HIV infected persons. Cochrane Database Syst Rev. 2000;(2):CD001363.
38. Diuana V, Lhuilier D, Sánchez AR, Amado G, Araújo L, Duarte AM, et al. Health in the prison system: representations and practices by prison guards in Rio de Janeiro, Brazil [Article in Portuguese]. Cad Saude Publica. 2008;24(8):1887-96. http://dx.doi.org/10.1590/S0102-311X2008000800017
39. Rich AR, editor. The Pathogenesis of Tuberculosis. Springfield: Charles C. Thomas Publisher; 1944.
40. Cain KP, McCarthy KD, Heilig CM, Monkongdee P, Tasaneeyapan T, Kanara N, et al. An algorithm for tuberculosis screening and diagnosis in people with HIV. N Engl J Med. 2010;362(8):707-16. http://dx.doi.org/10.1056/NEJMoa0907488

Indexes

Development by:

© All rights reserved 2024 - Jornal Brasileiro de Pneumologia