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Cartas ao Editor

Pneumotórax: entre a praia e a estratosfera

Pneumothorax: between the beach and the stratosphere

Eduardo Kaiser Ururahy Nunes Fonseca1, Adham do Amaral e Castro1, Yoshino Tamaki Sameshima1

DOI: http://dx.doi.org/10.1590/S1806-37562017000000079

AO EDITOR,

O estudo ultrassonográfico (US) do tórax é uma excelente ferramenta diagnóstica, capaz de caracterizar um amplo espectro de doenças e tendo aplicabilidade até intraoperatória e abordagens terapêuticas e de prognóstico.(1-3) O método sofreu grandes avanços na aquisição, no processamento de imagens e na questão da portabilidade.(1) O método é dinâmico, altamente disponível, sem radiação ionizante e não necessita de transporte do paciente e nem a mobilização de toda uma equipe multidisciplinar para a sua realização.(1,4)

O exame do tórax é feito preferencialmente com a combinação de transdutores lineares de alta frequência e convexos de baixa frequência (3-5 MHz), com o paciente em posição supina, realizando-se a varredura dos espaços intercostais e mobilizando-se o paciente no leito para a avaliação do dorso.(1) No contexto de trauma e/ou de pacientes instáveis, a US é focada para auxiliar no diagnóstico de pneumotórax e hemotórax.(2)

O eco pleural normal constitui-se de uma linha hiperecogênica que desliza em sincronia com a respiração. A partir dele, podem ser visualizadas linhas artefatuais; citamos, como exemplo, as linhas A, que são equidistantes, horizontais e paralelas ao eco pleural, representando artefatos de reverberação; e as linhas B, que são verticais, perpendiculares ao eco pleural, com aspecto de cauda de cometa (representam os septos interlobulares) e se movimentam junto com a linha pleural.(1)

No contexto do pneumotórax, podemos citar alguns critérios clássicos para seu diagnóstico(1): a não visualização da movimentação pulmonar com a respiração, uma vez que o ar preenche o espaço pleural e impede a visualização da movimentação da linha pleural; a ausência de visualização das linhas B, já que elas emergem da linha pleural, admitindo-se então que sua presença descarta o diagnóstico de pneumotórax; a presença do chamado "ponto pulmonar", que representa a visualização do pulmão aerado se expandindo no local do pneumotórax.(1,2,5) Ao modo M da US, a área no local do pneumotórax demonstra múltiplas bandas horizontais de artefatos hiperecoicos causados pela ausência de movimentação pulmonar. Esta aparência mimetiza um código de barras ("sinal do código de barras") ou mesmo a camada da estratosfera da atmosfera terrestre ("sinal da estratosfera"). No pulmão normal, o estudo ao modo M evidencia um padrão de movimentação com um aspecto de imagem semelhante à paisagem de uma praia ("sinal da praia").(2)

Outra indicação clássica e bem conhecida da US do tórax é na avaliação dos derrames pleurais, permitindo a detecção de conteúdos que não sejam totalmente anecogênicos e que podem denotar componente hemático ou purulento no interior do derrame. Mais que isso, a US do tórax já é um método incorporado na rotina das drenagens do tórax, evitando diversos acidentes, outrora inerentes ao procedimento.

Para ilustrar, tem-se o caso de um recém-nascido de 31 semanas, masculino, pesando 1.695 g, que apresentou no terceiro dia de vida piora do quadro respiratório, sendo submetido à US. Ao exame, evidenciou-se pneumotórax, com perda do deslizamento pulmonar normal, acentuação das linhas A e desaparecimento das linhas B. Ao modo M, notou-se o padrão de "estratosfera", com linhas paralelas e equidistantes à pleura (Figura 1). Também se evidenciou o "ponto pulmonar", representando o ponto de transição entre a região com e sem pneumotórax, achado considerado 100% específico.(1,2) Após o diagnóstico pela US, realizou-se a drenagem torácica em selo d'água com boa resposta.
 



Outras utilidades da US torácica incluem o acompanhamento de pneumonias, com a avaliação prognóstica de evolução para necrose e tempo de internação; seu uso em protocolos de reposição volêmica por meio da variação dinâmica do calibre da veia cava, principalmente em UTIs; a avaliação de pacientes com angústia respiratória na avaliação inicial, no controle evolutivo e como meio para guiar, de forma não invasiva e sem radiação ionizante, as manobras de recrutamento alveolar.(3,4) A US torácica é também um método já consagrado no contexto da avaliação de caso choque, como nos protocolos fluid administration limited by lung sonography (FALLS) e bedside lung ultrasound in emergency (BLUE),(3,5) nos quais a US é o método central e divisor de águas entre os diversos tipo de choque. Além de toda a avaliação pulmonar, a US do tórax pode ser utilizada também no arcabouço torácico, tendo excelente acurácia na avaliação de possíveis fraturas de costela e em uma breve avaliação geral do coração.(2)

Nunca é demais ressaltar que a US oferece um diferencial que poucos outros métodos de imagem apresentam: é inócua, dinâmica, pode ser feita à beira do leito, evitando o transporte de pacientes e seus riscos inerentes e, principalmente, não utiliza radiação ionizante, permitindo que possa ser utilizada como método de controle sem grandes restrições.

Em resumo, a US torácica é muito vantajosa, com alta acurácia diagnóstica de pneumotórax, estimulando-se, assim, sua maior utilização.

REFERÊNCIAS

1. Francisco Neto MJ, Rahal Junior A, Vieira FA, Silva PS, Funari MB. Avanços na ultrassonografia pulmonar. Einstein (Sao Paulo). 2016;14(3):443-8. https://doi.org/10.1590/S1679-45082016MD3557
2. Wongwaisayawan S, Suwannanon R, Sawatmongkorngul S, Kaewlai R. Emergency Thoracic US: The Essentials. Radiographics. 2016;36(3):640-59. https://doi.org/10.1148/rg.2016150064
3. Kaiser Ururahy Nunes Fonseca E, do Amaral E Castro A, Sameshima YT. Emergency Thoracic US. Radiographics. 2016;36(7):2238. https://doi.org/10.1148/rg.2016160152
4. Sameshima YT, Lourenço de Almeida JF, Silva MM, Remondini R, Haddad LB, Neto MJ, et al. Ultrasound-guided lung recruitment in a 3-month-old infant with acute respiratory distress syndrome. Ultrasound Q. 2014;30(4):301-5. https://doi.org/10.1097/RUQ.0000000000000072
5. Lichtenstein D. Lung ultrasound in the critically ill. Ann Intensive Care. 2014;4(1):1. https://doi.org/10.1186/2110-5820-4-1

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