Na primeira parte do nosso manuscrito foram descritos os dados anuais de todos os 861.901 casos de tuberculose pulmonar (TBP) de indivíduos, com 10 anos ou mais de idade, notificados no Brasil entre janeiro de 2003 e dezembro de 2014, conforme dispostos no Sistema de Informações de Agravos de Notificações do Ministério da Saúde do Brasil no dia 18 de outubro de 2016.(1) Tais dados mostraram uma redução do número total e de casos novos de TBP, bem como uma piora contínua nas taxas de cura, de recidiva de TBP, de TB multirresistente, de letalidade (morte por tuberculose entre pacientes com diagnóstico de TBP) e de abandono de tratamento.(1) Não foi selecionada uma amostra e, portanto, não há a possibilidade de um viés de seleção. Foram incluídos todos os dados oficiais disponíveis, ou seja, toda a população tratada no período.
Em seguida, foi utilizada uma ferramenta denominada análise de séries temporais interrompida (ASTI) para a verificação da existência ou não de uma associação entre a inquestionável piora dos números da TBP e as mudanças de tratamento implementadas em 2009.(2,3) Em nenhum momento usamos o termo "causalidade" citado na carta ao editor. A distinção entre "associação" e "causalidade" é bem descrita na literatura.(4)
A variável mais importante para avaliar o desfecho de tratamento de uma doença infecciosa é o próprio tratamento. Assim, essa premissa foi atendida em nosso estudo. Segundo Linden,(5) quando múltiplas observações de uma variável de desfecho estão disponíveis nos períodos pré e pós-intervenção, a ASTI oferece um delineamento de pesquisa quase-experimental com elevado grau de validade interna. Segundo a literatura, um dos pontos fortes da ASTI é a pouca interferência de variáveis típicas de confusão que permanecem razoavelmente constantes (por exemplo, variáveis socioeconômicas) ou mudam de forma lenta (por exemplo, cobertura de saúde da família ou tratamento supervisionado), pois essas variáveis são levadas em consideração no modelo de tendência de longo prazo. (6) Naturalmente, a utilização da população (e não de uma amostra) reforçou a validade de nosso estudo ao permitir o controle de variáveis de confusão omitidas no tratamento estatístico, rejeitando a hipótese de baixo poder estatístico do estudo. Na verdade, em função da sua robustez, a ASTI é utilizada para avaliar os efeitos de intervenções comunitárias, de políticas públicas e de ações regulatórias, e as revisões sistemáticas da literatura estão cada vez mais incluindo estudos que utilizaram ASTI como ferramenta de análise de dados.(7)
A falta de teste tuberculínico (usado para o diagnóstico de tuberculose latente) e a implementação do Xpert MTB/RIF (utilizado para o diagnóstico de pacientes com baciloscopia direta no escarro negativa) não prejudicam os desfechos de tratamento de pacientes com TBP ativa.
Na seção "Métodos" de nosso estudo,(1) pode ser visto que o intervalo de tempo considerado para a implementação das mudanças no tratamento foi de dezembro de 2009 a dezembro de 2010 (três meses após o período indicado pelos missivistas como o tempo final de implementação das mudanças).
A sugestão de que as inferências feitas em nosso artigo não poderiam ser feitas contrariam a literatura. (8) Na interpretação de um teste estatístico, a rejeição da hipótese de nulidade (ou seja, quando o valor de p é significativo) significa que as variáveis não são independentes (ou seja, há relação entre elas) e, consequentemente, o contrário é verdadeiro.(8) Assim, os termos utilizados em relação à inferência utilizada no texto estão absolutamente adequados e corretos.
A observação de intervalos de confiança que incluem a nulidade, mas apresentam valores de p menores que 0,05 (Figuras 2C e 2G), procede.(1) Porém, a conclusão a partir dessa observação está errada. É facilmente percebido que houve um erro tipográfico (não foi digitado o sinal negativo em "4,76"). Isso pode ser comprovado calculando o valor de p a partir do intervalo de confiança.(9) Ao colocar o sinal negativo (β = −8,20; IC95%: −11,58 a −4,76), encontramos o valor de p = 0,000003300, ou seja p < 0,0001, como descrito em nosso estudo, evidenciando que o intervalo relatado não inclui a nulidade. O mesmo ocorre na Figura 2G e na inclinação da reta onde os parâmetros são positivos (p = 0,00001356, ou seja, p < 0,0001). Assim, não houve interpretação equivocada ou limitações metodológicas em nosso estudo, e os dados analisados permitem todas as inferências e conclusões do artigo.
Agradecemos a revisão crítica do manuscrito, que nos permitiu dirimir dúvidas, esclarecer conceitos, abordar aspectos que não havíamos abordado e contribuir para o melhor entendimento da ASTI, aumentando significativamente a força das evidências científicas por nós apresentadas.
REFERÊNCIAS
1. Rabahi MF, da Silva Júnior JLRD, Conde MB. Evaluation of the impact that the changes in tuberculosis treatment implemented in Brazil in 2009 have had on disease control in the country. J Bras Pneumol. 2017;43(6):437-444. https://doi.org/10.1590/s1806-37562017000000004
2. Soumerai SB, Starr D, Majumdar SR. How Do You Know Which Health Care Effectiveness Research You Can Trust? A Guide to Study Design for the Perplexed. Prev Chronic Dis. 2015;12:E101. https://doi.org/10.5888/pcd12.150187
3. Wagner AK, Soumerai SB, Zhang F, Ross-Degnan D. Segmented regression analysis of interrupted time series studies in medication use research. J Clin Pharm Ther. 2002;27(4):299-309. https://doi.org/10.1046/j.1365-2710.2002.00430.x
4. Gordis L. Epidemiology. 2nd ed. Philadelphia: Elsevier Saunders; 2000.
5. Linden A. Conducting interrupted time series analysis for single-and multiple-group comparisons. Stata J. 2015;15(2):480-500.
6. Bernal JL, Cummins S, Gasparrini A. Interrupted time series regression for the evaluation of public health interventions: a tutorial. Int J Epidemiol. 2017;46(1):348-355. https://doi.org/10.1093/ije/dyw098
7. Cochrane Effective Practice and Organisation of Care (EPOC). London: EPOC; c2018 [cited 2018 May 20]. EPOC Resources for review authors, Interrupted time series (ITS) analyses. Available from: http://epoc.cochrane.org/epoc-specific-resources-review-authors
8. Smith LF, Gratz ZS, Bousquet SG. The Chi-Square Test: Hypothesis Tests for Frequencies. In: Smith LF, Gratz ZS, Bousquet SG, editors. The Art and Practice of Statistics. 1st ed. Belmont: Wadsworth Cengage Learning; 2009. p. 407-20.
9. Altman DG, Bland JM. How to obtain the confidence interval from a P value. BMJ. 2011;343:d2090. https://doi.org/10.1136/bmj.d2090