Primeiramente, gostaríamos de parabenizarmos Carvalho et al. pelo artigo publicado no JBP intitulado "Associação entre função pulmonar, força muscular respiratória e capacidade funcional de exercício em indivíduos obesos com síndrome da apneia obstrutiva do sono" (SAOS),(1) assunto de extrema importância para os profissionais que atuam nessa área; essa situação clínica afeta um grande número de pessoas, com impacto direto na qualidade de vida desses.
Uma importante observação a ser feita sobre o estudo citado(1) é que ele tem delineamento transversal, que não estabelece um fator causal, ou seja, não é possível saber se as alterações de função pulmonar e de força muscular respiratória são decorrentes da obesidade ou da SAOS isoladamente. Essa hipótese pode ser evidenciada no estudo de Melo et al.,(2) que avaliaram uma população de obesos e observaram reduções da capacidade pulmonar total e da CVF, acompanhadas de redução do VEF1; tais achados foram os mais representativos dentre as amostras, sugerindo a presença de padrão respiratório restritivo associado à obesidade. O que se percebe é que a diminuição da capacidade pulmonar já é uma característica da obesidade, mesmo sem sua associação com a SAOS.(2) O estudo de Tassinari et al.,(3) citado no estudo em questão,(1) relatou que não foram observados prejuízos à função pulmonar e à musculatura respiratória nos pacientes eutróficos com SAOS, havendo, inclusive, similaridades entre aquele grupo de pacientes e sujeitos saudáveis.
Outro fator também limitante da amostra são as patologias prévias, como, por exemplo, diabetes mellitus do tipo II; foi relatado no estudo de Punjabi et al.(4) que, independentemente da adiposidade, os distúrbios relacionados ao sono estão associados a prejuízos na sensibilidade à insulina e que a utilização do índice de massa corpórea como variável de avaliação, ou seja, sem diferenciação entre massa muscular e tecido adiposo, pode interferir nos resultados encontrados quanto à comparação do grau de obesidade de cada indivíduo.
Um achado a ser comentado é a falta de correlação da função pulmonar com o teste de caminhada de seis minutos naquela população,(1) uma vez que sua validade e reprodutibilidade já foram avaliadas em obesos, demonstrando que um aumento em 80 m na distância percorrida está relacionado à melhora clínica. Um possível fator para explicar tal achado foi demonstrado por Ucok et al.,(5) que compararam indivíduos com SAOS e indivíduos saudáveis: indivíduos com menor consumo máximo de oxigênio apresentaram fadiga prematura dos membros inferiores. Esse distúrbio do metabolismo muscular está associado a níveis elevados de ácido lático no sangue e à diminuição da capacidade de reduzir esses níveis em pacientes com distúrbios do sono durante o exercício.(5)
Cabe-nos destacar que os resultados obtidos podem ser incrementados com um novo delineamento metodológico e redefinição da população estudada, incluindo indivíduos sem associações com outras patologias, evitando-se, assim, um possível viés de seleção.
REFERÊNCIAS
1. Carvalho TMDCS, Soares AF, Climaco DCS, Secundo IV, Lima AMJ. Correlation of lung function and respiratory muscle strength with functional exercise capacity in obese individuals with obstructive sleep apnea syndrome. J Bras Pneumol. 2018;44(4):279-284. https://doi.org/10.1590/s1806-37562017000000031
2. Melo LC, da Silva MA, Calles AC. Obesity and lung function: a systematic review. Einstein (Sao Paulo). 2014;12(1):120-5. https://doi.org/10.1590/S1679-45082014RW2691
3. Tassinari CC, Piccin CF, Beck MC, Scapini F, Oliveira LC, Signori LU, et al. Capacidade funcional e qualidade de vida entre sujeitos saudáveis e pacientes com apneia obstrutiva do sono. Medicina (Rib Preto). 2016;49(2):152-9. https://doi.org/10.11606/issn.2176-7262.v49i2p152-159
4. Punjabi NM, Beamer BA. Alterations in Glucose Disposal in Sleep-disordered Breathing. Am J Respir Crit Care Med. 2009;179(3):235-40. https://doi.org/10.1164/rccm.200809-1392OC
5. Ucok K, Aycicek A, Sezer M, Genc A, Akkaya M, Caglar V, et al. Aerobic and anaerobic exercise capacities in obstructive sleep apnea and associations with subcutaneous fat distributions. Lung. 2009;187(1):29-36. https://doi.org/10.1007/s00408-008-9128-0