AO EDITOR,Mulher, 46 anos, não tabagista, asmática controlada, fazendo tratamento regular com associação de salmeterol e fluticasona por via inalatória até um ano antes, quando surgiram queixas de tosse, chiado no peito e dispneia aos médios esforços. Não havia histórico de perda de peso, hemoptise, dor torácica, exposição ambiental e/ou medicamentosa. Ao exame físico, o útero era palpável e firme, com fundo uterino entre a sínfise púbica e a cicatriz umbilical. O restante do exame físico foi normal. O exame de escarro, a bioquímica do sangue e os marcadores tumorais, incluindo CA 19-9 e CA 125, também estavam dentro da normalidade. Na espirometria foi identificado um quadro de obstrução leve com prova broncodilatadora positiva. A radiografia (Figura 1A) e a TC de tórax (Figuras 1B e 1C) evidenciaram numerosas opacidades nodulares arredondadas, mal definidas, confluentes, de diâmetros variados (2-10 mm) em ambos os pulmões. A broncoscopia não mostrou alterações. A citologia do lavado brônquico foi negativa para malignidade e agentes infecciosos. Foi realizada biópsia transbrônquica do lobo médio que demonstrou nódulos relativamente mal circunscritos, compostos de feixes entrelaçados de células fusiformes uniformes, com núcleos ovais e nucléolos inconspícuos, situados em um fundo de colágeno, com parênquima pulmonar adjacente comprimido (Figura 1D). O estudo imuno-histoquímico foi positivo para vimentina, actina de músculo liso e desmina, bem como para receptor de estrogênio e de progesterona, mas foi negativo para citoqueratinas e p63, confirmando a origem a partir do músculo liso uterino. O índice de proliferação do Ki-67 foi inferior a 5%, típico dos tumores benignos do músculo liso. Os achados histológicos e de imagem estabeleceram o diagnóstico de leiomioma metastático benigno (LMB). No momento da escrita da presente carta, a paciente está sendo submetida a tratamento hormonal com acetato de gosserrelina, mensalmente, sendo acompanhada ambulatorialmente e encontra-se em pré-operatório para cirurgia de histerectomia e ooforectomia.
O LMB pulmonar é uma condição rara, caracterizada por tumores benignos que ocorrem quando leiomiomas uterinos formam metástases para o pulmão. Geralmente é visto em mulheres em idade reprodutiva, com história de leiomioma uterino e submetidas à histerectomia, mas tumores pulmonares podem ocorrer na ausência de histerectomia em alguns casos, como no descrito aqui. Acredita-se que a disseminação metastática ocorra por via hematogênica. Os pulmões são o sítio metastático mais comum; porém, as metástases à distância podem ocorrer em outros órgãos, como linfonodos, sistema nervoso central, mediastino, ossos e coração.(1-4) Como a maioria dos tumores é assintomática, sua identificação costuma ser incidental em radiografias de tórax de rotina. Contudo, em alguns casos, podem cursar com tosse, hemoptise, dispneia e diminuição da função pulmonar. Os achados de imagem característicos do LMB pulmonar são múltiplos nódulos pulmonares de tamanhos variados, não ultrapassando uma dezena segundo a maior parte dos relatos de literatura. No entanto, eventualmente podem se apresentar como lesões císticas ou cavitárias, ou com padrão miliar.(2-4) O principal diagnóstico diferencial nesses casos são metástases de leiomiossarcoma uterino.(2) A biópsia cirúrgica com estudo imuno-histoquímico é o padrão ouro para o diagnóstico.(2,5) No nosso caso, o padrão histopatológico era bastante típico, com fascículos entrelaçados de células musculares lisas sem invasão vascular ou atipia celular e uma atividade mitótica muito baixa. Múltiplas opções de tratamento têm sido relatadas na literatura, incluindo observação cuidadosa, ressecção cirúrgica e terapia hormonal antiestrogênica. (2) O LMB tende a ter um curso indolente e um desfecho favorável, podendo ter regressão espontânea após a menopausa, embora as lesões pulmonares possam continuar a progredir, resultando em insuficiência pulmonar e até em morte.(2,4)
É interessante ressaltar que as lesões pulmonares na nossa paciente ocorreram concomitantemente ao leiomioma uterino, e não posteriormente, como é mais comumente relatado. Além disso, deve ser assinalada a profusão de pequenos nódulos confluentes, muito mais numerosos que os observados em relatos de literatura.
Em conclusão, o LMB deve ser incluído no diagnóstico diferencial de micronódulos e de nódulos pulmonares difusos em mulheres, sendo imperativo que o médico assistente investigue sintomas ou história ginecológica atual e pregressa de leiomiomas uterinos.
REFERÊNCIAS1. Fan D, Yi X. Pulmonary benign metastasizing leiomyoma: a case report. Int J Clin Exp Pathol. 2014;7(10):7072-5.
2. Taftaf R, Starnes S, Wang J, Shipley R, Namad T, Khaled R, et al. Benign metastasizing leiomyoma: a rare type of lung metastases-two case reports and review of the literature. Case Rep Oncol Med. 2014;2014:842801. https://doi.org/10.1155/2014/842801
3. Challa R, Irion KL, Hochhegger B, Shackloth M, Elsayed H, Gosney JR, et al. Large pulmonary masses containing varicose veins: a rare presentation of benign metastasizing leiomyomas. Br J Radiol. 2010;83(995):e243-6. https://doi.org/10.1259/bjr/49938718
4. Rege AS, Snyder JA, Scott WJ. Benign metastasizing leiomyoma: a rare cause of multiple pulmonary nodules. Ann Thorac Surg. 2012;93(6):e149-51. https://doi.org/10.1016/j.athoracsur.2011.12.047
5. GOTO T, MAESHIMA A, AKANABE K, HAMAGUCHI R, WAKAKI M, OYAMADA Y, ET AL. BENIGN METASTASIZING LEIOMYOMA OF THE LUNG. ANN THORAC CARDIOVASC SURG. 2012;18(2):121-4. HTTPS://DOI.ORG/10.5761/ATCS.CR.11.01688