ABSTRACT
Objective: To evaluate the results of resection of tumors of the thymus by robotic thoracic surgery, analyzing the extent of resection, postoperative complications, time of surgery, and length of stay. Methods: Retrospective study from a database involving patients diagnosed with a tumor of the thymus and undergoing robotic thoracic surgery at one of seven hospitals in Brazil between October of 2015 and June of 2018. Results: During the study period, there were 18 cases of resection of tumors of the thymus: thymoma, in 12; carcinoma, in 2; and carcinoid tumor, in 1; high-grade sarcoma, in 1; teratoma, in 1; and thymolipoma, in 1. The mean lesion size was 60.1 ± 32.0 mm. Tumors of the thymus were resected with tumor-free margins in 17 cases. The median (interquartile range) for pleural drain time and hospital stay, in days, was 1 (1-3) and 2 (2-4), respectively. There was no need for surgical conversion, and there were no major complications. Conclusions: Robotic thoracic surgery for resection of tumors of the thymus has been shown to be feasible and safe, with a low risk of complications and with postoperativeymoma; Thymus neoplasms; Thymectomy; Thoracic surgery; R outcomes comparable to those of other techniques.
Keywords:
Thymoma; Thymus neoplasms; Thymectomy; Thoracic surgery; Robotic surgical procedures.
RESUMO
Objetivo: Avaliar os resultados da ressecção de tumores tímicos por cirurgia torácica robótica, verificando a radicalidade da ressecção, complicações pós-operatórias, tempo de cirurgia e tempo de internação. Métodos: Estudo retrospectivo a partir de um banco de dados envolvendo pacientes com diagnóstico de tumor tímico e submetidos à cirurgia torácica robótica em sete hospitais no Brasil entre outubro de 2015 e junho de 2018. Resultados: Durante o período estudado, houve 18 casos de ressecção de tumores tímicos (timomas, em 12; carcinoma tímico, em 2; e tumor carcinoide tímico, sarcoma tímico de alto grau, teratoma tímico e timolipoma, em 1 cada). A média do tamanho das lesões foi de 60,1 ± 32,0 mm. Tumores tímicos foram ressecados com margens livres em 17 casos. As medianas (intervalos interquartis) de tempo de dreno pleural e de internação, em dias, foram 1 (1-3) e 2 (2-4), respectivamente. Não houve necessidade de conversão cirúrgica nem complicações maiores. Conclusões: A cirurgia torácica robótica para a ressecção de tumores tímicos demonstrou ser factível e segura, com baixo risco de complicações e desfechos pós-operatórios comparáveis aos de outras técnicas.
Palavras-chave:
Timoma; Neoplasias do timo; Timectomia; Cirurgia torácica; Procedimentos cirúrgicos robóticos.
INTRODUÇÃOTimomas e outros tumores do timo são neoplasias relativamente raras, e seu tratamento habitualmente envolve a ressecção do timo e da gordura mediastinal adjacente. Estão associados a síndromes paraneoplásicas, sendo a mais frequente a miastenia gravis, presente em aproximadamente um terço dos timomas.(1) O tratamento cirúrgico está indicado para o tratamento dos timomas estágios I e II, com sobrevida em 10 anos de 70-90%.(2) Nos estágios mais avançados e nos casos de recidiva tumoral está indicada a ressecção cirúrgica para o controle local da doença, associada à quimiorradioterapia.(3,4)
Na década de 1990, a cirurgia minimamente invasiva foi introduzida na cirurgia torácica, inclusive nas ressecções cirúrgicas mediastinais. O uso da técnica minimamente invasiva para timectomia foi motivado pela possibilidade de minimizar os efeitos deletérios tanto da anestesia geral prolongada quanto da dor pós-operatória causada pela toracotomia nos pacientes com miastenia gravis. Nesse contexto, estudos comprovaram ser factível a timectomia total por videotoracoscopia em pacientes portadores de miastenia gravis(5) e também para aqueles portadores de timomas estágios I e II.(6) Nos anos 2000, a cirurgia robótica surge como uma alternativa interessante, pois, além de oferecer as vantagens da cirurgia minimamente invasiva, é capaz de agregar ao desempenho cirúrgico maior amplitude de movimentos, redução de tremores nas mãos do cirurgião e maior precisão de movimento das pinças robóticas, além de proporcionar melhor visualização tridimensional do campo cirúrgico.(7,8)
A experiência em cirurgia torácica minimamente invasiva na América Latina, sobretudo no Brasil, tem se tornado mais sólida.(9) Entretanto, em contraste com a literatura referente a ressecções pulmonares,(10) faltam séries descrevendo resultados de ressecções de tumores tímicos por cirurgia robótica em nosso meio. O objetivo primário do presente estudo foi avaliar os resultados da ressecção de tumores tímicos com o auxílio da robótica, verificando a radicalidade da ressecção, complicações pós-operatórias, tempo de cirurgia e tempo de internação.
MÉTODOSEste é um estudo retrospectivo que incluiu pacientes com diagnóstico de tumor tímico submetidos a sua ressecção por meio de cirurgia torácica robótica. Todos os procedimentos foram realizados pelo mesmo grupo de cirurgiões em sete hospitais do Brasil, e o autor principal participou de todos, seja como cirurgião de console, seja na qualidade de proctor. A plataforma robótica utilizada foi o da Vinci® Intuitive Surgical System (Intuitive Surgical Inc., Sunnyvale, CA, EUA). Os hospitais incluídos foram os seguintes: Instituto do Câncer do Estado de São Paulo (SP), Hospital Sírio-Libanês (SP), Hospital Albert Einstein (SP), Hospital Nove de Julho (SP), Hospital São Luiz (SP), Hospital Copa Star (RJ) e Hospital Quinta D'Or (RJ). As cirurgias foram realizadas no período entre outubro de 2015 e junho de 2018.
Os dados foram levantados a partir de um banco de dados dedicado à cirurgia robótica e mantido por nossa equipe de cirurgiões torácicos. Incluímos todos os casos de tumores tímicos operados no período e excluímos apenas pacientes cujos prontuários não apresentassem informações quanto a dados sociodemográficos e tipos histológicos. Nossos critérios de elegibilidade para a ressecção robótica de tumores mediastinais foram as seguintes: avaliação clínica e anestésica liberando o paciente para o procedimento proposto; tumoração tímica; e ausência de sinais de invasão de estruturas adjacentes, como coração e vasos da base. A invasão do tumor no pericárdio e/ou pulmão não foi considerada uma contraindicação ao procedimento robótico. A Figura 1 mostra imagens tomográficas de 2 pacientes com tumorações tímicas.
A técnica cirúrgica usada foi baseada na descrição do estudo de Rueckert et al.(10) Por essa técnica, o acesso ao mediastino se dá preferencialmente pelo lado esquerdo do tórax (Figuras 2 e 3); porém, a posição do tumor pode ser um fator decisivo para a escolha do lado direito como acesso em alguns casos. O paciente é posicionado em decúbito dorsal e submetido a uma rotação contralateral de 30°. São realizadas três incisões cirúrgicas para os portais, que são usados para os braços robóticos (um para a ótica tridimensional e dois para as pinças robóticas), que são posicionados no 3º, 4º e 5º espaços intercostais (Figura 2). Também utilizamos um portal adicional para o cirurgião auxiliar, que permanece junto ao paciente durante a cirurgia.
O início da cirurgia se dá a partir da identificação do nervo frênico esquerdo (Figura 3A) e subsequente abertura da pleura mediastinal anterior a ele. Segue-se com a dissecção do tecido conjuntivo frouxo adjacente à lesão até a liberação completa das estruturas mediastinais, tais como pericárdio, aorta e veia inominada (Figura 3B). Pode ser realizada a ressecção completa do timo ou apenas a ressecção do tumor.(11)
As variáveis avaliadas no presente estudo estavam relacionadas à técnica cirúrgica (tempo de cirurgia e ressecção parcial do tecido tímico ou completa), desfechos perioperatórios (tempo de permanência na UTI, tempo de internação hospitalar, dias de dreno pleural e presença de complicações pós-operatórias) e radicalidade da ressecção.
O tempo total de cirurgia foi quantificado através do intervalo de tempo entre a incisão na pele até seu fechamento, incluindo os tempos cirúrgicos; incisão e confecção de portais cirúrgicos; docking do robô; tempo de console; e tempo de fechamento da parede torácica. Os tempos de dreno, de internação em UTI e de permanência hospitalar foram mensurados em dias a partir do dia (D) da cirurgia, sendo o dia da cirurgia denominado D0 e os subsequentes como D1, D2 e assim por diante. O dia da alta hospitalar foi considerado aquele no qual o paciente deixou o hospital, independentemente do horário da alta.
A radicalidade da resseção cirúrgica foi avaliada pelo relatório anatomopatológico. Foi considerada como ressecção R0 as peças cirúrgicas com margens livres ou margens coincidentes com estruturas não passíveis de ampliação da ressecção, por exemplo, esterno, superfície livre pleural ou pericárdio.(12) Os timomas foram estadiados conforme a classificação de Masaoka-Koga.(13)
Análise estatísticaAs variáveis contínuas são representadas em média e desvio-padrão ou mediana e intervalo interquartil (IIQ). As variáveis categóricas estão expressas em números absolutos e proporções. O erro tipo I foi definido como 5%.
RESULTADOSDurante o período de estudo (entre outubro de 2015 e junho de 2018), foram realizados 243 procedimentos robóticos por nosso grupo. Desses, 52 foram ressecções de lesões mediastinais, sendo 33 do mediastino anterior, das quais 18 correspondiam a tumores primários do timo.
Dos pacientes com tumores tímicos, a metade era do sexo masculino, e a média de idade dos pacientes foi de 47,0 ± 12,1 anos. Os tipos histológicos encontrados estão descritos na Tabela 1. A média do tamanho das lesões, conforme a descrição do estudo anatomopatológico, foi de 60,1 ± 32,0 mm.
A técnica cirúrgica empregada foi a descrita por Rueckert et al.,(10) a qual utiliza três braços do robô e um portal acessório para o portal auxiliar. Ainda que na técnica original o lado esquerdo seja preferencial para a abordagem do mediastino, a localização do tumor determinou que o posicionamento e acesso pelo robô fosse realizado pelo lado direito em 6 casos. A timectomia total associada à ressecção do tumor foi realizada em 9 pacientes. A mediana do tempo total de cirurgia e do tempo de console foram 130 min (IIQ: 90-156 min) e 72 min (IIQ: 52,5-102,5 min), respectivamente. Não foram observados acidentes intraoperatórios significativos, nem foram necessárias conversões para videocirurgia ou cirurgia aberta.
No pós-operatório os pacientes ficaram internados de 2-4 dias (mediana = 2 dias). A recuperação cirúrgica foi realizada em UTI, em 6 casos, com média de tempo de permanência de 1,1 dia. O tempo de drenagem variou de 1-3 dias (mediana = 1 dia).
A única complicação precoce observada em nossa série foi a elevação da cúpula diafragmática, em 2 casos (11%), porém, sem repercussão clínica para os pacientes. Um caso necessitou de reinternação devido a quilotórax diagnosticado um mês após a cirurgia, sendo o paciente tratado através de embolização de ducto torácico. Não houve nenhum óbito na presente série.
De todos os tumores ressecados, somente 1 caso de timoma apresentou margens comprometidas no relatório anatomopatológico (5%). Nesse caso, a margem foi coincidente focalmente com a área da neoplasia encapsulada e, ainda assim, foi optado por radioterapia adjuvante após discussão multidisciplinar. O paciente com tumor carcinoide tímico apresentou sinais de recidiva locorregional três meses após a cirurgia e foi submetido a tratamento sistêmico. No momento da escrita, o paciente aguardava novo tratamento local com cirurgia ou radioterapia. Quanto à ressecção de linfonodos, pelo menos uma cadeia linfonodal foi amostrada em 7 pacientes, com média de 3,4 linfonodos por paciente.
Os timomas foram descritos conforme a classificação de Masaoka-Koga(13) em 11 exames anatomopatológicos, sendo classificados como estádios I, em 6; IIa, em 4; e IVa, em 1. Nesse último caso, após o diagnóstico de tumor de mediastino anterior (Figura 4), o paciente foi submetido a duas abordagens cirúrgicas: a primeira foi abortada após a identificação de implantes pleurais e exame de congelação positivo para neoplasia, recebendo quimioterapia neoadjuvante com resposta parcial do tumor; a segunda foi realizada quatro meses após para a ressecção completa do timoma, que apresentava invasão local de pulmão e pleura.
Em nossa casuística, 4 pacientes receberam tratamento multimodal e quimioterapia neoadjuvante, sendo que 3 pacientes foram diagnosticados com timoma e 1, com carcinoma tímico. Outro paciente recebeu radioterapia adjuvante após a ressecção do timoma.
DISCUSSÃODemonstramos que a ressecção de tumores tímicos por cirurgia robótica é factível e segura. A implantação de uma técnica cirúrgica na prática diária é um desafio, pois se espera obter resultados comparáveis aos de centros onde a técnica já está consolidada, embora a experiência da equipe seja fundamentada na sua curva de aprendizado. Assim como nosso grupo, outros publicaram suas experiências em cirurgia robótica, com resultados semelhantes.(14,15)
A timectomia foi considerada a cirurgia de escolha no início do programa em cirurgia robótica por Brown et al.(16) devido à localização do timo no mediastino anterior. Apesar disso, somente 5 (10%) de nossos primeiros 50 procedimentos foram realizados para a ressecção de lesões no mediastino. Isso é explicado pelo fato de o programa de cirurgia torácica robótica ter sido inicialmente implementado no Instituto do Câncer do Estado de São Paulo, onde foi realizado um estudo prospectivo comparando lobectomia pulmonar por cirurgia torácica videoassistida e cirurgia torácica robótica,(17) durante o qual os cirurgiões do grupo obtiveram seu treinamento e experiência iniciais. Talvez isso tenha contribuído para que nosso tempo cirúrgico e os desfechos perioperatórios não fossem discrepantes dos de outros grupos com maior experiência em cirurgias mediastinais por cirurgia robótica.(18,19)
Seguindo a tendência atual, uma revisão sistemática publicada em 2018(20) propõe que a cirurgia minimamente invasiva, incluindo cirurgia torácica videoassistida e cirurgia torácica robótica, seja considerada a técnica de escolha no tratamento de tumores tímicos em estágio inicial, uma vez que a cirurgia minimamente invasiva está associada a menor tempo de permanência hospitalar, menor sangramento intraoperatório e melhor resultado estético. Mostramos em nosso estudo que a cirurgia robótica está associada a um curto período de drenagem pleural e de permanência hospitalar, com medianas de 1 e 2 dias, respectivamente. Por outro lado, a cirurgia minimamente invasiva não se mostrou inferior à cirurgia aberta em termos de complicações, taxa de recorrência local e sobrevida.(20) O tempo de seguimento dos pacientes não foi suficiente para a estimativa de resultados oncológicos em nosso estudo. Entretanto, o baixo risco de complicações foi reproduzido, com apenas 1 caso de quilotórax tardio, e nenhum paciente necessitou reoperação. Conforme evidenciado em estudos sobre complicações após linfadenectomia mediastinal, o quilotórax após cirurgia torácica apresenta boa resposta ao tratamento conservador ou à embolização por se tratar de fístula quilosa decorrente de colaterais do ducto torácico,(21) ou seja, de baixo débito.
Independentemente da via de acesso, é conhecida a importância da ressecção completa do tumor em termos de prognóstico(22); por isso, todo esforço deve ser direcionado para a ressecção em bloco do tumor e do tecido tímico circunjacente, evitando-se a manipulação direta, a fim de evitar a ruptura da cápsula e disseminação local do tumor. Em nossa série, somente 1 caso não apresentou margens livres após a análise histopatológica, revelando-se focalmente coincidente com a área encapsulada do tumor. O paciente recebeu radioterapia adjuvante e, no momento da escrita, não apresentava evidências de recidiva da doença 3 anos após a cirurgia. As vantagens técnicas da cirurgia robótica foram marcantes para a dissecção segura das estruturas mediastinais, notadamente dos pólos superiores do timo. A visão tridimensional e a tração através do uso da pinça de preensão no braço esquerdo do robô, associadas à capacidade de se realizar movimentos finos entre as estruturas cervicais delicadas, contribuíram para que não houvesse acidentes vasculares ou a necessidade de conversão cirúrgica em nossa série.
Conforme demonstrado em publicações anteriores, a ressecção de tumores tímicos de dimensões grandes por cirurgia robótica é segura e efetiva.(12,23) Em nossa série, foram ressecados tumores de grandes dimensões (maior diâmetro de 12,5 cm), corroborando a hipótese de que o tamanho não deve ser considerado uma contraindicação absoluta ao método. Atualmente, a maior limitação nos casos de lesões mediastinais é a invasão de estruturas vasculares, pois a utilização de robô não é comprovadamente segura nesses casos.
Embora a cirurgia torácica robótica tenha despertado grande interesse de muitos cirurgiões, o custo ainda é um fator limitante para a rápida propagação da técnica. Há custos em diversas esferas, incluindo os de aquisição do robô; de manutenção e compra de insumos, como pinças e materiais descartáveis; e de treinamento e habilitação específica do cirurgião para operar o robô. Apesar de alguns estudos mostrarem indícios de vantagem econômica da cirurgia robótica, é necessário que os bons resultados perioperatórios, como redução de complicações e de permanência hospitalar, contribua para a redução do custo total.(24) Isso está diretamente relacionado à experiência do cirurgião, que deve ultrapassar a curva de aprendizado e obter melhores resultados. Perspectivas futuras mostram a tendência de que mais instituições acreditem na evolução da tecnologia e, com isso, invistam na cirurgia robótica minimamente invasiva, o que contribui para a melhoria do atendimento dos pacientes. Paralelamente, cirurgiões torácicos estão motivados a se especializar para reproduzir resultados obtidos em centros já consolidados.
Podemos concluir, dessa forma, que a cirurgia torácica robótica é segura e factível no tratamento de tumores tímicos, apresentando baixo risco de complicações e curto período de internação hospitalar. A curva de aprendizado e o custo ainda são fatores limitantes para a disseminação da técnica, que tem um futuro promissor.
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