ABSTRACT
Objective: To analyze symptoms at different times of day in patients with COPD. Methods: This was a multicenter, cross-sectional observational study conducted at eight centers in Brazil. We evaluated morning, daytime, and nighttime symptoms in patients with stable COPD. Results: We included 593 patients under regular treatment, of whom 309 (52.1%) were male and 92 (15.5%) were active smokers. The mean age was 67.7 years, and the mean FEV1 was 49.4% of the predicted value. In comparison with the patients who had mild or moderate symptoms, the 183 (30.8%) with severe symptoms were less physically active (p = 0.002), had greater airflow limitation (p < 0.001), had more outpatient exacerbations (p = 0.002) and more inpatient exacerbations (p = 0.043), as well as scoring worse on specific instruments. The most common morning and nighttime symptoms were dyspnea (in 45.2% and 33.1%, respectively), cough (in 37.5% and 33.3%, respectively), and wheezing (in 24.4% and 27.0%, respectively). The intensity of daytime symptoms correlated strongly with that of morning symptoms (r = 0.65, p < 0.001) and that of nighttime symptoms (r = 0.60, p < 0.001), as well as with the COPD Assessment Test score (r = 0.62; p < 0.001), although it showed only a weak correlation with FEV1 (r = −0.205; p < 0.001). Conclusions: Dyspnea was more common in the morning than at night. Having morning or nighttime symptoms was associated with greater daytime symptom severity. Symptom intensity was strongly associated with poor quality of life and with the frequency of exacerbations, although it was weakly associated with airflow limitation.
Keywords:
Pulmonary disease, chronic obstructive; Signs and symptoms, respiratory; Quality of life; Disease progression; Brazil.
RESUMO
Objetivo: Analisar os sintomas em diferentes momentos do dia em pacientes com DPOC. Métodos: Estudo observacional multicêntrico de corte transversal em oito centros brasileiros. Foram avaliados os sintomas matinais, diurnos e noturnos em pacientes com DPOC estável. Resultados: Foram incluídos 593 pacientes em tratamento regular, sendo 309 (52,1%) do sexo masculino e 92 (15,5%) fumantes ativos. A média de idade foi de 67,7 anos, e a média de VEF1 foi de 49,4% do valor previsto. Os pacientes com sintomas mais graves (n = 183; 30,8%), em comparação com aqueles com sintomas leves e moderados, apresentaram pior nível de atividade física (p = 0,002), maior limitação ao fluxo aéreo (p < 0,001), exacerbações ambulatoriais (p = 0,002) e hospitalares (p = 0,043) mais frequentemente e piores resultados em instrumentos específicos. Os sintomas matinais e noturnos mais frequentes foram dispneia (em 45,2% e 33,1%, respectivamente), tosse (em 37,5% e 33,3%, respectivamente) e chiado (em 24,4% e 27,0%, respectivamente). Houve forte correlação da intensidade dos sintomas diurnos com sintomas matinais (r = 0,65, p < 0,001), sintomas noturnos (r = 0,60, p < 0,001), bem como com o escore do COPD Assessment Test (r = 0,62; p < 0,001); porém, houve uma correlação fraca com VEF1 (r = −0,205; p < 0,001). Conclusões: A dispneia foi mais frequente no período matinal do que no período noturno. Ter sintomas matinais e/ou noturnos foi associado à pior gravidade dos sintomas diurnos. A intensidade dos sintomas foi fortemente associada a pior qualidade de vida e frequência de exacerbações, mas fracamente associada à limitação ao fluxo aéreo.
Palavras-chave:
Doença pulmonar obstrutiva crônica; Sinais e sintomas respiratórios; Qualidade de vida; Progressão da doença; Brasil.
INTRODUÇÃOClassicamente, o manejo das doenças obstrutivas sempre foi fundamentado em informações clínicas.(1,2) No princípio do século 21, seguindo a proposta pela qual a espirometria era obrigatória para seu diagnóstico,(3) as principais diretrizes internacionais adotaram uma classificação de gravidade da DPOC baseada no grau de redução do VEF1.(3) A intenção nunca foi diminuir a importância da informação clínica; porém, na prática, foi o que ocorreu. É interessante notar que o consenso brasileiro não abriu mão de chamar a atenção para os sintomas como parte da atenção ao paciente.(4)
Nos últimos anos, tem-se enfatizado a importância de desfechos baseados no paciente em ensaios clínicos. Esta tendência se reflete na atual diretriz global, definindo a gravidade da DPOC com base em sintomas, função pulmonar e exacerbações.(5) Em paralelo, o arsenal medicamentoso alcançou grande incremento pela inclusão de diversos fármacos veiculados por diferentes dispositivos inalatórios, com características farmacológicas e farmacodinâmicas próprias. Finalmente, o conceito de medicina personalizada propõe que se identifique o padrão de sintomas e as preferências terapêuticas de cada paciente.
Vários artigos foram publicados, avaliando o comportamento dos sintomas em pacientes com DPOC no decorrer das 24 h do dia, em diferentes populações. (6-17) A maioria tem demonstrado que as queixas são mais frequentes no início da manhã. Outros estudos têm chamado a atenção para sintomas noturnos, como o de Miravitlles et al. de 2018, realizado em sete países latino-americanos.(15)
Considerando que o comportamento dos pacientes varia na dependência de múltiplos fatores, tais como culturais, motivacionais e climáticos,(18-20) é relevante conhecer o perfil sintomático dos pacientes no Brasil. Nesse contexto, o presente projeto se propôs, utilizando a mesma metodologia aplicada no estudo de Miravitlles et al.,(15) a caracterizar e determinar a prevalência e a gravidade dos sintomas no início da manhã, durante o dia e durante a noite em pacientes com DPOC estável no Brasil, assim como avaliar a correlação de cada sintoma com a gravidade da doença.
MÉTODOSO estudo denominado "A Study to Evaluate the Symptoms Over 24 Hours in Patients With Chronic Obstructive Pulmonary Disease - LASSYC Study (LASSYC-BR)", registrado no ClinicalTrials.gov (Identifier: NCT03381560), foi um trabalho observacional, multicêntrico, de coleta de dados transversal, sem intervenção, cujo objetivo foi caracterizar a prevalência e a gravidade dos sintomas desde o início das atividades regulares do dia até o momento de se deitar para dormir (sintomas diurnos), no início da manhã (sintomas matinais) e sintomas noturnos em pacientes com DPOC estável no Brasil. O estudo foi conduzido entre novembro de 2017 e junho de 2018, em oito centros de pesquisa, distribuídos nas regiões Sudeste e Sul e detalhados no Suplemento on-line (http://www.jornaldepneumologia.com.br/detalhe_anexo.asp?id=71; Figura S1), com a aprovação dos comitês de ética de cada local. Todos os pacientes forneceram consentimento informado por escrito.
Os pacientes estavam em acompanhamento ambulatorial e foram incluídos de forma consecutiva. Os critérios de inclusão e de exclusão estão detalhados no Suplemento on-line (Métodos S1).
Foram coletadas as seguintes informações de cada paciente, disponíveis nos prontuários médicos ou a partir de entrevistas na visita do estudo: dados demográficos, estilo de vida, história de tabagismo, comorbidades, nível de dispneia, gravidade da DPOC e história de exacerbações durante os 12 meses anteriores. Os pacientes forneceram dados sobre a sintomatologia relacionada à doença diurna, matinal e noturna, qualidade de vida relacionada à saúde e nível de atividade física.
O nível de dispneia foi mensurado pela escala de dispneia modificada do Medical Research Council (mMRC).(21) O nível de gravidade da DPOC foi quantificado pelo índice Body mass index, airflow Obstruction, Dyspnea, and Exacerbations (BODEx, índice de massa corpórea, obstrução ao fluxo aéreo, dispneia e exacerbações).(22) As comorbidades foram avaliadas pelo escore do COPD-specific COmorbidity TEst (COTE).(23) O COPD Assessment Test (CAT, Teste de Avaliação da DPOC) foi utilizado para definir o impacto da doença no estado de saúde.(24)
Os sintomas diurnos foram avaliados pelo questionário EXAcerbations of COPD Tool (EXACT)-Respiratory Symptoms (E-RS), desenvolvido para utilização em ensaios clínicos com o objetivo de avaliar a eficácia de intervenções terapêuticas em relação aos sintomas.(25,26) O E-RS avalia os sintomas ocorridos no dia anterior ao da visita do estudo, desde o início das atividades regulares até o momento em que o paciente se deitou para dormir.(25) O E-RS fornece um escore total, variando entre 0 e 40, e três subescalas: RS-dispneia (escala 0-17), RS-tosse e expectoração (escala 0-11) e RS-sintomas no peito (escala 0-12); quanto maior o escore, maior a intensidade dos sintomas.
Os sintomas matinais (no dia da visita do estudo, desde o momento em que os pacientes se levantaram da cama para iniciar suas atividades de vida diária até estarem prontos para as atividades de rotina) foram analisados pelo Instrumento dos Sintomas da DPOC no Início da Manhã.(27)
Os sintomas noturnos (entre o momento em que o participante da pesquisa se deitou na noite anterior até se levantar da cama para iniciar suas atividades no dia da visita do estudo) foram mensurados pelo Instrumento dos Sintomas Noturnos da DPOC (Suplemento on-line; Métodos S1).(28)
A intensidade dos sintomas diurnos foi classificada em leve, moderada ou grave, de acordo com a distribuição dos escores do E-RS em tercis. O questionário não possui níveis de corte pré-determinados.
No estudo de Miravitlles et al.,(15) a presença de sintomas matinais foi considerada significativa em caso de dispneia moderada, intensa ou muito intensa, associada a qualquer outro sintoma moderado, intenso ou muito intenso (definição 1). Com o objetivo de avaliar a influência de diferentes critérios de definição na prevalência dos sintomas, adotamos também uma segunda definição: pelo menos dois dos sintomas avaliados classificados como ao menos moderados ou um sintoma percebido como ao menos intenso (definição 2). Da mesma forma, para a análise dos sintomas noturnos significativos foram consideradas duas definições: qualquer despertar noturno (definição do estudo de Miravitlles et al.)(15); ou se houvesse a presença de, pelo menos, dois dos sintomas avaliados como ao menos moderado ou um sintoma percebido como ao menos grave. O nível da atividade física foi avaliado pelo Questionário Internacional de Atividade Física.(29)
Considerando o desfecho primário do estudo (frequência de sintomas matinais, diurnos e noturnos), foi realizado o cálculo do tamanho amostral baseado na estimativa de prevalência do desfecho em cada período. Considerou-se uma prevalência de 30-40% do desfecho, com erro estimado de 5%, intervalo de confiança de 95% e adição de 5% para possíveis perdas. Assim, foi estimada uma amostra de 600 pacientes.
Análise estatísticaForam realizadas análises descritivas apresentando frequências absolutas utilizando-se o teste do qui-quadrado de heterogeneidade para a descrição dos sintomas matutinos, diurnos e noturnos. Foi utilizada a correlação de Pearson para se obter o coeficiente de correlação dos escores de sintomas com VEF1. Todas as análises foram realizadas com o pacote estatístico Stata, versão 15.1 (StataCorp LP, College Station, TX, EUA).
RESULTADOSPacientesForam incluídos 593 pacientes, cujas características demográficas e clínicas estão apresentadas na Tabela 1. A média de idade foi de 67,7 ± 9,0 anos. A média de VEF1 foi de 49,4% ± 17,5% do valor previsto. Na amostra, 92 pacientes (15,5%) eram fumantes ativos e 102 (17,2%) relataram ter diagnóstico concomitante de asma. Resultados completos dos questionários de sintomas estavam disponíveis em 565 pacientes.
Características dos pacientes de acordo com os sintomas diurnosHouve um equilíbrio na distribuição dos pacientes em relação a sintomas diurnos leves, moderados e graves. Em comparação com os pacientes com sintomas leves e moderados, aqueles com sintomas respiratórios graves apresentavam mais frequentemente baixo nível de atividade física (p = 0,002), dispneia mais grave pela escala mMRC (p < 0,001), maior limitação ao fluxo aéreo (p < 0,001), piores escores no CAT e BODEx (p < 0,001 para ambos) e maior prevalência de exacerbações ambulatoriais e hospitalares no último ano (p = 0,002 e p = 0,043, respectivamente; Tabela 1).
Prevalência e intensidade de sintomas matinais e noturnosOs sintomas mais frequentes foram dispneia, tosse e chiado (Figura 1). A prevalência dos sintomas matinais e noturnos foi semelhante, com exceção da dispneia. Na amostra geral, as proporções de sintomas matinais foram tosse, em 37,5%; chiado, em 24,4%; dispneia, em 45,2%; aperto no peito, em 15,7%; congestão no peito, em 20,6%; e dificuldade em expelir catarro, em 17,5%. Quanto aos sintomas noturnos, as proporções foram tosse, em 33,3%; chiado, em 27,0%; dispneia, em 33,1%; aperto no peito, em 18,3%; congestão no peito, em 19,5%; e dificuldade em expelir catarro, em 18,8%. Embora a maioria dos sintomas tenha sido relatada como leve ou moderada, aproximadamente 10% dos pacientes qualificaram a dispneia como intensa ou muito intensa (matinal, em 10,1%; e noturna, em 8,5%).
Dos 593 pacientes da amostra, 120 (20%) relataram dispneia moderada, intensa ou muito intensa, associada a qualquer outro sintoma matinal moderado, intenso ou muito intenso (definição 1). Quanto aos sintomas noturnos, 107 (18%) pacientes relataram, ao menos, um despertar noturno por sintomas associados à DPOC.
Considerando-se a definição 2 (pelo menos, dois dos sintomas avaliados como ao menos moderados ou um sintoma percebido como ao menos intenso), 182 pacientes (31%) e 171 (29%) tinham sintomas matinais e noturnos significativos, respectivamente.
Características dos pacientes com sintomas matinais ou noturnosOs pacientes que relataram dispneia moderada, intensa ou muito intensa, associada a qualquer outro sintoma matinal moderado, intenso ou muito intenso (definição 1), eram mais jovens, apresentavam escores maiores de COTE, mMRC, CAT e BODEx, e referiram um maior número de exacerbações ambulatoriais no último ano (p < 0,001 para todos).
Os pacientes que referiram despertar noturno devido à DPOC (definição 1) eram mais jovens, com escores maiores de mMRC e CAT (p < 0,001 para todos) e escore maior no BODEx (p = 0,001; Tabela 2).
Utilizando os critérios da definição 2, foi observado o seguinte comportamento (Suplemento on-line; Tabela S1): os pacientes com sintomas matinais eram mais jovens (p < 0,001), predominantemente do sexo masculino (p = 0,022), com maiores escores de COTE, mMRC, CAT e BODEx (p < 0,001 para todos), com pior função pulmonar determinada por VEF1 (p = 0,015) e maior número de exacerbações ambulatoriais no último ano (p < 0,001).
Pacientes com sintomas noturnos eram mais jovens (p = 0,039), predominantemente do sexo feminino (p = 0,044), com maiores escores de COTE e mMRC (p = 0,013 e p < 0,001, respectivamente), piores escores de CAT e BODEx (p < 0,001 para ambos), e maior número de exacerbações ambulatoriais (p < 0,001) e hospitalares (p = 0,021) no último ano. A função pulmonar não diferiu entre os pacientes com ou sem sintomas noturnos.
Relação entre a intensidade dos sintomas diurnos e a presença de sintomas matinais e noturnosFoi detectada uma forte relação entre a presença de sintomas matinais e noturnos e a intensidade dos sintomas diurnos, utilizando-se a definição 1. Em 76,1% dos pacientes sintomáticos matinais, houve relato de sintomas graves durante o dia contra apenas 21,4% dos que não tinham sintomas matinais. Similarmente, 64,7% dos pacientes sintomáticos noturnos relataram sintomas graves durante o dia, comparados com 25,3% dos que não tinham sintomas noturnos. Entre os que apresentavam sintomas matinais e noturnos, cerca de 90% tiveram sintomas graves durante o dia, contra menos de 20% dos que não tinham sintomas matinais ou noturnos (Figura 2). O mesmo nível de relação foi detectado pelas análises utilizando a definição 2 (Suplemento on-line; Figura S2).
Correlações entre a intensidade dos sintomas diurnos e a presença de sintomas matinais e noturnos, bem como características da DPOCA matriz de correlação entre algumas características da DPOC e o escore global do E-RS estão apresentados na Tabela 3. Todas as variáveis tiveram correlação próxima ou maior do que 0,6 (moderada a alta) pelo escore global E-RS - CAT (r = 0,62; p < 0,001); escore de gravidade dos sintomas matinais (r = 0,65; p < 0,001); e escore de gravidade de sintomas noturnos (r = 0,60; p < 0,001) - com exceção da função pulmonar (r = −0,21; p < 0,001). Além disso, o escore CAT teve boa correlação com a gravidade dos sintomas matinais e noturnos. Uma correlação muito alta entre os escores de gravidade de sintomas matinais e noturnos (r = 0,83; p < 0,001) também foi observada.
Pacientes com diagnóstico concomitante de asma eram mais jovens e em sua maioria, mulheres e com maior índice de massa corpórea. Com exceção dessas características e da CVF em % do previsto, não houve diferenças estatísticas em nenhum outro parâmetro.
DISCUSSÃODemonstramos que uma considerável parcela dos pacientes com DPOC estável mantém-se sintomática. A forte relação entre as queixas matinais e noturnas, assim como a intensidade dos sintomas durante o dia, sugerem que os sintomas atuem no comportamento clínico durante as 24 h do dia. Esses resultados indicam que uma anamnese dirigida que investigue essa variabilidade possa ajudar na definição de uma proposta terapêutica individualizada.
Trinta por cento dos pacientes com DPOC estável, em tratamento clínico regular, reportaram sintomas diurnos graves. Uma considerável parcela relatou sintomas matinais ou despertar noturno em decorrência de queixas respiratórias. A dispneia foi a manifestação mais comum, sendo que a matinal foi 12% mais frequente que a noturna, e 10% dos pacientes qualificaram a dispneia como intensa ou muito intensa.
Nossos resultados foram semelhantes aos obtidos no estudo de Miravitlles et al.,(15) a despeito do predomínio de homens no estudo latino-americano (61% vs. 52%) e maior prevalência de asma em nossa população (17,2% vs. 4,5%). Recentemente, Soler-Cataluña et al.(14) reportaram que os sintomas e seu impacto sobre a qualidade de vida foram menos acentuados em espanhóis que em pacientes de outros países europeus. A maior proporção de homens na coorte espanhola foi aventada como uma das possíveis explicações para a diferença, já foi sugerido que o impacto da DPOC seria maior em mulheres.(30) Quanto à asma, o comportamento sintomático em nossos pacientes não diferiu em relação aos 82,8% que não tinham um diagnóstico associado de asma e DPOC, sugerindo que a asma não interferiu no padrão de variabilidade das queixas respiratórias.
Diversos autores publicaram, nos últimos anos, estudos avaliando a variabilidade dos sintomas em pacientes com DPOC estável em diferentes regiões(6-17); sintomas matinais foram relatados em 37-81% das amostras, ao passo que sintomas noturnos foram relatados em 25-68%. Várias são as explicações para essa disparidade, entre elas, a heterogeneidade no delineamento dos estudos,(31) o método de avaliação dos sintomas e diferenças de comportamento entre pacientes de diferentes locais.(18,19,32)
Ao adotarmos duas formas de gradação de sintomas, demonstramos a importância do método de avaliação sobre sua prevalência. A dispneia matinal foi relatada por 20% de nossos pacientes quando o critério foi o de dispneia moderada, intensa ou muito intensa, associada a qualquer outro sintoma moderado, intenso ou muito intenso. Essa prevalência passou para 31% pela simples modificação dos critérios para, pelo menos, dois sintomas avaliados como ao menos moderados ou um sintoma percebido como ao menos intenso. Da mesma forma, a prevalência de sintomas noturnos variou entre 18% e 29% pela mudança desses critérios, respectivamente.
Uma forte associação entre a presença de sintomas matinais e noturnos e a intensidade dos sintomas durante as 24 h do dia foi detectada. Uma correlação muito alta entre os escores de gravidade de sintomas matinais e noturnos também foi observada. Por outro lado, a correlação entre sintomas e grau de limitação ao fluxo aéreo, embora estatisticamente significante, foi discreta. Esses dados estão em acordo com os de outras publicações,(6-17) ressaltando a importância da avaliação da sintomatologia dos pacientes e a baixa relação entre o grau de alterações espirométricas e os sintomas.
Uma das forças de nosso estudo foi caracterizar o comportamento sintomático de pacientes com DPOC no Brasil, com um tamanho amostral adequado. Quanto aos aspectos metodológicos, ressaltamos que o presente estudo é um dos poucos da literatura internacional no qual foram utilizados questionários validados de avaliação da sintomatologia matinal e noturna.(31)
Devemos considerar algumas limitações. Da mesma forma que todos os outros estudos publicados sobre a variabilidade de sintomas no decorrer do dia, ressaltamos que se trata de uma análise observacional transversal. Também, a exemplo dos outros estudos, avaliamos a variabilidade dos sintomas respiratórios apenas, sem investigar manifestações extrapulmonares. Outra limitação está relacionada à distribuição dos centros participantes da pesquisa, todos atendendo pacientes em nível secundário e terciário, e localizados nas regiões Sudeste e Sul do país, o que limita a generalização dos achados. Finalmente, durante a coleta dos dados, houve variações na disponibilidade de medicações na maioria dos centros. Embora os pacientes incluídos estivessem há dois meses sem mudanças nas prescrições de medicação, alguns não estavam usando seu esquema habitual de manutenção. De qualquer forma, essas limitações não influíram no principal resultado de nosso estudo, que corroborou a importância da avaliação da variabilidade da sintomatologia no decorrer do dia em nossa população.
Os mecanismos responsáveis por essa variabilidade sintomática não estão esclarecidos. O ritmo circadiano provavelmente tenha influência. Em indivíduos sadios é reconhecido que o VEF1 sofre uma redução de aproximadamente 150 mL no decorrer da noite,(33) e uma redução semelhante foi relatada em pacientes com DPOC.(34) Especula-se que essas variações possam contribuir para a manifestação de sintomas noturnos e matinais.
Nossos dados têm implicações clínicas evidentes. Profissionais de saúde estão habituados a questionar pacientes com DPOC sobre sua sintomatologia. Entretanto, não é costumeiro serem indagados ou informar sobre o período do dia em que as queixas prevalecem, nem o impacto que essas têm sobre suas atividades e bem-estar. Uma parcela considerável dos pacientes permanece sintomática apesar de tratamento adequado, seguindo as diretrizes. É possível que, para alguns, uma personalização terapêutica reconhecendo particularidades dos momentos piores de sintomatologia nas 24 horas do dia resulte em uma melhora sintomática.
Quando atendemos nosso paciente, valemo-nos de um conjunto de informações; avaliamos e quantificamos seus sintomas, a frequência e a intensidade das exacerbações, o comportamento da moléstia no decorrer do tempo e o impacto sobre suas atividades de vida diária.(35) Os dados apresentados no presente estudo, associados aos previamente publicados, sugerem que questionar a variabilidade dos sintomas no decorrer do dia e da noite deve ser parte integrante de uma anamnese adequada.
AGRADECIMENTOSAgradecemos a todos os pacientes e membros dos centros de estudos que participaram do LASSYC-BR o profissionalismo e a contribuição ao estudo.
CONTRIBUIÇÃO DOS AUTORESTodos os autores contribuíram para a aquisição e interpretação dos dados. AMBM e FCW realizaram a análise estatística dos dados, enquanto todos os autores foram envolvidos na sua interpretação. AC redigiu o manuscrito. Todos os autores contribuíram criticamente na revisão do manuscrito e na aprovação da versão final antes da submissão ao JBP.
CONFLITOS DE INTERESSEAMBM e FCW receberam apoio financeiro da AstraZeneca do Brasil para a realização da análise estatística. AC recebeu apoio financeiro da AstraZeneca do Brasil para a redação do manuscrito. CBL é funcionária da AstraZeneca do Brasil.
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