A abordagem cirúrgica minimamente invasiva é a opção recomendada para o tratamento do câncer de pulmão, principalmente nos estádios iniciais.(1) A primeira forma de cirurgia minimamente invasiva foi a cirurgia videoassistida, que começou a ser empregada no tratamento das doenças torácicas no início dos anos 1990. Na última década, a cirurgia robótica surgiu como mais uma opção de abordagem minimamente invasiva. Diferentemente do que aconteceu com a cirurgia videoassistida, a utilização da abordagem torácica robótica vem crescendo de maneira mais rápida, principalmente nos países mais desenvolvidos.(2) No Brasil, os primeiros relatos do uso da cirurgia robótica no tratamento de doenças torácicas foram publicados em 2011, mas somente em 2016 Terra et al.(3) reportaram uma experiência inicial demonstrando a viabilidade da abordagem robótica no tratamento cirúrgico de pacientes com câncer de pulmão. Apesar de ainda pouco difundida, o emprego da cirurgia torácica robótica vem crescendo em nosso país. Na área das doenças torácicas, as principais aplicações da cirurgia robótica são no tratamento do câncer de pulmão e nos tumores mediastinais. Na presente edição do JBP, publicamos a maior experiência brasileira com a cirurgia robótica no tratamento de tumores do timo(4) e de câncer de pulmão.(5)
Em um dos artigos, Terra et al.(4) apresentam a experiência inicial de 18 casos de tumores tímicos tratados através da via robótica em sete instituições brasileiras. Os autores reportaram aspectos técnicos e resultados, tais como tempo cirúrgico, radicalidade oncológica, tempo de internação e complicações pós-operatórias. Não houve nenhum acidente intraoperatório, e nenhum caso foi convertido para cirurgia videoassistida ou aberta. Os resultados mais relevantes mostraram medianas de tempo de drenagem e de internação de apenas 1 e 2 dias, respectivamente. Não houve nenhum caso de mortalidade pós-operatória, e somente 3 casos apresentaram complicações (elevação da cúpula frênica, em 2 casos, e quilotórax, em 1). Dos 18 pacientes, apenas 1 teve a margem cirúrgica considerada como comprometida e recebeu quimioterapia e radioterapia como tratamento oncológico complementar à cirurgia. O tempo de seguimento foi muito curto para se tecer comentários em relação aos resultados oncológicos. Com esse relato inicial,(4) os autores demonstraram que a experiência inicial da cirurgia torácica robótica em uma série nacional de casos de tumores tímicos mostrou ser uma técnica factível e segura.
Devido à maior incidência, a aplicação mais comum da cirurgia robótica nas doenças torácicas é no tratamento do câncer de pulmão. Em outro artigo publicado nesta edição do JBP, Terra et al.(5) reportam a experiência de seis instituições brasileiras com 154 pacientes, com o emprego da cirurgia robótica para a ressecção cirúrgica anatômica de pacientes com câncer de pulmão em um período de 40 meses. A taxa de morbidade foi de 20,4%, e a taxa de mortalidade foi de 0,5%. Em 97,4% dos casos, a ressecção cirúrgica foi considerada adequada do ponto de vista oncológico, e, em apenas 2,6%, a ressecção foi classificada como incerta devido ao comprometimento de linfonodos mediastinais. Apesar do tempo de seguimento ainda ter sido curto (média de 326 dias), a sobrevida global durante o período foi de 97,5%. Esses resultados demonstram que, em nosso meio, a abordagem robótica no tratamento de pacientes com câncer de pulmão pode ser realizada de maneira adequada e segura, consolidando-se como uma boa opção de técnica cirúrgica minimamente invasiva.
Apesar de ser uma experiência inicial, os dados de morbidade e de mortalidade apresentados nessas séries brasileiras(4,5) são muito semelhantes aos reportados em diferentes séries internacionais,(6) demonstrando que a cirurgia robótica tem menor tempo de drenagem pleural e menor tempo de internação quando comparada com outras técnicas.(7) Oh et al.(8) publicaram resultados de uma série de pacientes nos EUA submetidos à lobectomia. Os autores comparam as três vias de acesso: robótica, videoassistida e toracotomia. A taxa de complicações pós-operatórias e o tempo de internação foram menores na cirurgia robótica, e a mortalidade pós-operatória foi menor na cirurgia robótica em comparação com a toracotomia.(8) Além disso, os resultados também sugerem que a abordagem torácica robótica mantém os princípios básicos da ressecção cirúrgica oncológica. Devemos levar em consideração que a via robótica é uma nova via de acesso, mas jamais deve mudar os princípios oncológicos do tratamento cirúrgico. Alguns estudos, com períodos de seguimento mais longo, relataram resultados oncológicos semelhantes aos obtidos com a toracotomia e com a cirurgia videoassistida.(9) Um estudo conduzido por Kneuertz et al.(10) sugere que a linfadenectomia mediastinal realizada através da técnica robótica é mais adequada do que a realizada com a técnica videoassistida, o que seria uma grande vantagem oncológica do emprego da via robótica.
A evolução tecnológica aliada à crescente experiência dos cirurgiões vem ampliando as indicações da cirurgia torácica robótica.(11) Mesmo em nosso país, a cirurgia torácica robótica vem crescendo de maneira rápida e, principalmente, de forma organizada. Os processos de treinamento e de certificação têm um papel fundamental na disseminação segura e eficaz da técnica robótica. Resultados iniciais da experiência brasileira apontam que estamos no caminho certo, mas alguns desafios precisam ser ultrapassados. O alto custo da incorporação de novas tecnologias sempre é um grande problema, mas com treinamento, capacitação e padronização dos procedimentos, os resultados parecem ser muito promissores. Kneuertz et al.(12) demonstraram que, para cirurgias de ressecção pulmonar por câncer, a via robótica teve melhor relação custo-benefício que a toracotomia. O maior número de centros, localizados em diferentes regiões do país, também é um passo importante para o acesso e a democratização da técnica, tanto para os cirurgiões que se interessem pelo método, quanto para os pacientes que podem se beneficiar com os procedimentos realizados por via robótica.
A perspectiva da cirurgia torácica robótica no Brasil parece boa, desde que mantidos os cuidados com treinamento, capacitação e padronização de procedimentos. Com esses cuidados, a segurança e a eficácia serão maiores, contribuindo para a melhora da relação custo-benefício e a democratização do acesso a esses avanços tecnológicos.
REFERÊNCIAS
1. Ettinger DS, Wood DE, Aggarwal C, Aisner DL, Akerley W, Bauman JR, et al. NCCN Guidelines Insights: Non-Small Cell Lung Cancer, Version 1.2020. J Natl Compr Canc Netw. 2019;17(12):1464-1472.
2. Rajaram R, Mohanty S, Bentrem DJ, Pavey ES, Odell DD, Bharat A, et al. Nationwide Assessment of Robotic Lobectomy for Non-Small Cell Lung Cancer. Ann Thorac Surg. 2017;103(4):1092-1100. https://doi.org/10.1016/j.athoracsur.2016.09.108
3. Terra RM, Araujo PH, Lauricella LL, Campos JR, Costa HF, Pêgo-Fernandes PM. Robotic pulmonary lobectomy for lung cancer treatment: program implementation and initial experience. J Bras Pneumol. 2016;42(3):185-190. https://doi.org/10.1590/S1806-37562015000000212
4. Terra RM, Milanez-de-Campos JR, Haddad R, Trindade JRM, Lauricella LL, Bibas BJ, et al. Robotic thoracic surgery for resection of thymoma and tumors of the thymus: technical development and initial experience. J Bras Pneumol. 2020;46(1):e20180315. https://doi.org/10.1590/1806-3713/e20180315
5. Terra RM, Bibas BJ, Haddad R, Milanez-de-Campos JR, Nabuco-de-Araujo PHX, Teixeira-Lima CE, et al. Robotic thoracic surgery for non-small cell lung cancer: initial experience in Brazil. J Bras Pneumol. 2020;46(1):e20190003. https://doi.org/10.1590/1806-3713/e20190003
6. Farivar AS, Cerfolio RJ, Vallières E, Knight AW, Bryant A, Lingala V, et al. Comparing robotic lung resection with thoracotomy and video-assisted thoracoscopic surgery cases entered into the Society of Thoracic Surgeons database. Innovations (Phila). 2014;9(1):10-15. https://doi.org/10.1097/imi.0000000000000043
7. Emmert A, Straube C, Buentzel J, Roever C. Robotic versus thoracoscopic lung resection: A systematic review and meta-analysis. Medicine (Baltimore). 2017;96(35):e7633. https://doi.org/10.1097/MD.0000000000007633
8. Oh DS, Reddy RM, Gorrepati ML, Mehendale S, Reed MF. Robotic-Assisted, Video-Assisted Thoracoscopic and Open Lobectomy: Propensity-Matched Analysis of Recent Premier Data. Ann Thorac Surg. 2017;104(5):1733-1740. https://doi.org/10.1016/j.athoracsur.2017.06.020
9. Park BJ, Melfi F, Mussi A, Maisonneuve P, Spaggiari L, Da Silva RKC, et al. Robotic lobectomy for non-small cell lung cancer (NSCLC): long-term oncologic results. J Thorac Cardiovasc Surg. 2012;143(2):383-389. https://doi.org/10.1016/j.jtcvs.2011.10.055
10. Kneuertz PJ, Cheufou DH, D'Souza DM, Mardanzai K, Abdel-Rasoul M, Theegarten D, et al. Propensity-score adjusted comparison of pathologic nodal upstaging by robotic, video-assisted thoracoscopic, and open lobectomy for non-small cell lung cancer. J Thorac Cardiovasc Surg. 2019;158(5):1457-1466.e2. https://doi.org/10.1016/j.jtcvs.2019.06.113
11. Zirafa CC, Romano G, Key TH, Davini F, Melfi F. The evolution of robotic thoracic surgery. Ann Cardiothorac Surg. 2019;8(2):210-217. https://doi.org/10.21037/acs.2019.03.03
12. Kneuertz PJ, Singer E, D'Souza DM, Abdel-Rasoul M, Moffatt-Bruce SD, Merritt RE. Hospital cost and clinical effectiveness of robotic-assisted versus video-assisted tho-racoscopic and open lobectomy: A propensity score-weighted comparison. J Thorac Cardiovasc Surg. 2019;157(5):2018-2026.e2. https://doi.org/10.1016/j.jtcvs.2018.12.101