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Cartas ao Editor

Prevalência de asma autorreferida em adultos na Amazônia brasileira: estudo transversal de base populacional

Prevalence of self-reported asthma in adults in the Brazilian Amazon: a population-based cross-sectional study

Gustavo Magno Baldin Tiguman1, Raquel Rodrigues Ferreira Rocha de Alencar2, Anderson da Paz Penha3, Tais Freire Galvao1, Marcus Tolentino Silva4

AO EDITOR,

A prevalência de asma em adultos é pouco conhecida, especialmente em regiões vulneráveis, tais como a Amazônia brasileira.(1) O objetivo deste estudo foi estimar a prevalência de asma autorreferida em adultos residentes na região metropolitana de Manaus (AM) em 2015.

Foram incluídos indivíduos com idade ≥ 18 anos. Para tal, foi usado um plano de amostragem probabilística por conglomerados em três estágios: 1) setores censitários (amostragem aleatória); 2) domicílios (amostragem sistemática); 3) indivíduos (amostragem aleatória, baseada em cotas de idade e sexo).(2) Os dados foram coletados por entrevistadores experientes no domicílio dos participantes.

A prevalência de asma autorreferida foi avaliada por meio da versão brasileira do European Community Respiratory Health Survey (Inquérito de Saúde Respiratória da Comunidade Europeia), com ponto de corte ≥ 4.(3) As variáveis individuais foram sexo (masculino/feminino), faixa etária (18-24, 25-34, 35-44, 45-59 ou ≥ 60 anos), estado civil [casado(a), separado(a), divorciado(a), viúvo(a) ou solteiro(a)], escolaridade (ensino superior ou maior, ensino médio completo, ensino fundamental completo, sem escolaridade), classe socioeconômica (A/B, C ou D/E), plano de saúde (sim/não), uso de serviços de saúde nos últimos 12 meses (consulta médica, consulta odontológica ou hospitalização), local de residência (na cidade de Manaus ou em outras cidades da região metropolitana de Manaus), doença crônica (DPOC, depressão, hipertensão, diabetes ou hipercolesterolemia) e autopercepção do estado de saúde (muito bom, bom, regular, ruim ou muito ruim).

Todas as variáveis foram avaliadas por meio de análise estatística descritiva com IC95%. A regressão de Poisson com variância robusta foi usada para estimar a razão de prevalência (RP) de asma por variável independente. Todas as variáveis com valor de p < 0,20 na análise bivariada foram incluídas na análise multivariada. A multicolinearidade foi avaliada pelo fator de inflação da variância (FIV), sendo removidas as variáveis com FIV > 10. Todas as análises foram realizadas com o programa estatístico Stata, versão 14.2 (StataCorp LP, College Station, TX, EUA), levando-se em conta o plano complexo de amostragem (usando o comando svy).

Todos os participantes assinaram um termo de consentimento livre e esclarecido. O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal do Amazonas (Protocolo n. 974.428).

Dos 4.001 participantes do estudo, 523 (13,1%; IC95%: 12,0-14,1) tinham asma. Metade dos participantes eram mulheres, solteiras e em bom estado saúde. A maioria estava na faixa etária de 18 a 44 anos, havia consultado um médico nos últimos 12 meses e residia na cidade de Manaus (Tabela 1).

Após o ajuste, observou-se que a prevalência de asma foi significativamente maior em mulheres (RP: 1,84; IC95%: 1,52-2,22), indivíduos residentes na cidade de Manaus (RP: 1,70; IC95%: 1,23-2,37), indivíduos com DPOC (RP: 2,45; IC95%: 1,93-3,10), indivíduos com depressão (RP: 1,52; IC95%: 1,20-1,93), indivíduos com hipertensão (RP: 1,39; IC95%: 1,16-1,68), indivíduos com hipercolesterolemia (RP: 1,33; IC95%: 1,12-1,65), indivíduos em estado regular de saúde (RP: 2,26; IC95%: 1,51-3,38), indivíduos com estado de saúde ruim (RP: 3,30; IC95%: 2,11-5,15) e indivíduos com estado de saúde muito ruim (RP: 2,66; IC95%, 1,54-4,63). Nenhuma das variáveis apresentou FIV > 10.

Embora o viés de informação em virtude do autorrelato possa limitar a validade de nossos achados, testes clínicos de asma estavam além do escopo de nosso estudo. Não obstante, empregamos um questionário validado para avaliar a asma em adultos. Fatores ambientais não foram avaliados neste estudo e podem ser fatores de risco de sintomas de asma.(4) Como foram incluídos no estudo apenas os indivíduos que estavam em casa no momento da coleta de dados, é possível que o viés de seleção tenha influenciado os resultados.

A prevalência de asma autorreferida no presente estudo foi semelhante à prevalência de asma na população adulta brasileira (12,4%) avaliada pelo questionário da Pesquisa Mundial de Saúde em um estudo multinacional. (5) Por outro lado, a Pesquisa Nacional de Saúde de 2013 revelou baixa prevalência de diagnóstico médico de asma relatado pelo próprio paciente (4,4%); é possível que isso tenha ocorrido em virtude de não se ter usado uma ferramenta de triagem para avaliar o desfecho.(6)

Em um estudo transversal baseado em inquéritos domiciliares realizados no Brasil em 2003, 2008 e 2013, a prevalência de asma foi consistentemente maior em mulheres,(1) como em nosso estudo. É possível que isso tenha ocorrido em virtude de diferenças biológicas, tais como hormônios sexuais e aumento da hiper-reatividade brônquica, e fatores sociais, tais como percepções diferentes de obstrução do fluxo aéreo e adesão aos medicamentos.(7) Além disso, as mulheres buscam assistência médica e relatam problemas de saúde com mais frequência que os homens.(2)

No presente estudo, a prevalência de asma foi maior nos indivíduos que residiam em Manaus do que naqueles residiam em outras cidades da área metropolitana de Manaus. Em um estudo transversal realizado no Peru em 2000-2008, a prevalência de asma foi investigada em dois diferentes contextos e foi maior na capital Lima (área urbana) do que na cidade de Tumbes (rural; 12% e 3% respectivamente).(8)

Adultos com asma geralmente relatam outras doenças crônicas. Uma meta-análise na qual foram comparados 117.548 pacientes com asma e 443.948 indivíduos sem a doença (grupo controle) mostrou que asma, diabetes, doenças cardiovasculares, hipertensão, transtornos psiquiátricos, doenças neurológicas, câncer e doenças respiratórias além da asma compartilham diversos fatores de risco, tais como tabagismo, obesidade e falta de atividade física.(9) Como tanto a asma quanto a DPOC são doenças pulmonares, havia risco de colinearidade entre as duas em nosso estudo. No entanto, a multicolinearidade foi descartada pelo FIV. No presente estudo, a asma apresentou relação com pior estado de saúde, o que está de acordo com um estudo no qual foram observados problemas graves relacionados com sintomas, comprometimento funcional e qualidade de vida em 167 pacientes com asma.(10)

Em suma, mais de um décimo dos adultos que vivem na região metropolitana de Manaus têm asma, cuja prevalência foi maior em mulheres, indivíduos que vivem na cidade de Manaus, indivíduos com doenças crônicas e indivíduos cujo estado de saúde é pior.

APOIO FINANCEIRO

Este estudo recebeu apoio financeiro do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq; Processo n. 404990/2013-4 e 448093/2014-6).

CONTRIBUIÇÕES DOS AUTORES

Silva MT e Galvao TF projetaram o estudo, analisaram e interpretaram os dados e revisaram criticamente o manuscrito. Tiguman GMB analisou e interpretou os dados e redigiu o artigo. Alencar RRFR e Penha AP analisaram e interpretaram os dados e revisaram criticamente o manuscrito. Todos os autores aprovaram a versão a ser publicada e concordaram em ser responsáveis por todos os aspectos do estudo, a fim de garantir que quaisquer questões relacionadas à exatidão ou integridade do estudo sejam investigadas e resolvidas adequadamente.

REFERÊNCIAS

1. Santos FMD, Viana KP, Saturnino LT, Lazaridis E, Gazzotti MR, Stelmach R, et al. Trend of self-reported asthma prevalence in Brazil from 2003 to 2013 in adults and factors associated with prevalence. J Bras Pneumol. 2018;44(6):491-497. https://doi.org/10.1590/s1806-37562017000000328
2. Silva MT, Galvão TF. Use of health services among adults living in Manaus Metropolitan Region, Brazil: population-based survey, 2015. Epidemiol Serv Saude. 2017;26(4):725-734. https://doi.org/10.5123/S1679-49742017000400005
3. Andrade E. Validação do questionário de triagem de asma do inquérito de saúde respiratória da Comunidade Européia (ECRHS) na cidade de Manaus-AM [thesis]. Porto Alegre: Universidade Federal do Rio Grande do Sul; 2007.
4. Toskala E, Kennedy DW. Asthma risk factors. Int Forum Allergy Rhinol. 2015;5 Suppl 1(Suppl 1):S11-S16. https://doi.org/10.1002/alr.21557
5. To T, Stanojevic S, Moores G, Gershon AS, Bateman ED, Cruz AA, et al. Global asthma prevalence in adults: findings from the cross-sectional world health survey. BMC Public Health. 2012;12:204. https://doi.org/10.1186/1471-2458-12-204
6. Menezes AM, Wehrmeister FC, Horta B, Szwarcwald CL, Vieira ML, Malta DC. Prevalence of asthma medical diagnosis among Brazilian adults: National Health Survey, 2013. Rev Bras Epidemiol. 2015;18 Suppl 2:204-213. https://doi.org/10.1590/1980-5497201500060018
7. Fuseini H, Newcomb DC. Mechanisms Driving Gender Differences in Asthma. Curr Allergy Asthma Rep. 2017;17(3):19. https://doi.org/10.1007/s11882-017-0686-1
8. Robinson CL, Baumann LM, Gilman RH, Romero K, Combe JM, Cabrera L, et al. The Peru Urban versus Rural Asthma (PURA) Study: methods and baseline quality control data from a cross-sectional investigation into the prevalence, severity, genetics, immunology and environmental factors affecting asthma in adolescence in Peru. BMJ Open. 2012;2(1):e000421. https://doi.org/10.1136/bmjopen-2011-000421
9. Su X, Ren Y, Li M, Zhao X, Kong L, Kang J. Prevalence of Comorbidities in Asthma and Nonasthma Patients: A Meta-analysis. Medicine (Baltimore). 2016;95(22):e3459. https://doi.org/10.1097/MD.0000000000003459
10. Peters JB, Rijssenbeek-Nouwens LH, Bron AO, Fieten KB, Weersink EJ, Bel EH, et al. Health status measurement in patients with severe asthma. Respir Med. 2014;108(2):278-286. https://doi.org/10.1016/j.rmed.2013.11.012

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