ABSTRACT
Objective: To determine the relationships that smoking history has with inflammatory markers, metabolic markers, body composition, muscle strength, and cardiopulmonary capacity in current smokers. Methods: This was a cross-sectional study involving 65 smokers (age range: 18-60 years). On three non-consecutive days, each participant was evaluated in terms of smoking history, pre-existing comorbidities, lung function (by spirometry), peripheral muscle strength (by dynamometry), body composition (by bioelectrical impedance analysis), levels of metabolic/inflammatory markers, and maximum cardiopulmonary capacity (by treadmill exercise test). We evaluated the relationships that smoking history has with inflammatory markers, metabolic markers, body composition, muscle strength, and cardiopulmonary capacity, using logarithmic transformation of the data and calculating Pearson's correlation coefficient and for partial correlations adjusted for age, gender, body mass index (BMI), and comorbidities. To identify the influence of smoking history on pre-existing comorbidities, we used a logistic regression model adjusted for age, BMI, and duration of smoking. Results: Smoking history correlated significantly, albeit weakly, with triglyceride level (r = 0.317; p = 0.005), monocyte count (r = 0.308; p = 0.013), and waist circumference (r = 0.299; p = 0.017). However, those correlations did not retain their significance in the adjusted analysis. In the logistic regression model, smoking more than 20 cigarettes/day correlated significantly with the presence of metabolic diseases (OR = 0.31; 95% CI: 1.009-1.701; p = 0.043). Conclusions: In this sample of smokers, smoking history correlated positively with the triglyceride level, the monocyte count, and waist circumference. The prevalence of metabolic disease was highest in those who smoked more than 20 cigarettes/day.
Keywords:
Tobacco; Smoking; Triglycerides; Monocytes; Waist circumference; Body composition.
RESUMO
Objetivo: Verificar a relação da carga tabágica com marcadores inflamatórios, marcadores metabólicos, composição corporal, força muscular e capacidade cardiorrespiratória em tabagistas. Métodos: Estudo transversal com 65 tabagistas de ambos os sexos (idade: 18-60 anos). Todos os participantes foram avaliados em três dias não consecutivos quanto ao histórico de tabagismo, comorbidades pré-existentes, função pulmonar (espirometria), força muscular periférica (dinamometria), composição corporal (bioimpedância), dosagem de marcadores metabólicos e inflamatórios e teste cardiopulmonar em esteira para avaliar a capacidade cardiorrespiratória máxima. Avaliou-se a relação da carga tabágica com marcadores inflamatórios, marcadores metabólicos, composição corporal, força muscular e capacidade cardiorrespiratória com transformação logarítmica através da correlação de Pearson e correlações parciais ajustadas para idade, sexo, índice de massa corpórea (IMC) e comorbidades. A regressão logística com modelo ajustado para idade, IMC e tempo de tabagismo foi utilizada para identificar a influência do histórico de tabagismo sobre as comorbidades pré-existentes. Resultados: Observaram-se correlações positivas fracas somente para dados não ajustados da carga tabágica com nível de triacilglicerol (r = 0,317; p = 0,005), contagem de monócitos (r = 0,308; p = 0,013) e circunferência abdominal (r = 0,299; p = 0,017). No modelo de regressão logística, fumar mais de 20 cigarros/dia correlacionou-se significativamente com a presença de doenças metabólicas (OR = 0,31; IC95%: 1,009-1,701; p = 0,043). Conclusões: Nesta amostra de tabagistas, a carga tabágica se correlacionou positivamente com nível de triacilglicerol, contagem de monócitos e circunferência abdominal. A prevalência de doenças metabólicas foi maior em tabagistas que fumam mais de 20 cigarros/dia.
Palavras-chave:
Tabaco; Fumar; Triglicerídeos; Monócitos; Circunferência abdominal; Composição corporal.
INTRODUÇÃOO tabagismo é considerado uma doença crônica.(1) Mais de 7 milhões de mortes por ano são atribuídas ao consumo de tabaco,(2) além de o tabagismo ser responsável por promover o desenvolvimento de diversas doenças,(3) como doenças ateroscleróticas que, ao gerar inflamação leve, é capaz de provocar dislipidemias(4) e surgimento de sarcopenia por meio de respostas catabólicas do músculo esquelético.(5)
O cigarro causa efeitos no perfil lipídico, com uma diminuição do HDL, que é cardioprotetor; e um aumento do colesterol total, LDL e triacilglicerol.(6) Como consequência, ocasiona disfunção endotelial, estresse oxidativo, dislipidemias, aterosclerose e desenvolvimento de doenças cardiovasculares.(6)
Adicionalmente, é capaz de gerar alterações na composição corporal, acarretando um efeito direto na homeostase da glicose, proporcionando uma diminuição das funções das células β pancreáticas e, consequentemente, uma resistência à sensibilidade insulínica, influenciando negativamente a relação cintura-quadril e a gordura visceral dos fumantes, fatores que são preditores de morbidade e mortalidade(7) e que caracterizam a síndrome metabólica pela instalação de um quadro de hipertensão arterial, resistência insulínica, níveis de colesteróis anormais e deposição de gordura na região abdominal.(8)
Primariamente, o tabagismo é um agente externo agressor ao sistema respiratório, provocando aumento de células de defesa locais, como monócitos, linfócitos, eosinófilos, leucócitos e neutrófilos.(9) De forma crônica passa a influenciar o funcionamento do sistema imune periférico, podendo gerar um quadro de inflamação crônica de baixo grau.(9) Além disso, pode predispor o desenvolvimento da DPOC, gerando uma resposta inflamatória anormal nos pulmões, perda de massa muscular esquelética e disfunção muscular.(10) Dessa forma, o cigarro, por dar início ao processo de proteólise, ocasiona atrofia muscular e consequente diminuição da capacidade cardiorrespiratória.(10,11)
Há um forte impacto negativo do tabagismo relacionado com a carga tabágica. Fumar menos cigarros/dia por mais anos é mais deletério do que fumar mais cigarros/dia por um período curto de tempo; por isso é mais sensato utilizar o número de anos-maço para investigar a relação da carga tabágica com o perfil dessa população.(12)
O objetivo do presente estudo foi avaliar a relação entre carga tabágica, marcadores inflamatórios, marcadores metabólicos, composição corporal, força muscular e capacidade cardiorrespiratória em tabagistas.
MÉTODOSPara o presente estudo foram avaliados 65 tabagistas, independente do sexo, com idade entre 18 e 60 anos (Figura 1). Os indivíduos foram previamente comunicados sobre os objetivos e procedimentos da pesquisa e, após concordância, assinaram o termo de consentimento livre e esclarecido. Todos os procedimentos realizados foram aprovados pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Faculdade de Ciências e Tecnologia do Campus de Presidente Prudente da Universidade Estadual Paulista (CAAE: 53299816.9.0000.5402).
Foram incluídos no estudo tabagistas clinicamente estáveis e com índice de massa corpórea (IMC) < 40 kg/m2. Foram excluídos do estudo indivíduos que não concluíram todas as avaliações, assim como aqueles com alterações medicamentosas por pelo menos 30 dias; doenças respiratórias crônicas pré-existentes (relação VEF1/CVF < 0,7), câncer ou doenças cardíacas ou metabólicas descontroladas; e indivíduos que faziam uso de medicamentos para reposição de nicotina e/ou antidepressivos como auxílio para a cessação tabágica.
Delineamento do estudoTrata-se de um estudo transversal, no qual os indivíduos realizaram avaliações em três dias não consecutivos. Todos os testes foram realizados no período matutino sob temperatura e umidade relativa do ar controladas (22,0°C ± 2,2°C e 56,6% ± 6,9%, respectivamente), e todos foram instruídos a não fazer uso de cigarros, álcool, cafeína, anestésicos ou barbitúricos 12 h antes das avaliações. Todas as avaliações foram acompanhadas por profissionais especializados.
O primeiro dia de avaliação consistiu em anamnese, com obtenção de dados de identificação pessoal (sexo, idade, peso e altura), investigação de histórico de tabagismo (tempo de tabagismo, número de cigarros/dia, carga tabágica e grau de dependência de nicotina) e comorbidades pré-existentes (cardiovasculares, como hipertensão arterial sistêmica, e metabólicas, como diabetes mellitus tipo 2 e dislipidemia). Por fim, foi realizada análise da função pulmonar por meio de espirometria, seguida da avaliação de força muscular periférica realizada por meio de dinamometria. No segundo dia de avaliação foram realizadas a análise da composição corporal por meio de bioimpedância e a coleta de sangue venoso periférico para a análise bioquímica. No terceiro dia de avaliação foi realizado o teste cardiopulmonar em esteira para a análise da capacidade cardiorrespiratória máxima com a determinação do consumo máximo de oxigênio (VO2máx).
ProcedimentosTodos os indivíduos responderam questões sobre o número de cigarros consumidos por dia, tempo de tabagismo e grau de dependência de nicotina avaliada por meio do teste de Fagerström,(13) que permite a classificação da dependência de nicotina em cinco níveis: muito baixo (0 a 2 pontos); baixo (3 a 4 pontos); moderado (5 pontos); alto (6 a 7 pontos); e muito alto (8 a 10 pontos).(14) A carga tabágica (anos-maço) de cada indivíduo foi calculada pela seguinte fórmula: número de cigarros consumidos por dia, dividido por 20 e multiplicado pelo número de anos de tabagismo.
A quantidade de monóxido de carbono no ar exalado foi mensurada através de um monoxímetro portátil (Micro Medical Ltd., Rochester, Kent, Reino Unido). Os voluntários realizaram inspiração profunda seguida de pausa inspiratória de 15-20 s, com expiração constante e lenta.(15) Essa concentração foi mensurada antes das avaliações para comprovar a abstinência tabágica de 12 h, com ponto de corte de 10 ppm,(16) necessária para a avaliação dos demais testes.
A função pulmonar foi realizada por meio de um espirômetro portátil MIR-Spirobank, versão 3.6 (Medical International Research, Roma, Itália). A interpretação foi feita considerando as normas da American Thoracic Society/European Respiratory Society,(17) com valores de normalidade relativos à população brasileira.(18) O padrão espirométrico foi estabelecido de acordo com o limite inferior de normalidade (LIN) para distúrbio ventilatório obstrutivo (relação VEF1/CVF < LIN, com CVF ≥ LIN), distúrbio ventilatório restritivo (relação VEF1/CVF ≥ LIN, com CVF < LIN) e distúrbio ventilatório misto (relação VEF1/CVF < LIN, com CVF < LIN).(19)
A força muscular periférica foi estimada com o uso de um dinamômetro eletrônico (Power Din Standard; CEFISE, São Paulo, Brasil) para os grupos musculares dos seguintes movimentos: flexão de ombro, flexão de cotovelo, abdução de ombro, extensão de joelho e flexão de joelho.(20) Cada teste foi realizado três vezes, com cabos específicos do dinamômetro ligados à célula de carga e ao computador. Entre uma tentativa e outra, havia um intervalo de 1 min. Foram mensurados valores de força de pico e força média (em kgf). Para cada variável e cada segmento, os maiores valores obtidos foram registrados para as análises.
A composição corporal foi avaliada através do aparelho InBody 720 (InBody, Cerritos, CA, EUA) para calcular o peso, IMC, porcentagem corporal de gordura, massa muscular, massa gorda, circunferência abdominal e relação cintura-quadril. O aparelho tem oito eletrodos, sendo dois em contato com a palma (E1 e E3) e polegar (E2 e E4) de cada mão e dois em contato com a parte anterior (E5 e E7) e calcanhar (E6 e E8) de cada pé.(21,22) Todos os indivíduos foram orientados a permanecer em jejum por 12 h antes da avaliação e não realizar exercícios moderados ou vigorosos 24 h antes da avaliação.
Foram coletadas amostras de 14 mL de sangue venoso periférico, respeitando o jejum de 12 h. As coletas foram sempre realizadas por um profissional habilitado utilizando materiais descartáveis e esterilizados. As amostras foram depositadas em três tubos a vácuo, centrifugadas por 15 min a 3.500 rpm para separar o produto a ser avaliado e, posteriormente, foram determinados os níveis de triacilglicerol, colesterol total, HDL, LDL e glicose. O material biológico foi coletado e armazenado a −70°C, de acordo com as orientações do fabricante. As determinações de glicose e perfil lipídico foram feitas em um espectrofotômetro SpectraMax Plus 384 (Molecular Devices LLC, San Jose, CA, EUA). Hemograma completo e a contagem de plaquetas foram determinados através do analisador COULTER STKS (Coulter Eletronics of Canada, Burlington, Canadá) em um laboratório especializado.
Para a avaliação da capacidade funcional máxima, os indivíduos foram submetidos a um teste cardiopulmonar em esteira com velocidade inicial de 5,0 km/h, inclinação constante de 1% e incrementos de 0,5 km/h a cada 2 min. O teste foi realizado até a exaustão voluntária (VO2máx).(23) Foram monitoradas continuamente as variáveis FC, SpO2 e percepção subjetiva de esforço pela escala de Borg. Além disso, as variáveis ventilatórias foram determinadas respiração a respiração por meio do sistema Quark PFT (Cosmed, Roma, Itália), que foi calibrado previamente a cada teste, conforme as especificações do fabricante.
O VO2máx foi assumido como a maior média do consumo de oxigênio dos últimos 30 s de exercício, quando pelo menos dois dos três seguintes critérios foram observados: FC > 90% da máxima predita para a idade (220 − idade); coeficiente respiratório > 1,10; e variação no VO2 entre o penúltimo e o último estágio de exercício < 2,1 mL/kg por min. No caso de o indivíduo entrar em exaustão antes do término do estágio, a VO2máx foi calculada pela seguinte equação:
VO2pico = Ecom + (t/180) × I
onde Ecom é o último estágio completo; t é o tempo de permanência na última carga incompleta (sendo a duração de cada estágio de 180 s); e I corresponde ao incremento da intensidade (0,5 km/h).
Análise estatísticaOs dados foram submetidos ao teste de normalidade de Shapiro-Wilk; como não se enquadraram no modelo de distribuição normal, esses foram apresentados em mediana e intervalo interquartil (IIQ). Foi avaliada a relação da carga tabágica com as covariáveis marcadores inflamatórios, marcadores metabólicos, composição corporal, força muscular e capacidade cardiorrespiratória, com transformação logarítmica para diminuir a variabilidade das variáveis não paramétricas, exceto para dados qualitativos, como sexo e comorbidades. Para tanto, foi utilizada a correlação de Pearson e correlações parciais ajustadas por idade, sexo, IMC e comorbidades. Para a interpretação da magnitude de resposta do coeficiente de correlação foi adotado o seguinte critério de classificação: correlação fraca (< 0,4), moderada (≥ 0,4 e < 0,5) e forte (≥ 0,5).(24) Após a realização das correlações, foi aplicado o teste de regressão linear ajustada para os mesmos fatores de confusão.
A regressão logística com modelo ajustado para idade, IMC e tempo de tabagismo foi utilizada para identificar a influência do histórico de tabagismo sobre as comorbidades pré-existentes. Para isso, os indivíduos foram divididos em grupos que fumavam ≤ 20 cigarros/dia (n = 12) e > 20 cigarros/dia (n = 53), e as comorbidades foram separadas em presentes (1) ou ausentes (0). O aumento do risco relativo foi calculado usando a fórmula (Exp(B) - 1) × 100. Todas as análises foram realizadas por meio do software Statistical Package for the Social Sciences, versão 15.0 (SPSS Inc., Chicago, IL, EUA), e o nível de significância adotado foi de 5% para todos os testes.
RESULTADOSNa Tabela 1 encontram-se as características gerais da amostra (N = 65), incluindo características demográficas, antropométricas, histórico de tabagismo e dados de função pulmonar. Com base no LIN, o padrão espirométrico era normal, em 57 indivíduos (88%); distúrbio ventilatório obstrutivo, em 2 (3%); distúrbio ventilatório restritivo, em 4 (6%); e distúrbio ventilatório misto, em 2 (3%).
Na Tabela 2 são apresentados os resultados de marcadores inflamatórios e metabólicos, força muscular, capacidade cardiorrespiratória e presença de comorbidades dos tabagistas. Com relação às comorbidades, todos os indivíduos com doenças cardiovasculares apresentavam hipertensão arterial sistêmica, enquanto dos 6 indivíduos com doenças metabólicas, 5 apresentavam dislipidemias e apenas 1 apresentava diabetes mellitus tipo 2.
A Figura 2 demonstra as análises de correlação de Pearson, onde se observa uma correlação positiva fraca da carga tabágica com o nível de triacilglicerol (r = 0,317; p = 0,005), contagem de monócitos (r = 0,308; p = 0,013) e circunferência abdominal (r = 0,299; p = 0,017). Para as correlações parciais ajustadas para idade, sexo, IMC e comorbidades, não foram observadas correlações significativas entre carga tabágica e as covariáveis.
Por fim, foram verificados, por meio da regressão logística, que tabagistas que fumam mais de 20 cigarros/dia apresentam uma OR de 3,1 para doenças metabólicas quando comparados com tabagistas que fumam menos de 20 cigarros/dia (p = 0,043; IC95%: 1,009-1,701).
DISCUSSÃOOs resultados indicam que houve correlações positivas fracas da carga tabágica somente com contagem de monócitos, nível de triacilglicerol e circunferência abdominal e apenas quando os dados não foram ajustados. Outro achado foi que tabagistas que consumiam mais de 20 cigarros/dia apresentaram um risco maior (31%) para doenças metabólicas que aqueles que consumiam menos de 20 cigarros/dia.
No estudo de Reynolds et al.,(25) observou-se que a exposição ao tabaco promoveu alterações nas expressões gênicas de monócitos. Ao entrarem nos espaços subendoteliais dos vasos sanguíneos, esses podem predispor o desenvolvimento de aterosclerose; isso ocorre pois os monócitos respondem a fatores quimiotáticos e começam a migrar e a se aderir através de uma camada de células endoteliais, podendo depois se diferenciar em macrófagos. Esses macrófagos posteriormente absorvem lipoproteínas de baixa densidade e se transformam em células de espuma que aos poucos vão se acumulando nos vasos e contribuem para o desenvolvimento de lesões ateroscleróticas.(26,27) Merianos et al.(28) observaram que adolescentes tabagistas tinham valores aumentados de triacilglicerol. Consequentemente, há um aumento do risco de formação de placas de ateromas.(27)
Na Suíça, em uma população de caucasianos tabagistas e não tabagistas (idade: 35-75 anos), foi observada uma tendência de dose-resposta entre o número de cigarros fumados e o tamanho da circunferência abdominal.(29) No presente estudo observou-se uma correlação positiva fraca entre a carga tabágica e a circunferência abdominal. Isso pode estar associado com um aumento de resistência à insulina e ter relação indireta com a obesidade, já que o aumento da circunferência abdominal é um marcador para o desenvolvimento de diabetes, hipertensão, síndrome metabólica, aterosclerose e doenças cardiovasculares.(30, 31)
Segundo um estudo de revisão sistemática com meta-análise,(32) o acréscimo de um cigarro por dia aumenta em 0,14% a circunferência abdominal mesmo com um IMC constante, ou seja, há uma preferência de redistribuição de adiposidade central associada ao maior consumo de cigarros; isso também pode explicar o fato de a circunferência abdominal ter apresentado uma correlação positiva com a carga tabágica, pois o número de cigarros promove uma maior modificação na área abdominal.
Não foram observadas correlações com a contagem de monócitos, nível de triacilglicerol e circunferência abdominal quando esses foram ajustados por sexo, idade, IMC e comorbidades; portanto, tais fatores podem estar interferindo nessa relação além da carga tabágica. Isso ocorre porque há vários fatores que podem desencadear o desenvolvimento de doenças; nesse caso, o cigarro é um fator de risco modificável, assim como o IMC e as comorbidades; e o sexo e a idade são fatores de risco não modificáveis.(33)
A inexistente relação da carga tabágica com variáveis do perfil lipídico (colesterol total, HDL e LDL) corroboram o estudo de Rom et al.,(34) no qual também não se observou tal correlação. No entanto, Chelland Campbell et al.(6) evidenciaram em seu estudo de revisão que essas variáveis apresentam índices superiores em fumantes quando comparados com indivíduos não tabagistas. Em contraste com os achados do nosso estudo, Marano et al.,(35) observaram um aumento dos marcadores inflamatórios em tabagistas comparados com não tabagistas, o que pode ser justificado pelo tamanho da amostra do seu estudo.
Também não houve correlação da carga tabágica com a força muscular e a capacidade cardiorrespiratória, o que corrobora os achados de Wüst et al.,(36) que observaram que, na ausência de DPOC, os tabagistas não apresentaram fraqueza muscular, perda ou alterações nas propriedades contrácteis do músculo quadríceps, mas apresentavam maior fadiga. Essa correlação provavelmente não foi observada, pois nossa amostra foi composta de indivíduos sem DPOC; porém, pode-se prever que esses indivíduos podem apresentar riscos para o desenvolvimento dessa e de outras doenças, com consequente perda de massa muscular tanto relacionada com a inflamação sistêmica que a DPOC causa, quanto com o consumo de cigarros, que ativa vias de degradação de proteínas.(11,37)
Como limitações podemos citar o tamanho amostral, o fato da falta de realização de dosagem de citocinas e a falta de um grupo controle, o que poderia auxiliar a compreender de forma mais consistente os resultados apresentados. Desta forma, sugerimos novos estudos prospectivos a fim de observar a relação da carga tabágica com o possível desenvolvimento de doenças metabólicas, comparando tabagistas com indivíduos saudáveis sem comorbidades, além da comparação entre indivíduos com peso normal e sobrepeso.
Tabagistas apresentam riscos aumentados no desenvolvimento de doenças, principalmente metabólicas, que, quando instaladas, podem favorecer o surgimento de outras. Na prática clínica, profissionais devem se atentar com esse acúmulo de gordura na região abdominal e o número de cigarros/dia fumados pelos tabagistas com o intuito de promover a cessação do tabagismo, conscientizando essa população e instruindo que, mesmo não havendo a cessação, é importante pelo menos diminuir o número de cigarros/dia, além da importância de realização de atividades físicas e do controle da alimentação com uma dieta mais balanceada.
Em resumo, conclui-se que entre tabagistas a carga tabágica se relacionou positivamente com os níveis de triacilglicerol, contagem de monócitos e circunferência abdominal. A prevalência de doenças metabólicas foi maior em tabagistas que fumam mais de 20 cigarros/dia.
CONTRIBUIÇÃO DOS AUTORESCada autor contribuiu individual e significativamente para o desenvolvimento do manuscrito. TSG, IBT, CPS, MP e DR contribuíram com a concepção e desenho da pesquisa; TSG e CPS realizaram a obtenção de dados; TSG, IBT e BSAS participaram da análise e interpretação dos dados; IBT realizou a análise estatística; TSG, IBT, CPS, MP e DR obtiveram o financiamento; e todos os autores participaram da redação do manuscrito e de sua revisão crítica quanto ao conteúdo intelectual.
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