ABSTRACT
Objective: To verify if there are differences in Chronic Obstructive Pulmonary Disease (COPD) patient exacerbator and non-exacerbator phenotypes undergoing a Pulmonary Rehabilitation Program (PRP). Methods: A real life retrospective study included outpatients with COPD from public primary care who completed a 12-weeks PRP, three times a week. All were assessed before and after PRP using the six minute walk test (6MWT), the modified Medical Research Council (mMRC) dyspnea index, quality of life and Body mass Index, airflow Obstruction, Dyspnea and Exercise (BODE index). Results: A total of 151 patients were analyzed and mean age was 65.0 ± 8.1 years and mean Forced Expiratory Volume (FEV) 1% of predicted was 39.8 ± 15.9. The predominant gender was male (66.9%). Of these patients 31 (20.5%) were exacerbator phenotype There was a significant improvement in the mean distance in the 6MWT in both groups, with the largest change observed in the exacerbator group [mΔ (95% CI): 84.9 (57.1 112.6) vs. 48.6 (37-60.2) p= 0.018]. Significant reduction in dyspnea on the mMRC scale occurred in both groups, with the highest intensity in the exacerbator group [mΔ (95% CI): - 0.8 (-1.11 to 0.51) vs. -1.6 (-2.20 to -1.13) p = 0.006]. Improvement in the BODE index occurred in both groups, but the mean variation was also significantly greater in the exacerbator group [mΔ (95% CI): -1.44 (-2.17 to -0.70) p= 0.045]. Conclusion: Patients with COPD exacerbator phenotype had a greater magnitude of response to PRP (36 meters) when compared to non-exacerbator phenotype regardless the severity of airflow obstruction, also showing improvement in prognosis measured by the BODE index.
Keywords:
Chronic obstructive pulmonary disease; Phenotype; Rehabilitation.
RESUMO
Objetivo: Verificar se existem diferenças em pacientes com doença pulmonar obstrutiva crônica (DPOC) fenótipos exacerbador e não exacerbador submetidos a um programa de reabilitação pulmonar (PRP). Métodos: Estudo retrospectivo de vida real que incluiu pacientes com DPOC da rede pública de atendimento ambulatorial em nível de atenção primária, que completaram o PRP, com duração de 12 semanas, três vezes por semana. Todos foram avaliados antes e depois do PRP, por meio do teste de caminhada dos seis minutos (TC6min), índice de dispneia (mMRC), qualidade de vida e índice BODE. Resultados: Dos 151 pacientes analisados, a média de idade foi 65,0 ± 8,1 anos e a média VEF1% do predito foi de 39,8 ± 15,9. O gênero predominante foi o masculino (66,9%). Desses pacientes, 31 (20,5%) eram fenótipo exacerbador. Houve melhora significativa na média da distância percorrida no TC6min em ambos os grupos, sendo a maior mudança observada no grupo exacerbador [mΔ(IC95%): 84,9 (57,1-112,6) vs. 48,6 (37-60,2); p = 0,018]. Redução significativa da dispneia pela escala mMRC ocorreu em ambos os grupos, sendo de maior intensidade no grupo exacerbador [mΔ(IC95%): -0,8 (-1,11 a 0,51) vs. -1,6 (-2,20 a -1,13); p = 0,006]. Melhora no índice BODE ocorreu em ambos os grupos, mas a variação média também foi significativamente maior no grupo exacerbador [mΔ(IC95%): -1,44 (-2,17 a -0,70); p = 0,045]. Conclusão: Os pacientes com DPOC fenótipo exacerbador apresentaram maior magnitude de resposta ao PRP (36 metros) quando comparados ao não exacerbador, independentemente da gravidade da obstrução do fluxo aéreo, impactando a melhora no prognóstico medido pelo índice BODE.
Palavras-chave:
Doença pulmonar obstrutiva crônica; Fenótipo; Reabilitação.
INTRODUÇÃOA história natural da doença pulmonar obstrutiva crônica (DPOC) é pontuada por exacerbações, especialmente naqueles pacientes com obstrução moderada a grave do fluxo aéreo, sendo eventos caracterizados por uma mudança na intensidade dos sintomas respiratórios e que podem necessitar de modificações na medicação regularmente utilizada. É definido como exacerbador todo paciente com diagnóstico de DPOC que apresenta duas ou mais agudizações ou exacerbações no último ano ou pelo menos uma que demandou internação hospitalar.(1) Tais exacerbações devem estar separadas por pelo menos quatro semanas desde o final do tratamento da última exacerbação ou seis semanas desde o início desta.(2) Um estudo recente(3) que acompanhou mais de dois mil pacientes com DPOC mostrou que o melhor preditor de uma exacerbação foi o histórico de exacerbações no ano anterior.
A reabilitação pulmonar (RP) é uma intervenção abrangente baseada na avaliação minuciosa do paciente, seguida por terapias específicas que incluem, mas não estão limitadas ao treinamento físico, educação e mudança de atitudes, que são projetadas para melhorar as condições física e psicológica dos pacientes com doença respiratória crônica, além de promover a adesão a longo prazo de comportamentos que melhorem a saúde.(4) Considerando que as exacerbações causam impacto negativo e significativo na qualidade de vida, na progressão da doença, na mortalidade e nos custos com saúde, a reabilitação pulmonar como uma modalidade de tratamento mais abrangente tem sido preconizada, além do tratamento farmacológico.(1)
O manejo farmacológico atual dos pacientes com DPOC tem sido baseado em fenótipos. Por apresentar mais morbidade e mortalidade, o fenótipo exacerbador tem representado um maior desafio terapêutico.(5) Dentre todas as estratégias terapêuticas para reduzir as exacerbações e as internações hospitalares, o papel da RP ainda precisa ser mais bem entendido.(6-8) Considerando que os estudos que abordam programas de reabilitação pulmonar (PRPs) não fazem a abordagem por fenótipos, uma vez que todos os pacientes com DPOC recebem a indicação desse tipo de tratamento, o objetivo do presente estudo foi verificar se pacientes com DPOC fenótipos exacerbador e não exacerbador respondem de maneira diferente quando tratados em um PRP.
MÉTODOSEstudo de vida real, retrospectivo, que incluiu pacientes com DPOC oriundos da rede pública de atendimento ambulatorial no nível de atenção primária, no período de março de 2005 a dezembro de 2018, que tiveram seus dados clínicos coletados no momento da avaliação pelo médico e demais profissionais integrantes do PRP, acompanhados por um período de 12 semanas, quando finalizavam o programa e eram reavaliados por todos os profissionais. O PRP é um projeto de extensão que atende pacientes dos ambulatórios de pneumologia e também da atenção primária do município de Novo Hamburgo (RS) desde 2002. O protocolo do estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética da Universidade onde o estudo foi desenvolvido e todos os participantes haviam assinado o termo de consentimento livre e esclarecido.
O diagnóstico de DPOC foi realizado de acordo com a Global Initiative for Chronic Obstrutive Lung Disease (GOLD), utilizando história clínica, exame físico e a confirmação da obstrução do fluxo aéreo por meio da razão do volume expiratório forçado no primeiro segundo (VEF1) pela capacidade vital forçada (CVF) inferior a 70 pós-uso do broncodilatador.(1) Foi considerado exacerbador o paciente com diagnóstico de DPOC que apresentasse duas ou mais exacerbações no último ano ou uma que demandasse internação hospitalar.(1) Para minimizar o viés sistemático, nenhum paciente foi incluído para tratamento na vigência de exacerbação e também foram excluídos da análise aqueles que não completaram o PRP mesmo que tivessem apresentado todas as informações clínicas necessárias para o diagnóstico e dados basais.
Os pacientes foram questionados quanto ao grau de dispneia pela versão validada da escala mMRC para pacientes com DPOC, cuja pontuação é delimitada em cinco graus, caracterizando as diferentes atividades que levam à falta de ar, variando entre zero e quatro: 0: sem dispneia, a não ser com exercício extenuante; 1: falta de ar quando caminha depressa no plano ou sobe ladeira suave; 2: anda mais devagar que uma pessoa da mesma idade no plano devido à falta de ar ou tem de parar para respirar; 3: para para respirar após caminhar uma quadra (90 a 120 m) ou após poucos minutos no plano; 4: muito dispneico para sair de casa ou dispneico ao vestir-se.(9)
Para o cálculo do índice BODE, foram consideradas as variáveis: índice de massa corporal, VEF1 em porcentagem do previsto (VEF1% predito), pontuação do mMRC e a distância percorrida no teste de caminhada dos seis minutos (TC6min). A pontuação foi considerada de acordo com os resultados obtidos nas quatro variáveis (0-3 para VEF1; 0-3 para mMRC; 0-3 para DPTC6 e 0-1 para IMC),(3) tendo a pontuação total variado de 0 a 10 (maiores pontuações indicam mais gravidade).(10)
Para avaliar a qualidade de vida, foi utilizado o Questionário de Qualidade de Vida do Hospital Saint George (QQVSG), o qual compreende três domínios: sintomas, atividades, impacto e total. Os questionários foram entregues aos pacientes com questões objetivas, sendo solicitado que lessem, interpretassem e marcassem as respostas. Valores acima de 10% refletiam qualidade de vida alterada naquele domínio. Reduções iguais ou superiores a 4% após intervenção, em qualquer domínio ou na soma total dos pontos, indicavam melhora clinicamente significativa na qualidade de vida dos pacientes.(11)
TC6min foi realizado de acordo com os critérios da ATS,(12) com monitorização das seguintes variáveis durante o teste: frequência cardíaca (FC) e saturação periférica de oxigênio (SpO2), com a utilização do oxímetro da marca Morrya modelo 1001 (Ipiranga São Paulo, Brasil). Para aferir a sensação de dispneia, foi utilizada a Escala de Borg CR-10, no início e no final do TC6min. A execução do teste ocorreu em um corredor plano, com distâncias previamente demarcadas de 10 metros. O corredor todo media 50 metros, onde, no final, era realizada a mensuração da distância percorrida pelo paciente. Por meio de um estadiômetro de parede da marca Cardiomed, foi verificada a altura do paciente e, com uma balança da marca Welmy (Santa Bárbara do Oeste [SP]/Brasil), obteve-se seu peso. Fazendo uso desses dados, foi obtido o cálculo do IMC por meio da forma do peso dividido pela altura ao quadrado. As aplicações do QQVSG e do TC6min antes e após PRP foram realizadas em dias distintos. Para o cálculo do valor predito da distância percorrida no TC6min, foi utilizada uma equação de referência desenvolvida para a população brasileira.(13)
O PRP consistiu em um programa multidisciplinar, com duração de três meses, em que os pacientes recebiam acompanhamentos médico, psicológico, nutricional e treinamento físico aplicado pelo fisioterapeuta e educador físico. Os pacientes realizaram aquecimento, exercícios aeróbicos, exercícios de ganho de força muscular e alongamentos. Aquecimento: foram realizadas diagonais funcionais para membros superiores (MsSs) e membros inferiores (MsIs). Os exercícios aeróbicos foram realizados em esteira ergométrica da marca Moviment (Pompeia [SP]/Brasil), com evolução do tempo, que variava entre 5 e 30 minutos de caminhada, e da velocidade de acordo com a percepção subjetiva do esforço e da frequência cardíaca. Já o treinamento de força para MsSs e MsIs foi realizado em equipamentos de musculação (roldana alta, cadeira extensora, supino e dorsal da marca Tech Press (São Paulo/Brasil), com intensidades variando entre 50% e 80% da carga máxima, obtido no teste de carga máxima realizado pelo educador físico e, ao término dos exercícios, os pacientes realizavam alongamentos dos principais grupos musculares envolvidos no treinamento.
O cálculo do tamanho da amostra foi realizado no software G*Power versão 3.1.9.2 for Windows (Franz Faul, Universitat Kiel, Alemanha). Para detectar uma diferença mínima de 30 metros no TC6min (tamanho de efeito igual a 0,75) entre os grupos após o PRP, adotando-se α = 5% e potência do teste (1-β) igual a 80%, foi necessário um número mínimo de 29 indivíduos em cada grupo para compor a amostra do estudo.
O processamento e a análise dos dados foram realizados no Programa SPSS, versão 21.0. A análise descritiva consistiu em médias, desvios-padrão, medianas, percentis e de proporções. Para verificar o cumprimento dos pressupostos de normalidade dos dados e da homogeneidade das variâncias entre os grupos, utilizaram-se os testes de Shapiro-Wilk e de Levene, respectivamente. A fim de verificar a associação entre as variáveis categóricas, foi utilizado o teste exato de Fisher. As variáveis contínuas foram comparadas pelo teste t de Student para amostras independentes. As variáveis contínuas de medidas repetidas foram analisadas por meio de equações de estimação generalizadas (GEE). Foi adotado como significância estatística p < 0,05.
RESULTADOSDe um total de 367 pacientes encaminhados para o PRP, 151 pacientes com diagnóstico de DPOC que completaram o PRP foram, retrospectivamente, incluídos no estudo e tiveram seus dados pré e pós reabilitação analisados (Figura 1). Dos 151 pacientes que completaram os três meses do PRP, a maioria (79,5%) foi considerada fenótipo não exacerbador. A idade média dos pacientes foi de 65 ± 8,1 anos e, destes, a maioria eram homens (66,9%). O IMC médio foi de 25,4 ± 4,8 kg/m2. Conforme a Tabela 1, os grupos apresentaram resultados semelhantes no que diz respeito à função pulmonar. Porém, no VEF1% do predito, o grupo de pacientes considerados exacerbadores apresentou uma média significativamente menor (41,1 ± 16,3 vs. 34,3 ± 13,1; p < 0,05). Já as variáveis do TC6min, grau de dispneia e índice BODE, bem como a carga tabágica, não foram diferentes entre os grupos. A média de exacerbações foi de 0,8 ± 1,4 e o grupo não exacerbador teve uma média de 0,2 ± 0,4 e o grupo exacerbador, uma média de 3,2 ± 1,8. O tratamento medicamentoso utilizado está descrito em ambos os grupos.
Os resultados na distância caminhada, no índice de dispneia, no prognóstico e na qualidade de vida em ambos os grupos tiveram melhora estatisticamente significativa comparados antes e depois, conforme se observa na Tabela 2. Em relação à capacidade de exercício avaliada por meio do TC6min antes e após o PRP, o grupo não exacerbador e o grupo exacerbador aumentaram a distância percorrida de maneira significativa, o que também ocorreu com a dispneia avaliada por meio do mMRC. Ambos os grupos melhoraram o prognóstico da doença avaliado pelo índice BODE. Os resultados da avaliação da qualidade de vida também apresentaram benefícios significativos depois do PRP tanto no grupo de não exacerbadores quanto no de exacerbadores (p < 0,0001).
A Tabela 3 mostra a variação da capacidade de exercícios, da dispneia, da qualidade de vida e do prognóstico medido pelo índice BODE entre os dois grupos. A Figura 2 demonstra a comparação da distância no TC6min antes e depois do PRP, de acordo com o fenótipo para a exacerbação da doença e ajustado pela função pulmonar basal (VEF1, %).
A variação média da redução do índice BODE e da dispneia foi significativamente maior no grupo exacerbador quando comparado com o não exacerbador. A variação dos domínios do questionário de qualidade de vida não foi significativamente diferente entre os grupos, apesar de terem sido intragrupos.
DISCUSSÃONosso estudo foi capaz de demonstrar que o PRP melhorou a capacidade de exercício, a dispneia, a qualidade de vida e o prognóstico deste grupo de pacientes com diagnóstico de DPOC. Mais importante ainda, foi capaz de demonstrar que a melhora na capacidade de exercício, avaliada pela distância percorrida absoluta e predita no TC6min, foi significativamente maior nos exacerbadores quando comparados aos não exacerbadores, mesmo após ajuste para o VEF1%, conforme pode ser observado na Figura 2. É importante também destacar que ambos os grupos atingiram distâncias muito superiores àquelas consideradas clinicamente significativas, que são de 25 a 35 metros,(4) e o grupo de pacientes não exacerbadores após a reabilitação caminhou, em média, 48,6 metros e os exacerbadores, em média, 84,9 metros, ou seja, 36,3 metros a mais do que os não exacerbadores.
Nos pacientes com DPOC, a gravidade da enfermidade e o prognóstico não são determinados exclusivamente pelas alterações da função pulmonar. Em indivíduos com doença leve ou moderada, a capacidade de exercício e as atividades de vida diária são frequentemente alteradas, causando um impacto negativo na qualidade de vida. Dessa forma, além do tratamento farmacológico utilizado para melhorar a dispneia, a função pulmonar e reduzir o número de exacerbações,(14) o PRP tem sido preconizado como uma estratégia não farmacológica a ser implementada(15) e nesse grupo de pacientes exacerbadores se mostrou muito mais benéfico quando comparado com a magnitude do benefício nos pacientes de fenótipo não exacerbador.
Quando se analisou o comportamento do índice de dispneia medido pelo mMRC, foi possível observar melhora significativa em ambos os grupos e também magnitude maior no grupo de pacientes com fenótipo exacerbador (- 0,8 vs. - 1,6; p < 0,006). A dispneia é certamente o principal sintoma e o mais limitador nessa enfermidade, principalmente quando os pacientes desempenham as atividades do dia a dia ou durante o exercício físico. Esse sintoma costuma melhorar de maneira significativa com o treinamento físico aeróbico, mas o mecanismo ainda não é bem entendido. Menos ventilação pulmonar na isocarga e também no consumo de oxigênio, expressando menos hiperinsuflação, não explicaria totalmente a melhora obtida.(15)
A qualidade de vida avaliada pelo questionário Saint George melhorou em ambos os grupos em níveis muito superiores aos 4 pontos percentuais reconhecidos como a diferença mínima clinicamente significativa. A maioria dos estudos ressalta como principal benefício da reabilitação pulmonar a melhora na qualidade de vida,(4,15,16) o que também foi observado no nosso estudo em ambos os grupos, porém, quando comparamos a qualidade de vida entre pacientes com DPOC fenótipos exacerbador e não exacerbador, nenhuma diferença estatisticamente significativa foi observada.
Estudos que relacionam a reabilitação pulmonar com exacerbações têm focalizado a capacidade dessa intervenção em reduzir o número de ocorrências, de visitas à emergência e hospitalizações. Enquanto um estudo com 200 pacientes mostrou que a reabilitação pulmonar reduziu as internações relacionadas à piora respiratória em um ano, com redução de 50% da duração da internação,(17) outro estudo com 60 pacientes mostrou mais exacerbações no grupo controle, mas não verificou diferença nas hospitalizações por paciente.(18)
Uma metanálise demonstrou que embora os ensaios clínicos randomizados sugerissem que os PRPs reduzissem as admissões subsequentes, os resultados dos estudos de coorte não demonstraram esse benefício. Os autores argumentaram que a natureza heterogênea dos pacientes incluídos nos diferentes estudos observacionais e também que a variabilidade dos protocolos utilizados pelos diferentes PRPs poderiam justificar tais achados.(19) Diante dessa ainda controversa resposta dos diferentes estudos com relação a PRPs reduzirem as exacerbações, as demais vantagens obtidas em outros parâmetros, como capacidade de exercício e melhora da qualidade de vida, corroboram sua indicação.
Até o momento, poucos estudos se ocuparam em analisar a resposta da reabilitação pulmonar nos diferentes fenótipos de DPOC. Jenkins et al.,(20) ao estudarem 73 pacientes com DPOC de gravidade leve a muito grave, demonstraram que os pacientes com fenótipo exacerbador concluíam menos o PRP quando comparados aos não exacerbadores (45% vs. 69%) e que os efeitos entre os grupos foram semelhantes. Um estudo prospectivo e multicêntrico(21) que se propôs a estudar a resposta de um PRP nos diferentes fenótipos de DPOC incluiu 364 pacientes em seis centros e agrupou-os em pacientes com obstrução de vias aéreas e pacientes com destruição do parênquima. Demonstrou que ambos se beneficiaram do tratamento, sem diferença entre os grupos. Nosso estudo difere dos anteriores por ter incluído apenas pacientes que concluíram o PRP e também por tê-los classificado em exacerbadores e não exacerbadores, e não como tendo doença de via aérea e destruição de parênquima pulmonar. Sabe-se que as exacerbações são preditores independentes de mortalidade em pacientes com DPOC, aumentando em quase cinco vezes a chance de morte,(22) e essa dicotomização fenotípica poderia trazer informações mais relevantes, conforme foi possível demonstrar no nosso estudo.
Já validado como preditor de hospitalização e mortalidade em pacientes com DPOC que estejam participando de um PRP,(23) no nosso estudo o índice BODE foi significativamente reduzido após o tratamento no grupo de pacientes exacerbadores quando comparado ao dos não exacerbadores. Embora não tenhamos o seguimento do número de exacerbações nem das internações ocorridas após a conclusão da reabilitação, esse índice demonstra claramente um melhor prognóstico quando comparado ao momento antes da reabilitação.
Nosso estudo apresenta algumas limitações. O primeiro é ter um desenho retrospectivo, mesmo que os dados analisados tenham sido coletados de maneira prospectiva e padronizada, pois são utilizados no relatório final a ser enviado ao médico- assistente. Outro aspecto foi o fato de não ter sido usado o índice de dispneia transicional, capaz de melhor avaliar a dispneia após intervenções do que o mMRC. No entanto, trata-se de um estudo de vida real que demonstra o benefício do PRP para todos os pacientes com DPOC, principalmente àqueles com fenótipo exacerbador.
Pacientes com diagnóstico de DPOC e fenótipo exacerbador se beneficiam do PRP de maneira mais significativa, caminhando, em média, 36 metros a mais no TC6min quando comparados com não exacerbadores. Tal benefício também pode ser demonstrado na melhor redução na dispneia e na melhora do prognóstico medido pelo índice BODE. Estudos prospectivos de coorte serão necessários para melhor confirmar esses achados.
CONTRIBUIÇÃO DOS AUTORESIvo Bohn Júnior participou da elaboração do estudo, coleta de dados, análise dos dados e escreveu o artigo. Cassia Cinara da Costa participou da elaboração do estudo, coleta de dados e revisou o artigo. Rafael Machado de Souza participou da elaboração do estudo, coleta de dados e revisou o artigo. Álvaro Huber dos Santos participou da análise dos dados e revisou o artigo. Paulo José Zimermann Teixeira participou da elaboração do estudo, coleta de dados, análise dos dados e revisou o artigo.
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