Estratégias de proteção pulmonar em pacientes com SDRA sob ventilação mecânica (VM) estão associadas à redução da mortalidade.
(1-3) A adesão a essas estratégias tem aumentado progressivamente nas últimas duas décadas, pois médicos e fisioterapeutas respiratórios têm cada vez mais reconhecido a proteção pulmonar como a pedra angular da terapia de suporte.
(4) Estratégias de proteção pulmonar representam um conjunto de intervenções para reduzir a lesão pulmonar agravada pela própria VM, a chamada lesão pulmonar induzida pelo ventilador. Essas estratégias geralmente têm como objetivo aplicar baixos volumes correntes (4-6 mL/kg de peso corporal previsto), baixas pressões de platô (< 30 cmH2O) e PEEP suficiente para atingir as metas de oxigenação. O raciocínio é evitar a hiperdistensão pulmonar e minimizar o estresse mecânico imposto aos pulmões, que são os principais mecanismos fisiopatológicos da lesão pulmonar induzida pelo ventilador.
(5) Recentemente, a pressão de distensão de vias aéreas (expressa como a diferença entre pressão de platô e PEEP) foi proposta como a principal variável-alvo para evitar lesão pulmonar. A ideia é que limitar a pressão de distensão pode ser mais seguro em pacientes com pulmões lesionados. Nesses pacientes, o tamanho do pulmão funcional e aerado pode ser consideravelmente pequeno, um pulmão de bebê, tomando emprestado o termo criado por Gattinoni et al.
(6) A aplicação de volumes correntes normalizados pelo peso corporal previsto leva em consideração o tamanho do paciente mas não o tamanho do pulmão de bebê, o qual acaba sendo hiperdistendido e submetido a estresse excessivo.
(7) A pressão de distensão nada mais é do que o volume corrente normalizado pela complacência do sistema respiratório, a qual, segundo demonstrado, acompanha de perto o tamanho do pulmão funcional.
(8) Uma meta-análise de dados individuais de ensaios envolvendo pacientes com SDRA mostrou que pressões de distensão menores se associaram a melhora da sobrevida.
(9) Mais importante ainda, o benefício de sobrevida das estratégias de VM protetora foi mediado pela pressão de distensão, não pelo volume corrente ou pela PEEP.
(9) O papel das estratégias de proteção pulmonar em pacientes sem SDRA é menos conclusivo.
(10) Neste número do Jornal Brasileiro de Pneumologia, Bastos-Netto et al.
(11) fornecem dados importantes sobre o impacto das estratégias de proteção pulmonar em pacientes sem SDRA inicialmente que apresentavam fatores de risco para a doença. Em uma coorte de 116 pacientes sob VM, os autores constataram que os pacientes com pressão de distensão máxima < 15 cmH2O apresentaram menor taxa de mortalidade em 28 dias. A pressão de distensão máxima, uma substituta para a pressão de distensão, foi definida como a diferença entre pressão máxima das vias aéreas e PEEP. Em pacientes sob VM estritamente controlada, a diferença entre pressão de distensão máxima e pressão de distensão é simplesmente a pressão resistiva. Como resultado, essa diferença tende a ser pequena, especialmente quando a resistência das vias aéreas é baixa ou quando tanto o fluxo inspiratório quanto o expiratório estão próximos de zero. Na presença de esforços inspiratórios ou expiratórios, a pressão de distensão máxima pode subestimar consideravelmente a pressão de distensão. Nesse cenário, manobras de oclusão das vias aéreas inspiratórias finais e expiratórias finais podem ser utilizadas para avaliar o grau de esforço.
(12) Curiosamente, mesmo quando consideradas essas limitações na utilização das pressões de distensão máxima, a proteção pulmonar foi mais bem definida quando baseada nas pressões de distensão do que quando baseada no volume corrente: não houve benefício de sobrevida com volumes correntes < 8 mL/kg de peso corporal previsto. Esse achado é semelhante ao encontrado em pacientes com SDRA por Amato et al.
(9) e sugere que, mesmo em pacientes sem SDRA, deve-se prestar atenção às pressões de distensão, especialmente naqueles com fatores de risco para SDRA.
Bastos-Netto et al.
(11) deram um passo importante para um melhor entendimento dos determinantes de desfechos ruins em pacientes sob VM. À medida que novas evidências revelam a importância da pressão de distensão, deveremos ser capazes de ver mais de seus efeitos em cenários imprevistos.
O que um homem vê depende tanto daquilo que ele olha quanto daquilo que sua experiência visual-conceitual prévia o ensinou a ver.
- Thomas S. Kuhn
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