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ISSN (on-line): 1806-3756

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Artigo Original

Pneumonia associada à ventilação mecânica em pacientes em ventilação mecânica prolongada: descrição, fatores de risco associados à mortalidade e desempenho do escore SOFA

Ventilator-associated pneumonia in patients on prolonged mechanical ventilation: description, risk factors for mortality, and performance of the SOFA score

Sebastián Ariel Núñez1, Guillermina Roveda1, Mariela Soledad Zárate2, Mónica Emmerich3, María Teresa Verón1

DOI: 10.36416/1806-3756/e20200569

ABSTRACT

Objective: Ventilator-associated pneumonia (VAP) is a serious complication of mechanical ventilation (MV). However, data on VAP in patients on prolonged MV (PMV) are scarce. We aimed to describe the characteristics of VAP patients on PMV and to identify factors associated with mortality. Methods: This was a retrospective cohort study including VAP patients on PMV. We recorded baseline characteristics, as well as 30-day and 90-day mortality rates. Variables associated with mortality were determined by Kaplan-Meier survival analysis and Cox regression model. Results: We identified 80 episodes of VAP in 62 subjects on PMV. The medians for age, Charlson Comorbidity Index, SOFA score, and days on MV were, respectively, 69.5 years, 5, 4, and 56 days. Episodes of VAP occurred between days 21 and 50 of MV in 28 patients (45.2%) and, by day 90 of MV, in 48 patients (77.4%). The 30-day and 90-day mortality rates were 30.0% and 63.7%, respectively. There were associations of 30-day mortality with the SOFA score (hazard ratio [HR] = 1.30; 95% CI: 1.12-1.52; p < 0.001) and use of vasoactive agents (HR = 4.0; 95% CI: 1.2-12.9; p = 0.02), whereas 90-day mortality was associated with age (HR = 1.03; 95% CI: 1.00-1.05; p = 0.003), SOFA score (HR = 1.20; 95% CI: 1.07-1.34; p = 0.001), use of vasoactive agents (HR = 4.07; 95% CI: 1.93-8.55; p < 0.001), and COPD (HR = 3.35; 95% CI: 1.71-6.60; p < 0.001). Conclusions: Mortality rates in VAP patients on PMV are considerably high. The onset of VAP can occur various days after MV initiation. The SOFA score is useful for predicting fatal outcomes. The factors associated with mortality could help guide therapeutic decisions and determine prognosis.

Keywords: Pneumonia, ventilator-associated; Critical care; Ventilators, mechanical.

RESUMO

Objetivo: A pneumonia associada à ventilação mecânica (PAVM) é uma séria complicação da ventilação mecânica (VM). Entretanto, dados sobre PAVM em pacientes em VM prolongada (VMP) são escassos. Nosso objetivo foi descrever as características de pacientes com PAVM em VMP e identificar fatores associados à mortalidade. Métodos: Estudo de coorte retrospectivo incluindo pacientes com PAVM em VMP. Foram registradas características basais, bem como as taxas de mortalidade em 30 e 90 dias. As variáveis associadas à mortalidade foram determinadas por meio da análise de sobrevida de Kaplan-Meier e do modelo de regressão de Cox. Resultados: Foram identificados 80 episódios de PAVM em 62 indivíduos em VMP. As medianas de idade, índice de comorbidade de Charlson, pontuação no SOFA, e dias em VM foram, respectivamente, de 69,5 anos, 5, 4 e 56 dias. Os episódios de PAVM ocorreram entre o 21º e o 50º dia de VM em 28 pacientes (45,2%) e até o 90º dia de VM em 48 pacientes (77,4%). As taxas de mortalidade em 30 e 90 dias foram de 30,0% e 63.7%, respectivamente. A mortalidade em 30 dias associou-se a pontuação no SOFA (razão de risco [RR] = 1,30; IC95%: 1,12-1,52; p < 0,001) e uso de drogas vasoativas (RR = 4,0; IC95%: 1,2-12,9; p = 0,02), enquanto a mortalidade em 90 dias associou-se a idade (RR = 1,03; IC95%: 1,00-1,05; p = 0,003), pontuação no SOFA (RR = 1,20; IC95%: 1,07-1,34; p = 0,001), uso de drogas vasoativas (RR = 4,07; IC95%: 1,93-8,55; p < 0,001) e DPOC (RR = 3,35; IC95%: 1,71-6,60; p < 0,001). Conclusões: As taxas de mortalidade em pacientes com PAVM em VMP são consideravelmente altas. O início da PAVM pode ocorrer vários dias após a instituição da VM. O escore SOFA é útil para predição de desfechos fatais. Os fatores associados à mortalidade podem ajudar a orientar as decisões terapêuticas e a determinar o prognóstico.

Palavras-chave: Pneumonia associada à ventilação mecânica; Cuidados críticos; Ventiladores mecânicos.

INTRODUÇÃO
 
Nos últimos anos, o progresso na assistência médica levou à redução da mortalidade hospitalar de pacientes graves.(1,2) O aumento da sobrevida na fase aguda da doença crítica causou o aumento progressivo da população de indivíduos com doença crítica crônica (DCC). A prevalência de DCC é de 7,6% do número de internações em UTIs nos Estados Unidos(3) e pode chegar a 33% em pacientes que apresentam insuficiência respiratória aguda.(4) Embora a definição de DCC seja heterogênea, a necessidade de ventilação mecânica prolongada (VMP) é a característica mais importante para defini-la.(5,6) Uma das definições mais recentes e mais utilizadas de DCC a descreve como tempo de permanência em UTI de 8 dias ou mais, associado a pelo menos uma das seguintes condições: ventilação mecânica (VM) por 96 h ou mais, traqueostomia, sepse, ferimentos graves e falência de múltiplos órgãos.(7) A definição de VMP também varia entre os autores, embora a mais utilizada seja a necessidade de VM por 21 dias ou mais, pelo menos por 6 h/dia.(8,9) Utilizando essa definição, a incidência de VMP em pacientes em VM internados em UTI varia de 6,3% a 9,9%.(10,11)
 
As infecções em pacientes em VMP são uma das complicações mais comuns. Em um estudo multicêntrico que incluiu 1.419 pacientes em VMP, as seis principais complicações registradas no período de um ano foram infecções, sendo as mais frequentes a infecção do trato urinário e a pneumonia associada à VM (PAVM), em 34,5% e 31,0% dos pacientes, respectivamente.(12) O alto risco de infecções deve-se a múltiplos fatores: uso prolongado de elementos invasivos (cânula de traqueostomia, cateteres, etc.), exposição prolongada a ambientes contaminados por microrganismos virulentos e resistentes e alterações imunológicas causadas por comorbidades e pela recente doença crítica do paciente.(13)
 
A PAVM é uma das infecções hospitalares mais comuns. Aproximadamente 10% dos pacientes que necessitam de VM desenvolvem PAVM, com taxa de mortalidade de 20-50%.(14,15) Sabe-se que a apresentação clínica e o manejo da PAVM diferem em pacientes em VMP. (16) O risco de PAVM em pacientes em VMP é menor do que naqueles que estão na fase aguda da VM, mas aumenta em 1-3% a duração da VM por dia, sugerindo que entre 50% e 66% dos pacientes traqueostomizados desenvolverão PAVM.(17) O impacto das infecções respiratórias em pacientes em VMP é relevante e foi relacionado a maior mortalidade.(18) Entretanto, dados sobre PAVM em pacientes em VMP são escassos. Não só a maioria dos estudos sobre PAVM inclui pacientes em VM aguda, mas diferenças nas definições de VMP e DCC revelaram que o conhecimento sobre o assunto é esparso e quase incomparável.
 
O escore SOFA é uma ferramenta amplamente utilizada para predição de mortalidade em pacientes sépticos em UTI.(19) Entretanto, sua utilidade em indivíduos com DCC ainda não está bem estabelecida.
 
O objetivo do presente estudo foi descrever as características dos pacientes com PAVM em VMP, identificar fatores associados à mortalidade em 30 e 90 dias e avaliar o desempenho do escore SOFA como preditor de mortalidade nessa população.
 
MÉTODOS
 
Desenho do estudo
 
Realizamos um estudo de coorte retrospectivo envolvendo pacientes em VMP e diagnosticados com PAVM que foram internados na Unidade de Pacientes Críticos Crônicos (UPCC) do Sanatorio Güemes, localizado na cidade de Buenos Aires, na Argentina, entre junho de 2015 e outubro de 2019. Nossa instituição é um hospital geral de cuidados agudos com 680 leitos, afiliado a uma universidade. A UPCC é uma unidade com 24 leitos desenvolvida para o tratamento e reabilitação de pacientes com DCC. Os pacientes internados na UPCC vêm encaminhados principalmente de UTIs e de unidades de acidente vascular cerebral. A taxa global de mortalidade na UPCC é de 44,8%, e, em média, 179 pacientes são internados por ano. Os protocolos de prevenção de PAVM incluem elevação da cabeceira da cama em 30-45 graus, testes diários de respiração espontânea, descontaminação oral e monitoramento da pressão do manguito do tubo endotraqueal. Utilizamos o sistema de registro de vigilância de infecções hospitalares para identificar pacientes consecutivos com diagnóstico de PAVM que foram internados na UPCC. Por meio de prontuários eletrônicos, foram selecionados indivíduos com PAVM que estavam em VMP. As seguintes variáveis basais foram coletadas: motivo da internação na instituição, dados demográficos, comorbidades e índice de comorbidade de Charlson ajustado por idade. As variáveis coletadas no momento do diagnóstico de PAVM foram número de dias em VM, pontuação no SOFA, necessidade de drogas vasoativas e PaO2/FiO2. Dados relativos ao período de acompanhamento de 90 dias após o diagnóstico de PAVM também foram coletados, incluindo resultados de isolados microbiológicos, adequação da antibioticoterapia empírica, mortalidade em 30 dias e mortalidade em 90 dias. Utilizamos essas variáveis na busca por fatores associados à mortalidade em 30 e em 90 dias. Em virtude da natureza retrospectiva do estudo, não foi necessária a assinatura de um termo de consentimento livre e esclarecido. O estudo foi aprovado pelo departamento de pesquisa da instituição. Todos os dados foram mantidos em sigilo, e o estudo foi realizado em conformidade com a Declaração de Helsinque.
 
População e definições do estudo
 
Foram incluídos no estudo pacientes com 18 anos ou mais em VMP e que estavam na UPCC há pelo menos 48 h antes do início da PAVM, independentemente de terem tido episódios anteriores de PAVM. Foram excluídos indivíduos que desenvolveram PAVM em outras unidades ou em até 48 h após a internação na UPCC. Em pacientes com mais de um episódio de PAVM, um novo episódio foi definido como o desenvolvimento de novos achados clínicos, radiológicos e bacteriológicos após o término da antibioticoterapia para o episódio anterior. Em conformidade com a National Association for Medical Direction of Respiratory Care, definimos VMP como VM com duração de ≥ 21 dias por pelo menos 6 h/dia.(9) Utilizamos a definição do Programa de Vigilancia de Infecciones Hospitalarias de Argentina, o qual define PAVM com base em critérios clínicos e radiológicos(20): presença de um de dois critérios maiores (temperatura > 38°C e contagem de leucócitos > 12.000 células/mm3 ou < 4.000 células/mm3) e de pelo menos um de três critérios menores (escarro purulento, redução da PaO2/FiO2 e infiltrados novos ou persistentes em pelo menos duas radiografias de tórax). O diagnóstico microbiológico de PAVM foi confirmado por hemoculturas (identificação do crescimento de microrganismos,sem outra causa óbvia), por culturas quantitativas de LBA (≥ 104 UFC/mL) ou por culturas quantitativas de aspirado traqueal (≥ 105 UFC/mL).(20)
 
A função orgânica foi avaliada utilizando a pontuação no SOFA,(21) calculada nas primeiras 24 h após o diagnóstico de PAVM. As comorbidades foram avaliadas pelo índice de comorbidade de Charlson ajustado por idade.(22) Definimos o uso de drogas vasoativas relacionado à PAVM como o recebimento de prescrição de noradrenalina ou dopamina em algum momento entre o dia do diagnóstico de PAVM e o término da antibioticoterapia. A relação PaO2/FiO2 registrada foi aquela obtida no momento mais próximo ao início da PAVM. As culturas microbiológicas foram solicitadas pelos médicos assistentes, em conformidade com os protocolos da instituição, e incubadas em meios padrão. Foram realizadas culturas quantitativas dos isolados de amostras respiratórias. A identificação bacteriana foi realizada utilizando testes bioquímicos convencionais e um sistema microbiológico automatizado (BD Phoenix; Becton Dickinson, Sparks, MD, EUA). A sensibilidade aos antimicrobianos foi determinada por meio de disco-difusão, e a sensibilidade à colistina, por meio do sistema automatizado (BD Phoenix), em conformidade com as recomendações do Clinical and Laboratory Standards Institute.(23)
 
Análise estatística
 
As análises estatísticas foram realizadas com o programa R Studio, versão 3.5.2 (The R Foundation for Statistical Computing, Viena, Áustria). As variáveis contínuas são expressas em média e desvio-padrão ou mediana e intervalo interquartil, de acordo com sua distribuição. As variáveis qualitativas são apresentadas em frequência absoluta e relativa. Realizamos análises univariadas e multivariadas para identificar fatores associados à mortalidade. As variáveis qualitativas foram comparadas utilizando o teste do qui-quadrado ou o teste exato de Fisher, enquanto as variáveis com distribuição paramétrica e não paramétrica foram comparadas utilizando o teste t de Student ou o teste U de Mann-Whitney, respectivamente. Modelos de regressão de Cox foram utilizados para identificar preditores de mortalidade em 30 e 90 dias. Todas as variáveis que apresentaram p < 0,25 na análise univariada foram incluídas no modelo multivariado. Modelos aninhados foram selecionados utilizando o critério de informação Akaike. Curvas de Kaplan-Meier e testes de log-rank foram realizados para as variáveis associadas à mortalidade em 90 dias. Razões de risco e IC95% foram utilizados para identificar as variáveis associadas à mortalidade em 30 e 90 dias. Todos os testes foram bilaterais, e a significância estatística adotada foi de p < 0,05.
 
RESULTADOS
 
Características dos pacientes
 
Durante o período de estudo, foram identificados 80 episódios de PAVM em 62 pacientes em VMP, sendo que 13 desses pacientes apresentaram mais de 1 episódio de PAVM (2 episódios em 9 pacientes, 3 episódios em 3 pacientes e 4 episódios em 1 paciente). As características dos pacientes e a apresentação clínica da PAVM são descritas na Tabela 1. Houve uma ligeira predominância no sexo masculino, e 40 episódios (50%) ocorreram em pacientes com idade > 70 anos. Os principais motivos de internação hospitalar foram pneumonia adquirida na comunidade, em 20 pacientes (25,0%); acidente vascular cerebral, em 19 (23,7%); outras infecções que não PAVM, em 7 (8,7%); traumatismo cranioencefálico, em 7 (8,7%); e insuficiência cardíaca congestiva, em 5 (6,2%).
 

 
Em relação à VM, todos os pacientes foram submetidos à traqueostomia, e a mediana de dias em VM desde o início da PAVM foi de 56 (variação: 21-564 dias). Os patógenos foram identificados em 65 dos 80 episódios (81,2%), sendo que o Pseudomonas aeruginosa representou quase metade dos isolados microbiológicos, enquanto Staphylococcus aureus não foi isolado. Houve apenas 1 episódio no qual dois isolados diferentes foram identificados (P. aeruginosa e Providencia stuartii). Os padrões de resistência a antibióticos são apresentados na Tabela 2. Os esquemas de antibioticoterapia empírica mais utilizados foram meropenem + colistina; meropenem + colistina + vancomicina; e piperacilina/tazobactam + colistina, em 23 (29%), 22 (27%) e 13 (16%) do número total de episódios de PAVM, respectivamente. Antibióticos beta-lactâmicos foram prescritos como terapia definitiva em 65 (81%) dos episódios (em associação com outros antibióticos em 28), da mesma forma que monoterapia com colistina em 11 e colistina em aerossol + antibióticos parenterais em 7 (todos os casos de infecção por P. aeruginosa).


 
Todos os pacientes, exceto 1, concluíram o acompanhamento de 30 dias na unidade. Esse paciente foi encaminhado a um hospital de cuidados intensivos de longa duração (HCILD) uma vez que a antibioticoterapia foi concluída. As taxas de mortalidade em 30 e 90 dias após o diagnóstico de PAVM foram de 30,0% e 63,7%, respectivamente.
 
Momento do início da PAVM
 
A Figura 1 apresenta a frequência de episódios de PAVM em relação à duração da VM em dias. Entre o 21º e o 50º dia de VM, ocorreram 36 dos 80 episódios de PAVM (45,0%). Até o 90º dia, já tinha havido 62 episódios de PAVM (77,5%).


 
Fatores associados às taxas de mortalidade em 30 e 90 dias
 

O modelo de regressão de Cox mostrou que a pontuação no SOFA e o uso de drogas vasoativas associaram-se à mortalidade em 30 dias, enquanto idade, pontuação no SOFA, uso de drogas vasoativas, e DPOC associaram-se à mortalidade em 90 dias (Tabela 3). Em uma análise post hoc, exploramos a interação entre PaO2/FiO2 < 200 e a pontuação no SOFA e entre PaO2/FiO2 < 200 e uso de drogas vasoativas por meio da adição de um termo de interação ao modelo. Nenhuma das interações foi significativa (p = 0,15 e p = 0,09, respectivamente). A Figura 2 apresenta as curvas de Kaplan-Meier para as variáveis associadas à mortalidade em 90 dias. Entre os pacientes que receberam drogas vasoativas, 22 (68%) apresentaram pontuação no SOFA > 5 e 10 (32%) apresentaram pontuação no SOFA ≤ 5 (p < 0,001).


 


DISCUSSÃO
 
Realizamos uma análise retrospectiva de pacientes com PAVM em VMP. Constatamos que idade, pontuação no SOFA, uso de drogas vasoativas e DPOC associaram-se a maior mortalidade. Até onde sabemos, este é o estudo com uma das maiores coortes de pacientes com PAVM em VMP e o primeiro a abordar preditores de mortalidade. A falta de informações sobre esse tema pode ser parcialmente devida à variedade de termos cunhados para o estudo dessa população e às diferentes definições desses termos ao longo do tempo. Decidimos utilizar VMP para a inclusão de indivíduos com PAVM, pois, em um estudo retrospectivo, é mais fácil identificar pacientes pela duração da VM, em conformidade com a definição da National Association for Medical Direction of Respiratory Care. (9) Entretanto, utilizando a definição das Chronically Critically Ill Population Payment Recommendations,(7) todos os nossos pacientes podem ser considerados pacientes com DCC.
 
Em nossa coorte, encontramos uma população idosa com significativa carga de comorbidades, causadas principalmente pelo comprometimento neurológico. Isso vai ao encontro dos achados de um estudo sobre PAVM em um HCILD.(24) No estudo, 19 pacientes apresentaram 23 episódios de PAVM, sendo que 69% necessitaram de VM em decorrência de uma causa neurológica. O comprometimento neurológico provavelmente explica a dificuldade de desmame da VM e a necessidade de VMP.
 
Em relação aos isolados microbiológicos, todos os episódios de PAVM em nosso estudo foram causados por bacilos gram-negativos, sendo que quase metade deles era P. aeruginosa, corroborando achados de um estudo envolvendo indivíduos com PAVM em um HCILD,(24) relatos feitos ao National Healthcare System Network(25) e achados de um estudo sobre PAVM em pacientes traqueostomizados.(26) P. aeruginosa é uma das principais causas de PAVM em todo o mundo. (27,28) A colonização prévia das vias aéreas por P. aeruginosa é um fator crucial para o desenvolvimento de PAVM. (29) É possível que pacientes em VMP e submetidos à traqueostomia apresentem maiores taxas de colonização, explicando parcialmente essas observações. S. aureus não foi isolado em nossos pacientes, o que pode corroborar achados de um estudo que relatou uma menor proporção de PAVM causada por S. aureus na PAVM de início tardio do que na PAVM de início precoce.(30)
 
A mediana de dias em VM antes do início da PAVM foi de 56, que é consideravelmente menor do que a relatada por Walkey et al.(24) — mediana = 166 dias (IIQ: 66-450). Diferentemente de um HCILD, nossa unidade recebe pacientes imediatamente após a fase aguda da doença crítica, o que explica o menor tempo entre a VM e o início da PAVM. A taxa de mortalidade em 30 dias foi de 30%. A mortalidade de pacientes com PAVM varia de 20% a 50%, com mortalidade atribuível de 13%.(31) Entretanto, esses dados são provenientes de casos de PAVM durante a VM aguda. Poucos estudos abordaram a PAVM em pacientes em VMP. Em um pequeno estudo sobre PAVM em pacientes traqueostomizados, 3 de 12 faleceram,(26) mas são necessários estudos em maior escala para estabelecer a taxa de mortalidade nessa população. Além disso, a mortalidade de pacientes com DCC é consideravelmente alta: as taxas de mortalidade hospitalar variam de 17% a 31%, enquanto as taxas de mortalidade em 6 e 12 meses são de 49% e 68%, respectivamente. (3,32,33) As infecções foram identificadas como um dos fatores associados à mortalidade em pacientes com DCC.(32) Entretanto, a mortalidade atribuível à PAVM nessa população ainda não foi determinada.
 
Encontramos fatores associados à mortalidade em 30 e 90 dias em nossa população. Existem alguns escores para predição da mortalidade em pacientes com DCC, como o escore ProVent,(34) mas eles não são específicos para PAVM. À semelhança das predições baseadas no escore ProVent, constatamos que idade e uso de drogas vasoativas associaram-se a desfechos fatais. Embora o escore SOFA inclua o uso de drogas vasoativas como fator, foi levado em consideração o uso dessas drogas em qualquer dia do episódio de PAVM até o final da antibioticoterapia, e a pontuação no SOFA foi calculada utilizando os resultados das variáveis obtidos no momento mais próximo ao diagnóstico de PAVM. Observamos que quase dois terços dos pacientes que receberam drogas vasoativas apresentaram maior pontuação no SOFA, então a colinearidade não pode ser totalmente descartada. Entretanto, o efeito das drogas vasoativas sobre a mortalidade foi maior do que o predito baseado no escore SOFA, e alguns pacientes que receberam drogas vasoativas apresentaram menor pontuação no SOFA. Portanto, a exata influência de cada variável ainda não foi determinada.
 
O escore SOFA é uma ferramenta útil para predição de mortalidade em pacientes críticos. Embora essa ferramenta seja utilizada de diferentes maneiras (diferenças entre pontuações obtidas no SOFA em dias diferentes, a maior pontuação, a média da pontuação, etc.), a pontuação inicial no SOFA tem valor comprovado na predição da mortalidade em UTI.(19) Em pacientes com PAVM, o escore SOFA também foi validado como fator prognóstico,(35,36) embora os estudos tenham sido realizados em UTIs de cuidados agudos. Tseng et al.(35) incluíram 163 pacientes com PAVM; entretanto, apenas 42 (26%) deles foram traqueostomizados, e não foi realizada análise de subgrupo, o que dificulta a extrapolação de seus resultados para a população com DCC.
 
A relação entre DPOC e PAVM foi estudada até certo ponto; ambas as condições interagem em diversos níveis: pacientes com DPOC em VM têm maior risco de PAVM. A DPOC é um fator independente associado a maior mortalidade, maior duração da VM, maior tempo de permanência na UTI e maiores taxas de infecção por P. aeruginosa em pacientes com PAVM.(37-40) Nossos resultados vão ao encontro dos resultados desses estudos com pacientes em VM aguda.(37-40) Entretanto, não encontramos nenhuma associação entre DPOC e mortalidade em 30 dias, mesmo tendo havido uma tendência nesse sentido (p = 0,06). Isso pode ser devido ao pequeno número de pacientes em nosso estudo, mas também pode refletir um efeito maior da DPOC sobre a mortalidade em 90 dias. É provável que quanto maior o tempo de acompanhamento do paciente desde o início da PAVM, maior será o efeito das condições crônicas sobre a mortalidade. Considerações semelhantes podem ser feitas em relação à idade. Em pacientes com DCC e alta carga de comorbidades, condições crônicas e idade pesam de forma mais consistente nos desfechos de longo prazo, coincidindo com a mortalidade geral. Talvez um desfecho mais curto, como mortalidade em 30 dias, seja mais adequado para essa população para definir a mortalidade atribuível das infecções nosocomiais. São necessários estudos prospectivos comparativos para lançar luz sobre essa questão.
 
O presente estudo possui várias limitações. Em primeiro lugar, é um estudo realizado em um único centro. Os cenários de atendimento a pacientes em VMP podem diferir entre os centros e apresentar populações heterogêneas. De fato, nossos resultados podem não ser generalizáveis para pacientes em HCILD, pois vários desses pacientes podem não apresentar complicações ou características semelhantes às de pacientes com DCC. Em segundo lugar, a natureza retrospectiva do estudo pode causar vieses inerentes a esse tipo de desenho. Algumas variáveis e fatores de confusão podem não ter sido levados em consideração em virtude da dificuldade de incluí-los em um estudo retrospectivo. Embora tenhamos tentado controlar para fatores de confusão utilizando análise de regressão de Cox, não podemos descartar totalmente que outras variáveis não incluídas na análise, como o momento do início da antibioticoterapia ou a presença de coinfecções, possam ter afetado nossos resultados. Em terceiro lugar, a definição utilizada para PAVM pode ter levado à inclusão de alguns pacientes com traqueobronquite associada à VM, o que é uma limitação inerente à definição. Em quarto lugar, a amostra pode ser considerada relativamente pequena; portanto, a validade externa pode ter sido comprometida e os resultados podem não ser totalmente generalizáveis para alguns dos achados. Isso destaca a necessidade de estudos multicêntricos que abordem os aspectos particulares de pacientes com PAVM em VMP.
 
Em conclusão, encontramos uma alta carga de comorbidades em nossa amostra, em sua maior parte relacionadas a condições neurológicas, bem como taxas de mortalidade consideravelmente altas em 30 e 90 dias. Identificamos fatores associados a desfechos fatais, os quais podem ajudar a identificar pacientes que podem se beneficiar da antibioticoterapia adequada precoce e também a determinar prognósticos. Esses achados devem ser validados por estudos com amostras maiores de pacientes.
 
CONTRIBUIÇÕES DOS AUTORES
 
SN: desenho do estudo, coleta de dados, pesquisa bibliográfica, análise de dados, redação do manuscrito e aprovação da versão final. GR: desenho do estudo, coleta de dados, pesquisa bibliográfica, redação do manuscrito e aprovação da versão final. MSZ e ME: desenho do estudo, redação do manuscrito e aprovação da versão final. MTV: desenho do estudo, redação do manuscrito, revisão final e aprovação da versão final.
 
REFERÊNCIAS
 



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