No presente número do Jornal Brasileiro de Pneumologia, um artigo original questiona o uso de rotina de TC na pesquisa de recidiva e de segunda neoplasia primária de pulmão.(1) Este é um assunto relevante, especialmente no campo de imagem em oncologia.
Em anos recentes vários autores têm descrito um aumento na sobrevida de pacientes com câncer de pulmão. Isso está relacionado a melhores opções de tratamento, as quais visam o controle do câncer de pulmão e de sua recorrência por meio de cirurgia, radioterapia e terapias sistêmicas, além de novas modalidades experimentais.(2)
Embora a probabilidade de recorrência local e à distância do tumor original diminua com o tempo, isso não ocorre com o risco de uma segunda neoplasia, sendo que Rice et al.(3) e Fink-Neuboek et al.(4) descreveram incidências de 8,6% e 7,3%, respectivamente. Outro estudo relatou que, independentemente do estádio ou tipo histológico da neoplasia pulmonar, os pacientes estão mais propensos a apresentar metástases à distância do que recorrência local, sendo candidatos a um tratamento adicional.(5)
Um número considerável de pacientes em estádios I-III de câncer de pulmão irá apresentar recorrência local (22-50%) ou à distância (3-20%) após tratamento com intuito curativo.(6) Devido ao alto risco de recorrência de neoplasias de pulmão não pequenas células e de segundos tumores primários de pulmão, a National Comprehensive Cancer Network e a American Association for Thoracic Surgery sugerem a realização de monitorização desses pacientes.(7) A American Society of Clinical Oncology recomenda o seguimento desses pacientes utilizando TC de tórax a cada seis meses nos primeiros dois anos após tratamento para detectar recorrência e, posteriormente, a cada ano para a identificação de uma nova neoplasia primária de pulmão.(8) Radiologistas e médicos nucleares devem reconhecer os achados relacionados às diferentes formas de tratamento realizadas e àqueles relacionados aos da neoplasia. Quando comparada com a TC, a 18F-FDG PET/TC apresenta um índice mais elevado de detecção de recorrências pós-cirúrgicas, sendo recomendada pela National Comprehensive Cancer Network para a diferenciação entre recorrência tumoral e alterações benignas, como atelectasias, consolidações e fibrose actínica, devendo-se, contudo, lembrar que é bastante comum haver captação do radiofármaco até cerca de três meses após a cirurgia para a retirada do tumor e até cerca de seis meses após tratamento radioterápico, principalmente quando utilizada radioterapia estereotáxica corporal, sem que isso signifique recidiva neoplásica.(7)
A definição da Union for International Cancer Control para ressecção incompleta considera a presença de tumor no sítio primário, em linfonodos ou à distância após o tratamento.(9,10) Isso é de fundamental importância quanto ao prognóstico e para que se indique tratamento adicional. Não é fácil estabelecer se há recorrência ou tumor residual quando houve, aparentemente, ressecção completa de um tumor, o que tem levado os cirurgiões a procurar refinamentos desses conceitos. A Spanish Society of Pulmonology and Thoracic Surgery propôs em 1998 as seguintes definições para a ressecção completa: (a) margens de ressecção sem evidência de comprometimento microscópico; (b) linfadenectomia mediastinal completa; (c) ausência de infiltração extracapsular de linfonodos; e (d) cadeias de linfonodos mais distantes livres de doença, ou seja, aqueles localizados mais superiormente em cadeias paratraqueais superiores e mais inferiormente na altura do ligamento pulmonar.(9) Deste modo, em relação à ressecção, a ausência de tumor residual é classificada como R0, a presença de neoplasia residual microscópica como R1 e, quando a evidência de lesão remanescente é macroscópica, como R2. A International Association for the Study of Lung Cancer propõe ainda um grupo que não é classificável nas definições de ressecção, ou seja, indeterminado (Ri).(11) As condições para a inclusão nesse grupo são as seguintes: exame de menos de três linfonodos N1 e de três N2, dissecção sistemática de linfonodos em relação a um lobo específico inferior ao preconizado, linfonodos comprometidos em cadeias mediastinais mais altas, carcinoma in situ na margem de ressecção brônquica e exame citológico do líquido pleural positivo.(11)
Conforme apresentado no artigo de Morellato et al.,(1) a literatura médica apresenta controvérsias quanto às modalidades de exames a serem realizadas nesses pacientes, assim como sua frequência e por quanto tempo. Além disso, os conceitos de neoplasia residual, recorrência e segundo tumor primário não são tão fáceis de serem estabelecidos. Nesse sentido, a discussão multidisciplinar integrando todos os profissionais envolvidos no diagnóstico e tratamento, do diagnóstico inicial e ao longo do seguimento, pode minimizar muitas dessas dúvidas.
REFERÊNCIAS
- Morellato JBF, Guimarães MD, Medeiros MLL, Carneiro HA, Oliveira AD, Médici JPO, et al. Routine follow-up after surgical treatment of lung cancer: is chest CT useful? J Bras Pneumol. 2021;47(4):20210025.
- Mahvi DA, Liu R, Grinstaff MW, Colson YL, Raut CP. Local Cancer Recurrence: The Realities, Challenges, and Opportunities for New Therapies. CA Cancer J Clin. 2018;68(6):488-505. https://doi.org/10.3322/caac.21498
- Rice D, Kim HW, Sabichi A, Lippman S, Lee JJ, Williams B, et al. The risk of second primary tumors after resection of stage I nonsmall cell lung cancer. Ann Thorac Surg. 2003;76(4):1001-1008. https://doi.org/10.1016/S0003-4975(03)00821-X
- Fink-Neuboeck N, Lindenmann J, Porubsky C, Fediuk M, Anegg U, Maier A, et al. Hazards of Recurrence, Second Primary, or Other Tumor at Ten Years After Surgery for Non-Small-Cell Lung Cancer. Clin Lung Cancer. 2020;21(4):333-340. https://doi.org/10.1016/j.cllc.2020.02.011
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- Edwards JG, Chansky K, Van Schil P, Nicholson AG, Boubia S, Brambilla E, et al. The IASLC Lung Cancer Staging Project: Analysis of Resection Margin Status and Proposals for Residual Tumor Descriptors for Non-Small Cell Lung Cancer. J Thorac Oncol. 2020;15(3):344-359. https://doi.org/10.1016/j.jtho.2019.10.019
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