AO EDITOR, O pneumomediastino ocorre quando a ruptura alveolar resultante de um aumento repentino da pressão intra-alveolar faz com que o ar escape para o espaço mediastinal, embora também possa ocorrer quando há escape de ar das vias aéreas, pulmões ou esôfago.(1,2) A ruptura alveolar permite que o ar livre disseque os tecidos subcutâneos cervicais, espaço epidural, pericárdio e cavidade peritoneal em direção ao mediastino.(2) Dor torácica, dispneia, enfisema de partes moles e estertores crepitantes são sintomas comuns.(1) No entanto, alguns pacientes são assintomáticos.(3) O pneumomediastino é geralmente classificado em espontâneo e secundário; este último é também denominado pneumomediastino traumático, cujas causas incluem as iatrogênicas.
Relatamos aqui o caso de um homem saudável de 57 anos, não fumante, submetido a cirurgia artroscópica sob anestesia geral em virtude do rompimento dos tendões supraespinal e infraespinal esquerdos. Após o procedimento, o paciente apresentou enfisema subcutâneo palpável na região do ombro esquerdo, cervical esquerda e infraclavicular esquerda. Ele não apresentava dor, dispneia ou instabilidade hemodinâmica. A TC de tórax revelou enfisema subcutâneo extenso da parede torácica esquerda, estendendo-se pelo braço esquerdo e todo o pescoço, até o lado esquerdo do rosto (Figura 1).
O paciente foi colocado em repouso no leito com oxigênio suplementar para melhorar a reabsorção de ar no mediastino e foi monitorado de perto. Ele não foi submetido a broncoscopia. Não obstante, a ausência de achados tomográficos de lesão das vias aéreas, a ausência de doença pulmonar prévia e o fato de que o enfisema subcutâneo estava nitidamente do lado esquerdo nos levaram a crer que o pneumomediastino havia sido causado pelo procedimento artroscópico.
A cirurgia artroscópica do ombro é um procedimento comum, com taxa de complicações de até 7,9%.(4) O pneumomediastino é uma complicação rara da cirurgia artroscópica do ombro,(5,6) com apenas 8 casos relatados na literatura.(6) O mecanismo patogênico exato permanece incerto. As possíveis causas são anestesia geral/locorregional, intubação endotraqueal, o procedimento em si,(5-7) mobilização precoce(5) e complicações infecciosas após o procedimento.(8)
No caso aqui relatado, como em outros casos semelhantes, o pneumomediastino provavelmente estava relacionado com o procedimento. Durante a artroscopia do ombro, o espaço subacromial é dilatado pela pressão do líquido da bomba de infusão. Isso permite boa visualização da articulação e, ao mesmo tempo, mantém a pressão intra-articular regular.(7) Quando o power shaver aplica sucção, a pressão no espaço subacromial diminui temporariamente e se torna negativa. Sob essa pressão negativa, o ar pode ficar preso no espaço subacromial. Quando a bomba de infusão gera pressão positiva, permite que o ar disseque os tecidos circundantes se o shaver for momentaneamente desligado, causando enfisema subcutâneo.(5,7) Nesse contexto, outras possíveis causas de pneumomediastino são junção frouxa entre a bolsa de solução e a válvula, e influxo de ar pelos portais.(5) O ar pode viajar pela bainha axilar e chegar ao espaço pré-vertebral do pescoço, circundando a traqueia e o esôfago.(5,7)
Após a exclusão de doenças concomitantes e o diagnóstico de pneumomediastino, o tratamento conservador é adequado, pois o ar na cavidade mediastinal é gradativamente reabsorvido pelo tecido circundante. (2,9) No entanto, recomenda-se o monitoramento do paciente em curto prazo,(10) com repouso no leito e supressão da tosse para evitar a manobra de Valsalva. O caso aqui relatado é relevante porque já foram relatados outros casos semelhantes e porque a artroscopia é um procedimento cirúrgico comum.
CONTRIBUIÇÕES DOS AUTORES CCC: redação do manuscrito; PGF: coleta dos dados; CV e PGF: revisão crítica do manuscrito; CCC, CV e PGF: aprovação da versão final para publicação.
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