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ISSN (on-line): 1806-3756

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Editorial

Algo não tão novo para a linfangioleiomiomatose: VEGF-D é um copo meio vazio ou meio cheio?

Something not so new for lymphangioleiomyomatosis: is VEGF-D a glass half empty or half full?

Alexandre Franco Amaral1, Carlos Roberto Ribeiro Carvalho1, Bruno Guedes Baldi1,2,3

DOI: 10.36416/1806-3756/e20220046

Um cisto pulmonar isolado em TCAR de tórax geralmente é apenas um achado incidental sem significado clínico relevante(1); no entanto, basta encontrar mais alguns cistos para que se torne um verdadeiro quebra-cabeça diagnóstico. A TCAR, juntamente com uma avaliação clínica completa, é na verdade uma ferramenta inicial essencial para tentar diminuir a ampla gama de diagnósticos diferenciais, mas em vários pacientes com doenças pulmonares císticas difusas (DPCD) um diagnóstico definitivo ainda não pode ser alcançado sem investigações adicionais.(2)
 
A linfangioleiomiomatose (LAM) é uma doença neoplásica rara de baixo grau que acomete principalmente mulheres em idade reprodutiva em sua forma esporádica ou associada ao complexo esclerose tuberosa. A LAM é caracterizada por pequenos cistos pulmonares difusos, finos, regulares e bem definidos na TCAR, cujas imagens tornaram-se uma modalidade essencial no diagnóstico da doença. No entanto, o diagnóstico de LAM só pode ser estabelecido na presença de outras características extratorácicas, caso contrário, pode exigir confirmação histopatológica.(3) Mesmo quando uma apresentação tomográfica “típica” de LAM é considerada, diagnósticos alternativos e menos comuns, como bronquiolite, provaram ser possíveis.(4)
 
A quantificação de VEGF-D sérico surgiu como uma potencial ferramenta diagnóstica com grande especificidade e sensibilidade razoável para diferenciar LAM de outras DPCD e de controles saudáveis.(5-7) Além disso, desde a primeira avaliação prospectiva de VEGF-D, ele demonstra indicar informações prognósticas e ser útil como um biomarcador de gravidade da doença e resposta ao tratamento.(7-9) Uma implicação importante de concentrações elevadas de VEGF-D na abordagem de DPCD é evitar a necessidade de biópsia pulmonar, o que levou a American Thoracic Society/Japanese Respiratory Society em suas diretrizes de prática clínica,(10) apesar de sua confiança moderada, a recomendar fortemente o uso desse biomarcador como uma ferramenta de diagnóstico na suspeita de LAM antes da amostragem por biópsia tecidual. Bem, o assunto parece estar resolvido então, mas nem tudo são flores.
 
Primeiro, o limiar ideal do nível sérico de VEGF-D ainda não está determinado. Atualmente, um valor de corte ≥ 800 pg/mL tem alta especificidade e é recomendado como parâmetro diagnóstico para LAM, mas os valores medianos são extremamente variáveis, e usar esse limiar para discriminar pacientes com LAM de pacientes sem LAM carece de sensibilidade: quase metade dos pacientes com LAM pode apresentar resultados falso-negativos. (6) Nosso grupo(7) também descreveu uma coorte de pacientes brasileiros com LAM com concentrações séricas de VEGF-D um pouco menores do que em relatos anteriores.(5,6) Embora tais variações nos níveis de VEGF-D podem ser atribuídas a verdadeiras diferenças nas características intrínsecas da população, elas também podem ser parcialmente explicadas por discrepâncias nas análises laboratoriais, como coleta, armazenamento e processamento de amostras; tempo de diagnóstico; e outras características individuais do paciente, como envolvimento linfático, que está associado a níveis mais altos de VEGF-D.(7) Maior gravidade da doença e progressão mais rápida da doença associada a níveis basais elevados de VEGF-D foram demonstrados em alguns estudos, mas esses achados não puderam ser replicados em outros.(3) Além disso, o tratamento com sirolimo pode levar a uma diminuição dos níveis séricos de VEGF-D,(8) mas a magnitude desse declínio não está bem correlacionada com a melhora funcional.(11)
 
Neste número do Jornal Brasileiro de Pneumologia, Li et al.(12) ajudam a esclarecer o assunto. Os autores conduziram uma rigorosa revisão sistemática e meta-análise sobre o desempenho diagnóstico de VEGF-D para LAM. Dez estudos realizados entre 2009 e 2019 foram incluídos na meta-análise, resultando em um total de quase mil indivíduos, um número provavelmente inatingível no cenário de uma doença rara. Os achados podem parecer esperados, mas ainda são de alguma forma tranquilizadores. O estudo mostrou um excelente desempenho diagnóstico do VEGF-D com grande precisão geral, além de uma AUC de 0,98. Nenhum efeito no limiar adotado, na composição do grupo de controle ou na localização do sítio foi observado, o que nos faz inferir uma razoável generalização dos achados. No entanto, a qualidade dos resultados foi considerada baixa com base no sistema GRADE, principalmente devido ao alto risco de viés e heterogeneidade entre os estudos. Além disso, embora a especificidade mal tenha atingido unidade, a sensibilidade foi menor e apresentou maior variabilidade, com intervalo de confiança mais amplo.
 
Tais informações podem não ser novas, uma vez que o VEGF-D já foi recomendado como ferramenta diagnóstica padrão, mas revisitando conceitos estabelecidos com a adição de novas evidências, especialmente no cenário de achados conflitantes, dúvidas sobre valores ideais e sobre a extensão de conclusões tiradas de estudos anteriores são definitivamente muito bem-vindas.
 
O estudo de Li et al.(12) confirmou a utilidade do VEGF-D como biomarcador para evitar um procedimento invasivo em vários pacientes com LAM e ratificou um valor de corte, embora conservador, de 800 pg/mL como o de maior acurácia possível dentro da variabilidade. A implicação clínica direta de uma intervenção tão segura justifica o fato de os autores(12) terem recomendado fortemente o uso da quantificação de VEGF-D sérico na suspeita de LAM. Por outro lado, o estudo reforça que, mesmo com a determinação dos níveis séricos de VEGF-D, alguns pacientes ainda precisarão realizar biópsia pulmonar para confirmar o diagnóstico de LAM. A incorporação do VEGF-D na prática clínica também está longe de ser viável para a maioria dos profissionais de saúde, uma vez que sua ampla disponibilidade e acesso a testes padronizados com qualidade controlada ainda não fazem parte da realidade local, mesmo em centros de referência.(3)
 
Por fim, o papel do VEGF-D sérico no diagnóstico da LAM parece estar bem estabelecido, com seus pontos fortes e fracos corroborados pelo estudo de Li et al.(12) Afinal, VEGF-D ainda é o melhor método diagnóstico para a abordagem de pacientes com suspeita de LAM sem outras características clínicas e tomográficas confirmatórias? A resposta é sim, mas há limitações e questões relevantes que ainda precisam ser abordadas. Ou seja, o copo continua meio cheio ou meio vazio. Portanto, a avaliação de biomarcadores emergentes no soro ou no líquido de LBA, talvez em combinação com VEGF-D, é justificada e deve ser mais explorada na abordagem da LAM e de outras DPCD como auxílio ao diagnóstico, prognóstico e resposta ao tratamento.

REFERÊNCIAS
 
1.            Hochhegger B, Marchiori E, Rodrigues R, Mançano A, Jasinowodolinski D, Chate RC, et al. Consensus statement on thoracic radiology terminology in Portuguese used in Brazil and in Portugal [published correction appears in J Bras Pneumol. 2022 Jan 10;47(6):e20200595errata]. J Bras Pneumol. 2021;47(5):e20200595. https://doi.org/10.36416/1806-3756/e20200587
2.            Baldi BG, Carvalho CRR, Dias OM, Marchiori E, Hochhegger B. Diffuse cystic lung diseases: differential diagnosis. J Bras Pneumol. 2017;43(2):140-149. https://doi.org/10.1590/s1806-37562016000000341
3.            McCarthy C, Gupta N, Johnson SR, Yu JJ, McCormack FX. Lymphangioleiomyomatosis: pathogenesis, clinical features, diagnosis, and management. Lancet Respir Med. 2021;9(11):1313-1327. https://doi.org/10.1016/S2213-2600(21)00228-9
4.            de Oliveira MR, Dias OM, Amaral AF, do Nascimento ECT, Wanderley M, Carvalho CRR, et al. Diffuse cystic lung disease as the primary tomographic manifestation of bronchiolitis: A case series. Pulmonology. 2020;26(6):403-406. https://doi.org/10.1016/j.pulmoe.2020.01.006
5.            Young LR, Vandyke R, Gulleman PM, Inoue Y, Brown KK, Schmidt LS, et al. Serum vascular endothelial growth factor-D prospectively distinguishes lymphangioleiomyomatosis from other diseases. Chest. 2010;138(3):674-681. https://doi.org/10.1378/chest.10-0573
6.            Terraneo S, Lesma E, Ancona S, Imeri G, Palumbo G, Torre O, et al. Exploring the Role of Matrix Metalloproteinases as Biomarkers in Sporadic Lymphangioleiomyomatosis and Tuberous Sclerosis Complex. A Pilot Study. Front Med (Lausanne). 2021;8:605909. https://doi.org/10.3389/fmed.2021.605909
7.            Amaral AF, de Oliveira MR, Dias OM, Arimura FE, Freitas CSG, Acencio MMP, et al. Concentration of Serum Vascular Endothelial Growth Factor (VEGF-D) and Its Correlation with Functional and Clinical Parameters in Patients with Lymphangioleiomyomatosis from a Brazilian Reference Center. Lung. 2019;197(2):139-146. https://doi.org/10.1007/s00408-018-00191-3
8.            Young L, Lee HS, Inoue Y, Moss J, Singer LG, Strange C, et al. Serum VEGF-D a concentration as a biomarker of lymphangioleiomyomatosis severity and treatment response: a prospective analysis of the Multicenter International Lymphangioleiomyomatosis Efficacy of Sirolimus (MILES) trial. Lancet Respir Med. 2013;1(6):445-452. https://doi.org/10.1016/S2213-2600(13)70090-0
9.            Nijmeh J, El-Chemaly S, Henske EP. Emerging biomarkers of lymphangioleiomyomatosis. Expert Rev Respir Med. 2018;12(2):95-102. https://doi.org/10.1080/17476348.2018.1409622
10.          McCormack FX, Gupta N, Finlay GR, Young LR, Taveira-DaSilva AM, Glasgow CG, et al. Official American Thoracic Society/Japanese Respiratory Society Clinical Practice Guidelines: Lymphangioleiomyomatosis Diagnosis and Management. Am J Respir Crit Care Med. 2016;194(6):748-761. https://doi.org/10.1164/rccm.201607-1384ST
11.          Taveira-DaSilva AM, Jones AM, Julien-Williams P, Stylianou M, Moss J. Long-Term Effect of Sirolimus on Serum Vascular Endothelial Growth Factor D Levels in Patients With Lymphangioleiomyomatosis. Chest. 2018;153(1):124-132. https://doi.org/10.1016/j.chest.2017.05.012
12.          Li M, Zhu WY, Yang XD, Li WM, Wang G. Diagnostic performance of the vascular endothelial growth factor-D for lymphangioleiomyomatosis: a meta-analysis. J Bras Pneumol. 2022;48(1):e20210337.

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