AO EDITOR, Esta carta aborda pesquisas recentes sobre como a atenuação do parênquima pulmonar influencia a volumetria de nódulos pulmonares. Esse tópico é relevante para as partes interessadas da assistência à saúde e pacientes submetidos a programas de rastreamento de câncer de pulmão (RCP).
Já foi comprovado que a TC de tórax de baixa dose no RCP reduz os óbitos por câncer de pulmão em 20% em comparação com a radiografia de tórax.(1)
O limiar de unidades Hounsfield (UH) entre pulmão aerado normal e enfisema varia entre os autores, mas tem sido comumente aceito o limiar de −950 UH.(2)
Os sistemas de saúde em todo o mundo estão implementando programas de RCP utilizando TC de baixa dose e novas ferramentas de software para detecção e segmentação de nódulos pulmonares, incluindo ferramentas de software para volumetria automática e semiautomática de nódulos pulmonares. Sociedades internacionais recomendam o uso dessas ferramentas de volumetria na avaliação de nódulos pulmonares incidentais e seu seguimento se forem maiores que 100 mm3 (Fleischner Society) ou 80 mm3 (British Thoracic Society).(3,4)
Do ponto de vista técnico, essas ferramentas funcionam realizando a extração virtual do nódulo do parênquima pulmonar adjacente e outras estruturas como paredes e vasos brônquicos. O chamado algoritmo de segmentação “region-growing” pode realizar essa extração de forma semiautomática (ou seja, o operador localiza o nódulo manualmente) ou automática (ou seja, o sistema de computador identifica e segmenta automaticamente os nódulos pulmonares) como na detecção auxiliada por computador.
A partir do voxel inicial selecionado, o algoritmo tenta identificar todos os voxels contíguos a esse ponto que possuem um valor de densidade semelhante ao do ponto selecionado. O processo continua até que a margem do nódulo seja determinada pela mudança abrupta nos valores de densidade em virtude da presença de ar no pulmão adjacente ao nódulo. Existe um alto contraste entre os espaços aéreos parenquimatosos pulmonares ventilados próximos a −950 UH de atenuação e um nódulo pulmonar sólido (acima de −500 UH).(5) Muitas pesquisas têm sido dedicadas à identificação dos fatores técnicos que influenciam as ferramentas de volumetria. Esses fatores podem estar relacionados ao tomógrafo, parâmetros de aquisição (por exemplo, espessura de corte, sobreposição de secções, filtro [kernel], algoritmo de reconstrução) e software utilizados. Outros fatores estão relacionados ao paciente ou ao próprio nódulo (por exemplo, aquisição em inspiração ou expiração, tamanho, localização, forma ou densidade).(5)
Pouco tem sido pesquisado sobre a influência da densidade do parênquima pulmonar ou da atenuação do parênquima pulmonar nessas ferramentas de inteligência artificial, embora doenças pulmonares que causam alterações na densidade do parênquima pulmonar sejam comuns em estudos de TC de tórax. As condições que causam alterações na densidade pulmonar podem ser reunidas em dois grupos: doenças que causam aumento da atenuação do parênquima (por exemplo, infecção, neoplasias ou doença pulmonar intersticial); e doenças que causam diminuição da atenuação do parênquima (por exemplo, enfisema, cistos, bronquiectasias ou faveolamento).
Seria intuitivo considerar que doenças que causam diminuição da atenuação pulmonar, como cistos e enfisema, melhorariam o delineamento das margens do nódulo quando a diminuição da atenuação é adjacente ao nódulo e potencialmente melhorariam a precisão da ferramenta de volumetria e reduziriam sua variabilidade (Figura 1A). No entanto, vários estudos investigaram doenças que causam diminuição da atenuação pulmonar, como cistos e enfisema, como fatores que influenciam a volumetria de nódulos pulmonares, e, até o momento, nenhum efeito consistente foi demonstrado.(5,6)
Uma pesquisa recente baseada em um grande programa de RCP mostrou que o aumento da atenuação pulmonar adjacente a um nódulo está inversamente relacionado à probabilidade de boa segmentação desse mesmo nódulo por ferramentas de volumetria (Figuras 1B e 1C).(7) Portanto, deve-se ter cautela no uso de ferramentas específicas de volumetria de nódulos pulmonares em pacientes com doenças acompanhadas de aumento da densidade pulmonar, quando os nódulos estão localizados nas áreas afetadas.
As doenças pulmonares intersticiais (DPI) apresentam aumento da densidade do parênquima e são comuns em pacientes de RCP. Estudos sobre programas de RCP relatam DPI em aproximadamente 5% a 25% dos pacientes. Os tipos mais comuns de DPI encontrados em pacientes de RCP são as DPI relacionadas ao tabagismo, incluindo fibrose intersticial relacionada ao tabagismo, fibrose pulmonar idiopática, pneumonia intersticial descamativa e DPI associada à bronquiolite respiratória.(8)
Com esta breve carta, nosso objetivo é aumentar a conscientização de radiologistas e pneumologistas sobre esse fator limitante recentemente identificado das ferramentas de volumetria. À medida que avançamos em direção à detecção precoce do câncer de pulmão e à implementação mundial de programas de RCP, acreditamos que reconhecer as potenciais armadilhas das ferramentas de volumetria é essencial para a obtenção dos benefícios da assistência à saúde baseada em evidências.
CONTRIBUIÇÕES DOS AUTORES DP e EP: concepção e redação do manuscrito. EM: revisão e edição do manuscrito. LTB e KI: revisão do manuscrito. Todos os autores: aprovação da versão final do manuscrito.
CONFLITO DE INTERESSE Não declarado.
REFERÊNCIAS 1. National Lung Screening Trial Research Team, Aberle DR, Adams AM, Berg CD, Black WC, Clapp JD, et al Reduced lung-cancer mortality with low-dose computed tomographic screening. N Engl J Med. 2011;365(5):395-409. https://doi.org/10.1056/NEJMoa1102873
2. Lynch DA, Al-Qaisi MA. Quantitative computed tomography in chronic obstructive pulmonary disease. J Thorac Imaging. 2013;28(5):284-290. https://doi.org/10.1097/RTI.0b013e318298733c
3. MacMahon H, Naidich DP, Goo JM, Lee KS, Leung ANC, Mayo JR, et al. Guidelines for Management of Incidental Pulmonary Nodules Detected on CT Images: From the Fleischner Society 2017. Radiology. 2017;284(1):228-243. https://doi.org/10.1148/radiol.2017161659
4. Callister ME, Baldwin DR, Akram AR, Barnard S, Cane P, Draffan J, et al. British Thoracic Society guidelines for the investigation and management of pulmonary nodules [published correction appears in Thorax. 2015 Dec;70(12):1188]. Thorax. 2015;70 Suppl 2:ii1-ii54. https://doi.org/10.1136/thoraxjnl-2015-207168
5. Devaraj A, van Ginneken B, Nair A, Baldwin D. Use of Volumetry for Lung Nodule Management: Theory and Practice. Radiology. 2017;284(3):630-644. https://doi.org/10.1148/radiol.2017151022
6. Moser JB, Mak SM, McNulty WH, Padley S, Nair A, Shah PL, et al. The influence of inspiratory effort and emphysema on pulmonary nodule volumetry reproducibility. Clin Radiol. 2017;72(11):925-929. https://doi.org/10.1016/j.crad.2017.06.117
7. Penha D, Pinto E, Hochhegger B, Monaghan C, Marchiori E, Taborda-Barata L, et al. The impact of lung parenchyma attenuation on nodule volumetry in lung cancer screening. Insights Imaging. 2021;12(1):84. https://doi.org/10.1186/s13244-021-01027-0
8. Chung JH, Richards JC, Koelsch TL, MacMahon H, Lynch DA. Screening for Lung Can-cer: Incidental Pulmonary Parenchymal Findings. AJR Am J Roentgenol. 2018;210(3):503-513. https://doi.org/10.2214/AJR.17.19003