ABSTRACT
Objective: To evaluate the process of diagnosing patients with malignant pleural mesothelioma (MPM) at a tertiary care hospital. Methods: This was a retrospective study involving patients referred to a tertiary-care cancer center in Brazil between 2009 and 2020. The diagnostic process was divided into four steps: onset of symptoms, referral to a specialist visit, histopathological diagnosis, and beginning of treatment. The intervals between each phase and the factors for delays were evaluated. Data including clinical status, radiological examinations, staging, treatment modalities, and survival outcomes were collected. Results: During the study period, 66 patients (mean age = 64 years) were diagnosed with MPM and underwent treatment. Only 27 (41%) of the patients had knowledge of prior exposure to asbestos. The median number of months (IQR) between the onset of symptoms and the first specialist visit, between the specialist visit and histopathological characterization, and between definite diagnosis and beginning of treatment was, respectively, 6.5 (2.0-11.4), 1.5 (0.6-2.1), and 1.7 (1.2-3.4). The knowledge of prior asbestos exposure was associated with a shorter time to referral to a specialist (median: 214 vs. 120 days; p = 0.04). A substantial number of nondiagnostic procedures and false-negative biopsy results (the majority of which involved the use of Cope needle biopsy) were found to be decisive factors for the length of waiting time. The mean overall survival was 11.9 months. Conclusions: The unfamiliarity of health professionals with MPM and the patient's lack of knowledge of prior asbestos exposure were the major factors to cause a long time interval between the onset of symptoms and beginning of treatment. An overall survival shorter than 1 year is likely to have been due to the aforementioned delays.
Keywords:
Mesothelioma; Mesothelioma, malignant; Pleural effusion, malignant; Pleural diseases.
RESUMO
Objetivo: Avaliar o processo de diagnóstico de pacientes com mesotelioma pleural maligno (MPM) em um hospital terciário. Métodos: Estudo retrospectivo envolvendo pacientes encaminhados a um centro oncológico terciário no Brasil entre 2009 e 2020. O processo diagnóstico foi dividido em quatro etapas: início dos sintomas, encaminhamento para consulta especializada, diagnóstico histopatológico e início do tratamento. Foram avaliados os intervalos entre as etapas e os fatores de atraso. Os dados coletados incluíram estado clínico, exames radiológicos, estadiamento, modalidades de tratamento e resultados de sobrevida. Resultados: Durante o período do estudo, 66 pacientes (média de idade = 64 anos) foram diagnosticados com MPM e submetidos a tratamento. Apenas 27 (41%) dos pacientes tinham conhecimento de exposição prévia ao amianto. A mediana de meses (IIQ) entre o início dos sintomas e a primeira consulta especializada, entre a consulta especializada e a caracterização histopatológica e entre o diagnóstico definitivo e o início do tratamento foi, respectivamente, de 6,5 (2,0-11,4), 1,5 (0,6 -2,1) e 1,7 (1,2-3,4). Conhecimento de exposição prévia ao amianto associou-se a menor tempo para encaminhamento a um especialista (mediana: 214 vs. 120 dias; p = 0,04). O número substancial de procedimentos não diagnósticos e as biópsias falso-negativas (a maioria envolvendo o uso de biópsia com agulha de Cope) foram considerados fatores decisivos para o tempo de espera. A sobrevida global média foi de 11,9 meses. Conclusões: A falta de familiaridade dos profissionais de saúde com o MPM e o desconhecimento dos pacientes em relação à exposição prévia ao amianto foram os principais fatores que ocasionaram um longo intervalo de tempo entre o início dos sintomas e o início do tratamento. A sobrevida global inferior a 1 ano provavelmente se deve aos atrasos supracitados.
Palavras-chave:
Mesotelioma; Mesotelioma maligno; Derrame pleural maligno; Doenças pleurais.
INTRODUÇÃO O mesotelioma pleural maligno (MPM) tem associação comprovada com a exposição prévia ao amianto. Apesar dessa correlação, a maioria dos países da América Latina (AL) ainda não adotou amplas restrições às indústrias de mineração e processamento de amianto.(1) Durante décadas, o Brasil foi o terceiro maior produtor de amianto do mundo, respondendo por 15,1% da produção global de amianto em 2015.(2) No entanto, entre 1980 e 2010, apenas 3.718 óbitos decorrentes da exposição ao amianto foram notificados ao Sistema de Informações sobre Mortalidade, sendo que esses óbitos foram notificados como decorrentes de algum tipo de câncer de pleura, incluindo, não exclusivamente, o mesotelioma. Por outro lado, 2.497 óbitos decorrentes da exposição ao amianto foram notificados nos Estados Unidos somente em 2013, onde a mineração de amianto está proibida desde 2002.(3)
Estudos sobre o mesotelioma na AL são escassos e geralmente limitados a relatos de casos, séries de casos ou estudos epidemiológicos breves.(4,5) Além disso, apesar da posição historicamente crítica em relação à produção de amianto, o Brasil foi responsável apenas por 22 dos 6.907 artigos sobre amianto e mesotelioma publicados entre 1988 e 2011.(4)
A falta de dados dificulta uma intervenção mais efetiva e direcionada para a população geral e os profissionais de saúde que ainda têm dificuldades na identificação da doença, causando o subdiagnóstico e subnotificação atuais.(1) Como estudos descritivos são fundamentais para o desenvolvimento de melhores políticas de saúde e o progresso das pesquisas, o objetivo do presente estudo foi avaliar o processo de diagnóstico de pacientes encaminhados a um centro oncológico terciário público no Brasil.
MÉTODOS Trata-se de um estudo retrospectivo realizado em um centro oncológico em São Paulo (SP). Todos os pacientes diagnosticados com MPM e atendidos entre julho de 2009 e dezembro de 2020 tiveram seus prontuários revisados. Apenas os pacientes com diagnóstico histopatológico de MPM foram incluídos. Os dados coletados incluíram características demográficas, histórico médico pregresso, procedimentos diagnósticos, exames radiológicos (incluindo TC e PET/TC com 18F-FDG), laudos histopatológicos, estadiamento da doença, modalidades de tratamento e mortalidade.
Para avaliar o processo diagnóstico do MPM para cada paciente, os prontuários médicos foram especificamente revisados quanto aos quatro seguintes eventos: início dos sintomas; primeira consulta especializada (com pneumologista, cirurgião torácico ou oncologista); caracterização histopatológica adequada; e início do tratamento, incluindo quimioterapia, radioterapia ou cirurgia — pleurectomia/decorticação ou pleuropneumonectomia.
O performance status (estado de desempenho) foi classificado utilizando a escala do ECOG.(6) Como este estudo envolve um intervalo de tempo em que duas diferentes edições da classificação TNM (7ª e 8ª) estavam em uso, cada prontuário médico baseado na 7ª edição foi revisado e reclassificado de acordo com a 8ª edição.
Os dados foram avaliados quanto à normalidade de distribuição por meio do teste de Shapiro-Wilk e descritos como médias e desvios-padrão ou como medianas e intervalos interquartis, respectivamente, quando a distribuição foi normal ou não normal. A associação entre variáveis categóricas e contínuas com distribuição não normal foi analisada por meio do teste U de Mann-Whitney. A correlação entre as variáveis contínuas não normais foi testada com o coeficiente de correlação de Spearman. O estimador de Kaplan-Meier e o teste de log-rank foram adotados para a análise da sobrevida.
Todas as análises estatísticas foram realizadas por meio do programa R, versão 4.1.1, e do programa R Studio, versão 3 (R Studio, Boston, MA, EUA). Adotou-se um nível de significância de p < 0,05.
O comitê de ética em pesquisa aprovou este estudo (Protocolo n. 02213612.8.0000.0068). O consentimento individual do paciente foi dispensado em virtude da natureza retrospectiva da pesquisa e do fato de que todos os dados foram manejados de forma anônima.
RESULTADOS Entre 2009 e 2020, foi atendido um total de 66 pacientes. Os prontuários de todos esses pacientes foram revisados, e algumas das características avaliadas estão resumidas na Tabela 1. A razão homem/mulher foi de 3,7:1,0, e os indivíduos tinham média de idade de 64,3 ± 11,3 anos no momento do diagnóstico. Vinte e seis pacientes tinham pontuação ECOG igual ou superior a 2. Vale notar que 30 (45%) e 11 (17%) dos indivíduos eram fumantes e ex-fumantes, respectivamente. Além disso, menos da metade dos pacientes (41%) tinha conhecimento de exposição prévia ao amianto.
O mesotelioma epitelioide foi o principal subtipo histopatológico, respondendo por 88% dos casos, com predominância no lado direito (em 56%). O valor padronizado de captação (SUV, do inglês standardized uptake value) médio para metade dos pacientes submetidos à PET/TC com 18F-FDG foi de 8,60 ± 4,05.
O número de meses despendidos em cada etapa do processo diagnóstico está descrito na Figura 1. Após o início dos sintomas, uma mediana de 6,5 meses (2,0-11,4 meses) se passou antes que o paciente tivesse uma consulta especializada. Antes da realização da biópsia pleural ou do encaminhamento ao nosso centro oncológico, os pacientes haviam sido submetidos a uma mediana de 2 procedimentos (variação: 0-5), principalmente toracocentese, com o único objetivo de aliviar os sintomas, já que raramente fora solicitada citologia oncológica. O teste U de Mann-Whitney foi utilizado para testar a hipótese de que havia correlação entre conhecimento de exposição prévia ao amianto e menor tempo para o encaminhamento. A mediana de dias para o encaminhamento foi de 214 vs. 120 dias (teste U de Mann-Whitney: 231,5 vs. 419,5 dias; p = 0,04) para o grupo que não tinha conhecimento de exposição prévia ao amianto e o grupo que tinha conhecimento dessa exposição. A correlação entre o número de procedimentos prévios à consulta especializada e o número de dias para o encaminhamento foi analisada por meio do coeficiente de correlação de Spearman. Foi encontrada uma pequena relação negativa e não significativa (ρ = −0,07; IC95%: −0,39 a 0,26; p = 0,68).
A mediana de tempo para a caracterização histopatológica adequada da neoplasia foi de 1,5 mês (0,6-2,1). Apenas 27 (40,9%) dos pacientes haviam sido submetidos à biópsia pleural antes do encaminhamento, sendo 7 (25,9%) relatados como negativos para qualquer tipo de processo neoplásico. Em virtude de exame histopatológico inadequado ou ausência de diagnóstico histopatológico, 40 pacientes foram submetidos à biópsia pleural (biópsia cirúrgica, em 23; biópsia com agulha de Cope, em 14; e biópsia guiada radiologicamente, em 3) após serem encaminhados ao nosso centro oncológico. Desses, 9 apresentaram biópsia negativa que foi posteriormente diagnosticada como MPM — 8 submetidos à biópsia com agulha de Cope (taxa de falso-negativos de 57,1%) e 1 dos submetidos à biópsia cirúrgica (taxa de falso-negativos = 4,3%). Análise citológica do derrame pleural antes da biópsia pleural foi realizada em 26 pacientes, dos quais 15 (57,7%) apresentaram resultado negativo.
O estadiamento da doença e a decisão sobre o tratamento exigiram uma mediana de 1,7 mês (1,2-3,4) antes do início do tratamento. Apenas 15 pacientes eram oncologicamente e/ou clinicamente adequados para qualquer tratamento cirúrgico de grande porte; portanto, pleuropneumonectomia e pleurectomia/decorticação puderam ser realizadas em 11 e 4 pacientes, respectivamente.Em nossa amostra, 44 pacientes receberam quimioterapia, 15 receberam quimioterapia e radioterapia, e 1 foi tratado com imunoterapia. No entanto, 6 pacientes não puderam se submeter a nenhum tipo de tratamento e receberam apenas cuidados de suporte.
O tempo de sobrevida global após o diagnóstico foi de 11,9 meses (IC95%: 8,4-15,3). As análises de sobrevida considerando todos os indivíduos e segundo o estadiamento da doença são apresentadas nas Figuras 2 e 3, respectivamente. Não foi realizada análise de sobrevida baseada nos subtipos histológicos em virtude do pequeno número de pacientes com os subtipos sarcomatoide e bifásico e, portanto, não foi feita nenhuma tentativa de comparar estatisticamente esses grupos.
DISCUSSÃO Infelizmente, poucos centros oncológicos da AL têm um número razoável de casos de MPM para permitir uma experiência ideal com a doença. Em 2019, foi publicado o maior estudo observacional sobre o mesotelioma na AL, incluindo 302 pacientes de nove países/centros diferentes.(7) A análise concentrou-se na taxa global de resposta à quimioterapia de primeira linha e em fatores relacionados à sobrevida livre de progressão. Embora o estudo(7) tenha fornecido informações fundamentais sobre características clínicas e patológicas, ele compilou dados de países com características distintas, como sistemas de saúde diversos e diferentes tipos de fibras de amianto a que as populações foram expostas.(5)
Até o momento, o presente estudo é o maior estudo observacional no Brasil avaliando características clínicas e patológicas do MPM. As características demográficas, como razão homem/mulher e idade, são semelhantes às de um relato baseado no banco de dados da OMS sobre pacientes com MPM.(8) Por outro lado, 45% dos pacientes do nosso estudo eram fumantes, o que é consideravelmente superior à taxa de fumantes no Brasil entre 2008 e 2019, que diminuiu de 18,5% para 12,6% nesse período.(9) A tendência de hábito mais intenso de fumar entre pacientes com MPM foi observada em vários estudos, o que pode ser explicado por uma maior prevalência de tabagismo entre trabalhadores do amianto.(10,11) Além disso, em virtude da alta latência entre a exposição ao amianto e o desenvolvimento de mesotelioma, os pacientes atendidos tendem a ser mais velhos, e essa parcela da população geralmente é mais propensa ao tabagismo.(12)
A correlação entre exposição ambiental prévia e condição patológica é um marco na melhora do processo diagnóstico de doenças ocupacionais.(13) Surpreendentemente, menos da metade dos pacientes do presente estudo tinha conhecimento de exposição prévia ao amianto, segundo seus prontuários, o que contraria as estatísticas mundiais atuais que associam 80% dos casos de MPM à exposição ao amianto.(14) A disparidade certamente pode ser explicada pelo desconhecimento dos pacientes em relação à exposição ambiental ocorrida ao longo de suas vidas. Infelizmente, essa disparidade pode ter consequências para o diagnóstico desses pacientes, já que foi observado um tempo significativamente menor para encaminhamento a um especialista entre os pacientes que estavam cientes de sua exposição prévia do que entre aqueles que não estavam cientes dessa exposição.
Em média, os pacientes esperaram mais de 6 meses após o início dos sintomas para procurar assistência médica. Nesse período, foram submetidos a uma mediana de dois procedimentos antes de serem encaminhados a uma consulta especializada. Uma possível razão para esse atraso foi a utilização de procedimentos sem intenção diagnóstica clara, principalmente a toracocentese, realizados na atenção primária e secundária antes do encaminhamento. Além disso, apesar do atraso já mencionado, mais de 60% dos pacientes foram encaminhados sem resultado/diagnóstico definitivo de biópsia. Embora esse achado possa conter imprecisões relacionadas à inexatidão dos relatos dos pacientes sobre seu histórico médico pregresso, ele pode fornecer informações valiosas para que os formuladores de políticas desenvolvam metas para melhorar o reconhecimento da doença.
Após a primeira consulta especializada (com cirurgião torácico, oncologista ou pneumologista), foi necessário um tempo adicional de espera de quase 2 meses para se chegar ao diagnóstico de MPM. Como dito acima, mais da metade dos indivíduos foi encaminhada sem diagnóstico estabelecido e, portanto, teve-se que realizar biópsia pleural. No entanto, houve um número inesperado de rebiópsias em virtude dos resultados falso-negativos. O MPM tem sido um desafio diagnóstico para os patologistas mesmo com os avanços na imuno-histoquímica ao longo das últimas décadas.(15) Dois estudos críticos prospectivos avaliaram o rendimento diagnóstico de diferentes métodos de biópsia.(16,17) Um estudo prospectivo analisou 188 pacientes com MPM entre 1973 e 1990 e mostrou que o diagnóstico foi confirmado por toracoscopia, citologia de líquido pleural e biópsia com agulha em 98%, 26% e 21% dos indivíduos, respectivamente,(16) e um ensaio clínico randomizado comparou biópsia com agulha de Abram com biópsia guiada por TC e mostrou uma superioridade significativa deste último método em termos de sensibilidade (47% vs. 87%) e valor preditivo negativo (40% vs. 80%).(17) Esses achados corroboram o fato de que a biópsia com agulha de Cope teve a maior taxa de falso-negativos entre os métodos de biópsia pleural utilizados no presente estudo.
A videotoracoscopia é o procedimento com maior sensibilidade para o diagnóstico do MPM em comparação com a biópsia guiada por imagem ou a biópsia com agulha de Cope. Além disso, permite a remoção de uma quantidade suficiente de tecido para a realização de todos os tipos de análises moleculares que são cruciais para a oncologia hoje.(16,17) No presente estudo, embora tenham sido analisados apenas alguns casos de biópsia guiada por imagem, observou-se a mesma superioridade da toracoscopia em termos de resultados falso-negativos quando ela foi comparada à biópsia com agulha de Cope. As diretrizes brasileiras para diagnóstico do MPM recentemente divulgadas afirmam que há vantagens da toracoscopia em relação a outras modalidades. Portanto, a toracoscopia deve ser considerada o principal método para diagnóstico do MPM, pois pode reduzir eventuais atrasos na caracterização histopatológica adequada.(18) Embora o mesotelioma epitelioide tenha sido o subtipo mais frequente em nossa amostra, sua proporção (88%) foi maior do que a relatada em pesquisas anteriores, em que a presença desse subtipo variou de 60-75%.(19) A alta frequência de mesotelioma epitelioide pode ter melhorado a sobrevida global, apesar das adversidades mencionadas acima a respeito do processo diagnóstico, já que a morfologia epitelioide continua sendo um dos fatores prognósticos dominantes, juntamente com o estadiamento TNM.(20,21)
Até onde sabemos, este é o primeiro estudo a descrever o SUV médio (8,6) da PET/TC com 18F-FDG em pacientes com MPM de um país latino-americano. O uso desse parâmetro radiológico como ferramenta para prever vários desfechos e auxiliar na diferenciação entre o MPM e doenças pleurais benignas está atualmente em desenvolvimento.(22) No entanto, em países onde as doenças infecciosas são, na maioria das vezes, os principais diagnósticos diferenciais das doenças pleuropulmonares, o SUV pode ter uma implicação clínica diferente. Assim, os dados de SUV reunidos no presente estudo podem orientar novas pesquisas nessas localidades.
Um conhecido estudo de viabilidade randomizado(23) que comparou tratamento cirúrgico com terapia sistêmica isolada observou uma menor taxa de sobrevida (razão de risco ajustada = 2,75) em pacientes submetidos à terapia trimodal (incluindo EPP) do que em pacientes que receberam apenas terapia sistêmica. Houve muitas críticas a esse estudo, incluindo o uso de um tamanho amostral com baixo poder e baixo grau de cumprimento dos critérios de indicação para cirurgia.(23) Por outro lado, um estudo(24) que incluiu 14.228 pacientes com MPM observou uma melhor taxa de sobrevida (razão de risco ajustada = 0,64) para os pacientes que receberam cirurgia direcionada ao câncer.
Mesmo se considerarmos a incerteza dos benefícios da cirurgia no MPM, as diretrizes atuais recomendam a terapia cirúrgica para aqueles que apresentam doença ressecável e estão aptos à cirurgia.(25) Na amostra do presente estudo, em virtude do estadiamento avançado e do baixo performance status (estado de desempenho), menos de 20% dos pacientes puderam ser submetidos à pleurectomia/decorticação ou pleuropneumonectomia. Consequentemente, além de uma menor sobrevida global em comparação com outros estudos, condições basais ruins também impediram que esses pacientes recebessem as modalidades de tratamento recomendadas, como a cirurgia, que poderiam ser potencialmente benéficas.(26)
A atual estagnação das opções de tratamento oferecidas aos pacientes com MPM pode ser identificada comparando os resultados do presente estudo com os de um estudo realizado no Brasil há 14 anos.(27) Tal estudo retrospectivo, que revisou os prontuários de 17 pacientes tratados para MPM entre 2000 e 2005, encontrou um baixo percentual de pacientes com MPM que puderam ser submetidos a tratamento cirúrgico, e a sobrevida global média foi de 11 meses. O presente estudo, realizado mais de 10 anos depois, encontrou resultados muito semelhantes, corroborando a falta de melhora no manejo da doença.
Espera-se que o mesotelioma no Brasil atinja seu pico de incidência até 2026, mas os sistemas de saúde ainda não estão adequadamente preparados para o manejo do MPM.(28) Vários fatores, incluindo o desconhecimento dos pacientes em relação à exposição prévia ao amianto e a falta de familiaridade dos profissionais de saúde com essa doença, ameaçam a capacidade de oferecer o melhor tratamento disponível para esse tipo de câncer no Brasil.(18) Portanto, é fundamental que sejam feitas melhoras progressivas nas habilidades de reconhecimento do MPM a fim de aumentar a sobrevida desses pacientes, que hoje é muito baixa.
CONTRIBUIÇÕES DOS AUTORES PHPG: desenho do estudo; análise dos dados; revisão do manuscrito. RMT: desenho do estudo; revisão do manuscrito. LPL: coleta dos dados; redação do manuscrito. PMPF: concepção e desenho do estudo; revisão do manuscrito final. Todos os autores aprovaram a versão final do manuscrito.
CONFLITOS DE INTERESSE Nenhum declarado.
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