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ISSN (on-line): 1806-3756

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Cartas ao Editor

Existe algum tipo de relação entre os níveis de alfa-1 antitripsina e os parâmetros de função pulmonar?

Is there any kind of relationship between alpha-1 antitrypsin levels and lung function parameters?

José María Hernández-Pérez1, Claudia Viviana López-Charry1

DOI: 10.36416/1806-3756/e20220432

AO EDITOR,
 
A deficiência de alfa-1 antitripsina (AAT) é uma condição genética que predispõe seus portadores a desenvolver acometimento pulmonar na forma de enfisema e/ou acometimento hepático na forma de cirrose ou fibrose. (1) Os níveis de AAT são solicitados na rotina clínica como ponto de partida dentro do algoritmo diagnóstico da deficiência de AAT, sem fornecer qualquer tipo de informação a não ser do ponto de vista quantitativo para definir apenas a existência dessa deficiência. Até o momento, poucos estudos tentaram relacionar os níveis de AAT com possíveis alterações nos parâmetros de função pulmonar. Portanto, nosso objetivo foi estudar se havia algum tipo de associação entre os níveis de AAT e os parâmetros funcionais medidos por espirometria.
 
Realizamos um estudo prospectivo com 1.510 indivíduos consecutivos que procuraram o ambulatório de pneumologia do nosso hospital por qualquer motivo e foram submetidos a hemograma e espirometria na mesma consulta. Os pacientes foram recrutados durante 54 meses consecutivos (entre janeiro de 2011 e junho de 2015). Os parâmetros espirométricos foram obtidos por meio de um espirômetro (Datospir 600; Sibelmed®, Barcelona, Espanha). A espirometria pré- e pós-broncodilatador foi realizada visando obter pelo menos três manobras aceitáveis e reprodutíveis de acordo com critérios de qualidade padrão.(2) Quatro variáveis foram utilizadas para definir o comprometimento da função pulmonar: CVF < 80% do valor previsto, VEF1 < 80% do valor previsto, relação VEF1/CVF < 70% e/ou FEF25-75% < 60%.
 
Os critérios de inclusão foram assinatura do termo de consentimento livre e esclarecido, capacidade de realizar a espirometria com sucesso (três manobras aceitáveis e reprodutíveis) e realização de espirometria e determinação dos níveis de AAT no sangue por nefelometria na mesma consulta. A amostra final foi composta por 1.334 indivíduos, pois 176 pacientes não atenderam aos critérios de inclusão. O estudo foi aprovado pelo comitê de ética em pesquisa da instituição (Protocolo HGLaPalma_2010_7).
 
Na amostra total, 770 indivíduos eram do sexo masculino (57,7%), a média de idade foi de 56,4 ± 18,5 anos, e a média de peso foi de 81,4 ± 18,6 kg. Quanto ao tabagismo, 263 (19,7%) e 494 (37,0%) dos indivíduos eram fumantes ativos e ex-fumantes, respectivamente. O nível médio de AAT foi de 125,1 ± 31,9 mg/dL, sendo que 362 (27,1%) dos indivíduos apresentaram padrão obstrutivo na espirometria (VEF1/CVF < 70%).
 
A análise estatística da relação entre os níveis de AAT e os parâmetros de função pulmonar mostrou uma associação estatisticamente significativa entre os parâmetros de função pulmonar indicativos de obstrução ao fluxo aéreo e os níveis de AAT < 40 mg/dL (χ2 = 22,61; p < 0,0001; OR = 5,46; IC95%: 1,36-21,96; p < 0,05; Figura 1).


 
Esses resultados parecem mostrar que pacientes com baixos níveis de AAT (0-40 mg/dL) estão associados à alteração dos parâmetros de função pulmonar na forma de obstrução ao fluxo aéreo, e esse intervalo corresponderia aos genótipos mais deficientes (Pi*ZZ e algumas variantes raras), fato que está de acordo com os coletados em estudos anteriores,(3) embora, no estudo de Tanash et al.,(4) a amostra tenha sido composta por crianças com exposição à fumaça do tabaco, fator sabidamente associado à deterioração significativa da função pulmonar. (5) No entanto, considerando níveis de AAT na faixa de 41-65 mg/dL, o padrão obstrutivo estava presente em 17,3% da amostra, o que corresponderia principalmente aos genótipos Pi*SZ e Pi*MZ ou a algumas variantes raras, mostrando a importância do monitoramento desses genótipos, principalmente quando associados ao tabagismo.(6) Outros autores(7) não encontraram relação entre os níveis de AAT e os parâmetros de função pulmonar medidos por espirometria, embora a coorte estudada tenha envolvido pacientes com diagnóstico de DPOC, e não foi realizada genotipagem em busca de alelos de deficiência de AAT; portanto, não é possível descartar a deficiência de AAT em nenhum desses dois estudos.
 
Em conclusão, este estudo mostra que é preciso levar em consideração os níveis de AAT, pois, além de determinarem se o paciente tem ou não deficiência de AAT, eles podem nos orientar quanto à probabilidade de o paciente desenvolver comprometimento da função pulmonar.
 
CONTRIBUIÇÃO DOS AUTORES
 
Os autores contribuíram de forma equânime na realização deste trabalho.
 
CONFLITOS DE INTERESSE
 
Nenhum declarado.
 
REFERÊNCIAS
 
1.            Miravitlles M, Dirksen A, Ferrarotti I, Koblizek V, Lange P, Mahadeva R, et al. European Respiratory Society statement: diagnosis and treatment of pulmonary disease in a1-antitrypsin deficiency. Eur Respir J. 2017;50(5):1700610. https://doi.org/10.1183/13993003.00610-2017
2.            Sociedad Española de Neumología y Cirugía Torácica (SEPAR). Manual SEPAR de Procedimientos, 3. Barcelona: SEPAR; 2002.
3.            Pérez-Rubio G, Jiménez-Valverde LO, Ramírez-Venegas A, Camarena Á, Sansores RH, Flores-Trujillo F, et al. Prevalence of alpha-1 antitrypsin high-risk variants in Mexican mestizo population and their association with lung function values. Arch Bronconeumol. 2015;51(2):80-85. https://doi.org/10.1016/j.arbres.2014.09.010
4.            Tanash HA, Nystedt-Düzakin M, Montero LC, Sveger T, Piitulainen E. The Swedish a1-Antitrypsin Screening Study: Health Status and Lung and Liver Function at Age 34. Ann Am Thorac Soc. 2015;12(6):807-812. https://doi.org/10.1513/AnnalsATS.201410-452OC
5.            Janus ED, Phillips NT, Carrell RW. Smoking, lung function, and alpha 1-antitrypsin deficiency. Lancet. 1985;1(8421):152-154. https://doi.org/10.1016/S0140-6736(85)91916-6
6.            Molloy K, Hersh CP, Morris VB, Carroll TP, O’Connor CA, Lasky-Su JA, et al. Clarification of the risk of chronic obstructive pulmonary disease in a1-antitrypsin deficiency PiMZ heterozygotes. Am J Respir Crit Care Med. 2014;189(4):419-427. https://doi.org/10.1164/rccm.201311-1984OC
7.            Janciauskiene S, DeLuca DS, Barrecheguren M, Welte T, Miravitlles M; Scientific Committee; Participating sites and coordinators. Serum Levels of Alpha1-antitrypsin and Their Relationship With COPD in the General Spanish Population. Arch Bronco-neumol (Engl Ed). 2020;56(2):76-83. https://doi.org/10.1016/j.arbr.2019.03.025

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