ABSTRACT
Objective: To determine the clinical profile of COVID-19 inpatients who were vaccinated prior to hospitalization and to compare the risk factors for death and the 28-day survival rate of between those inpatients vaccinated with one, two, or three doses and unvaccinated COVID-19 inpatients. Methods: This was a retrospective observational cohort study involving COVID-19 patients admitted to a referral hospital in the city of Recife, Brazil, between July of 2020 and June of 2022. Results: The sample comprised 1,921 inpatients, 996 of whom (50.8%) were vaccinated prior to hospitalization. After adjusting the mortality risk for vaccinated patients, those undergoing invasive mechanical ventilation (IMV) had the highest mortality risk (adjusted OR [aOR] = 7.4; 95% CI, 3.8-14.1; p < 0.001), followed by patients > 80 years of age (aOR = 7.3; 95% CI, 3.4-15.4; p < 0.001), and those needing vasopressors (aOR = 5.6; 95% CI, 2.9-10.9; p < 0.001). After adjusting the mortality risk for all patients, having received three vaccine doses (aOR = 0.06; 95% CI, 0.03-0.11; p < 0.001) was the most important protective factor against death. There were progressive benefits of vaccination, reducing the frequency of ICU admissions, use for IMV, and death (respectively, from 44.9%, 39.0% and 39.9% after the first dose to 16.7%, 6.2% and 4.4% after the third dose), as well as significant improvements in survival after each subsequent dose (p < 0.001). Conclusions: Vaccines were effective in reducing illness severity and death in this cohort of COVID-19 inpatients, and the administration of additional doses conferred them with accumulative vaccine protection.
Keywords:
COVID-19; Risk factors; Hospital mortality; Vaccination.
RESUMO
Objetivo: Traçar o perfil clínico de pacientes internados com COVID-19 que haviam sido vacinados antes da hospitalização e comparar os fatores de risco para óbito e a taxa de sobrevida em 28 dias entre esses internados vacinados com uma, duas ou três doses e pacientes internados com COVID-19 não vacinados. Métodos: Estudo de coorte observacional retrospectivo envolvendo pacientes com COVID-19 internados em um hospital de referência na cidade do Recife (PE) entre julho de 2020 e junho de 2022. Resultados: A amostra foi composta por 1.921 pacientes internados, dos quais 996 (50,8%) haviam sido vacinados antes da hospitalização. Após ajuste do risco de mortalidade para os pacientes vacinados, aqueles submetidos à ventilação mecânica invasiva (VMI) apresentaram o maior risco de mortalidade (OR ajustada [ORa] = 7,4; IC95%: 3,8-14,1; p < 0,001), seguidos pelos pacientes > 80 anos (ORa = 7,3; IC95%: 3,4-15,4; p < 0,001) e aqueles que necessitam de vasopressores (ORa = 5,6; IC95%: 2,9-10,9; p < 0,001). Após ajuste do risco de mortalidade para todos os pacientes, o recebimento de três doses de vacina (ORa = 0,06; IC95%: 0,03-0,11; p < 0,001) foi o fator de proteção mais importante contra o óbito. Houve benefícios progressivos da vacinação, com redução da frequência de internações em UTI, de uso de VMI e de óbitos (de 44,9%, 39,0% e 39,9% após a primeira dose para 16,7%, 6,2% e 4,4% após a terceira dose, respectivamente), bem como melhora significativa na sobrevida após cada dose subsequente (p < 0,001). Conclusões: As vacinas foram efetivas na redução da gravidade da doença e dos óbitos nesta coorte de pacientes internados com COVID-19, e a aplicação de doses adicionais conferiu-lhes proteção vacinal cumulativa.
Palavras-chave:
COVID-19; Fatores de risco; Mortalidade hospitalar; Vacinação.
INTRODUÇÃO Globalmente, até 30 de novembro de 2022, houve mais de 640 milhões de casos confirmados de COVID-19 e 6,6 milhões de óbitos; além disso, foi aplicado um total de 13 bilhões de doses de vacina, de acordo com a OMS.(1) No Brasil, no mesmo período, houve mais de 35 milhões de casos e aproximadamente 690.000 óbitos por COVID-19, e foram aplicadas quase 493 milhões de doses de vacina.(1) Além disso, os pacientes hospitalizados com COVID-19 foram os mais caros para o sistema de saúde e apresentaram alta taxa de mortalidade, especialmente aqueles internados em unidades de cuidados críticos.(2-4)
Os programas de vacinação reduziram as taxas de hospitalização, internação em UTI e mortalidade por COVID-19.(5,6) Um importante estudo observacional de base populacional em Israel mostrou que o programa de vacinação contra a COVID-19 reduziu significativamente o número de casos assintomáticos e sintomáticos de infecção por SARS-CoV-2, hospitalizações, casos de doença grave e óbitos, mesmo em adultos mais velhos.(5) Um estudo de fase 3 internacional, randomizado, duplo-cego e controlado por placebo mostrou que a eficácia de uma vacina de dose única para casos graves/críticos de COVID-19 com início pelo menos 14 dias e pelo menos ≥ 28 dias após a aplicação foi, respectivamente, de 76,7% e 85,4%, com números decrescentes de hospitalizações e óbitos.(7) Outro estudo mostrou que pacientes internados com COVID-19 totalmente vacinados apresentaram taxa de mortalidade inferior a 50%, e que a necessidade de ventilação mecânica invasiva (VMI) foi menos frequente nesses pacientes do que em pacientes não vacinados. No entanto, esses estudos não avaliaram os benefícios individuais da aplicação de múltiplas doses de vacinas, mesmo quando os pacientes foram hospitalizados por COVID-19.
No Brasil, o programa de vacinação contra a COVID-19 teve início em 17 de janeiro de 2021, priorizando profissionais de saúde, a população idosa e pacientes com comorbidades crônicas. Novos surtos de COVID-19 ainda podem acontecer no futuro,(8) e é imperativo identificar os fatores de risco para óbito em pacientes vacinados hospitalizados por COVID-19 para que políticas de saúde pública adequadas possam ser implementadas. Assim, o objetivo deste estudo foi traçar o perfil clínico de pacientes internados com COVID-19 que haviam sido vacinados antes da hospitalização e comparar os fatores de risco para óbito e a sobrevida em 28 dias entre esses internados vacinados com uma, duas ou três doses e pacientes internados com COVID-19 não vacinados.
MÉTODOS Desenho do estudo Neste estudo de coorte observacional retrospectivo, foram analisados dados de prontuários de pacientes internados em um hospital de referência com 100 leitos de UTI e 200 leitos de enfermaria para o diagnóstico e tratamento de casos suspeitos ou confirmados de COVID-19 na cidade do Recife (PE) entre 1º de julho de 2020 e 30 de junho de 2022. Os pacientes foram incluídos na coorte se tivessem 18 anos ou mais, tivessem COVID-19 confirmada por teste de RT-PCR para SARS-CoV-2 e fossem internados no hospital. Os pacientes foram agrupados em vacinados (aqueles que haviam sido vacinados contra a COVID-19 antes da hospitalização) e não vacinados (aqueles que não haviam recebido nenhuma dose de vacina contra a COVID-19 antes da hospitalização).
Os pacientes foram excluídos do estudo se tivessem sido vacinados após a hospitalização ou se os dados de vacinação não pudessem ser identificados. Os pacientes foram acompanhados até a alta hospitalar ou óbito. O Comitê de Ética em Pesquisa do Instituto de Medicina Integral Prof. Fernando Figueira analisou e aprovou esta pesquisa (CAAE n. 35243120.7.0000.5205). As recomendações das diretrizes Strengthening the Reporting of Observational Studies in Epidemiology foram utilizadas como referência.(9)
O desfecho primário foi a mortalidade hospitalar. Os desfechos secundários foram a frequência de internações em UTI e a necessidade de VMI. Foram avaliadas as seguintes variáveis demográficas, epidemiológicas e clínicas: idade (anos); faixa etária (< 50, 50-59, 60-69, 70-79 e > 80 anos); sexo (masculino ou feminino); etnia (branca ou outras); estado civil (solteiro [divorciado, solteiro, viúvo] ou casado [casado, vivendo com companheiro]); área de residência (Recife, região metropolitana do Recife ou outras); sintomas (febre, tosse, dispneia, diarreia e vômito; cada sintoma foi dicotomizado em sim ou não); sinais vitais (SpO2, FR e FC); comorbidades (hipertensão arterial sistêmica, diabetes mellitus, obesidade, doença cardíaca crônica, doença pulmonar crônica, doença renal crônica, doença hematológica crônica, doença neurológica crônica, doença hepática crônica, câncer e imunodeficiência; cada comorbidade foi dicotomizada em sim ou não); variante do vírus (Gama, Delta e Ômicron; inferência baseada na circulação viral no período de estudo no Brasil); internação em UTI (dicotomizada em sim ou não); padrão de TC de tórax (típico ou atípico para a doença); suporte respiratório (VMI, ventilação mecânica não invasiva, oxigenoterapia e/ou nenhum); uso de vasopressores (dicotomizado em sim ou não); terapia renal substitutiva (dicotomizada em sim ou não); tempo de VMI (dias); tempo de internação hospitalar (dias); tempo de internação em UTI (dias); e taxa de mortalidade hospitalar.
Análise estatística Os dados foram analisados por meio do programa IBM SPSS Statistics, versão 19 (IBM Corporation, Armonk, NY, EUA). As análises foram realizadas apenas com os dados válidos. A análise descritiva da população estudada foi realizada por meio de medidas de média e desvio padrão para as variáveis contínuas e de distribuições de frequência absoluta e relativa para as variáveis categóricas. Para comparar as variáveis contínuas e categóricas, respectivamente, foram utilizados o teste t e o teste do qui-quadrado. Utilizamos análises de regressão logística para explorar associações entre as variáveis, com ênfase na situação vacinal de cada paciente e no risco de óbito. As variáveis que apresentaram associação com os desfechos nas análises univariadas (p < 0,15) foram testadas sequencialmente em um modelo multivariado, começando pela variável que mais se associou ao risco de óbito e continuando até que nenhuma outra variável alcançasse significância. As variáveis com valor de p < 0,05 foram consideradas estatisticamente significativas no modelo multivariado. Utilizamos o método de Kaplan-Meier para avaliar a sobrevida em 28 dias nos pacientes internados vacinados com uma, duas ou três doses de vacina e nos pacientes internados não vacinados, utilizando o teste de log-rank para avaliar as diferenças entre as curvas. As diferenças foram consideradas significativas quando p < 0,05.
RESULTADOS Durante o período deste estudo, 3.930 pacientes hospitalizados foram selecionados entre aqueles que tiveram COVID-19 confirmada por teste de RT-PCR para SARS-CoV-2. Desses pacientes, 1.044 foram excluídos por não ser possível identificar dados de vacinação, e 996, por terem sido vacinados após a hospitalização. Portanto, 1.921 pacientes foram incluídos neste estudo: 996 vacinados (50,8%) e 925 não vacinados (49,2%). A maioria dos pacientes era idosa (média de idade = 62,2 ± 15,9 anos), do sexo masculino (53,9%), morava sozinha ou sem companheiro (80,3%), era não branca (71,2%) e residia na região metropolitana do Recife (41,7%). Os pacientes vacinados eram mais velhos do que os não vacinados: 66,5 ± 15,5 anos vs. 57,6 ± 15,1 anos (p < 0,001). Não houve diferenças significativas quanto ao sexo, etnia, estado civil e área de residência entre os pacientes vacinados e os não vacinados (Tabela 1).
Com relação aos sintomas relacionados à COVID-19, os mais frequentes foram dispneia (em 73,1%), tosse (em 55,6%) e febre (em 42,7%). Os pacientes com COVID-19 não vacinados apresentaram maior frequência da maioria dos sintomas (p < 0,001). A maioria dos pacientes apresentava hipertensão (53,5%) e diabetes (31,8%). Com exceção da obesidade e da doença pulmonar crônica, comorbidades foram mais relatadas nos pacientes vacinados do que nos não vacinados (p < 0,001). Em nossa amostra, dos 989 pacientes submetidos à TC de tórax, 756 (76,4%) apresentaram padrão típico de COVID-19. Além disso, dos 1.921 pacientes, 1.022 (53,2%) foram internados em UTI, 867 (45,1%) necessitaram de VMI, 763 (39,7%) utilizaram vasopressores, e 125 (6,5%) receberam hemodiálise. A mortalidade hospitalar global foi de 48,7%, sendo maior entre os pacientes não vacinados (60,8% vs. 37,4%; p < 0,001). Os pacientes com COVID-19 não vacinados, em comparação com os vacinados, apresentaram maior frequência de padrão típico de COVID-19 na TC de tórax (84,1% vs. 70,6%; p < 0,001), maior frequência de internação em UTI (60,9% vs. 46,1 %; p < 0,001) e maior frequência de necessidade de VMI (57,2% vs. 33,9%; p < 0,001) e vasopressores (50,1% vs. 30,1%; p < 0,001; Tabela 2).
Em geral, os não sobreviventes da COVID-19, quando comparados aos sobreviventes, eram mais velhos, tinham mais comorbidades, necessitaram de mais internações em UTI, apresentaram doença mais grave e apresentaram maior frequência de uso de VMI, vasopressores e hemodiálise, tanto no grupo vacinado quanto no grupo não vacinado (Tabela 3). Os sobreviventes da COVID-19 vacinados, quando comparados aos não sobreviventes vacinados, eram mais jovens (64,0 ± 16,3 anos vs. 70,6 ± 13,2 anos; p < 0,001) e apresentaram menor frequência de dispneia (66,3% vs. 75,3%; p = 0,003), maior média de SpO2 na admissão hospitalar (96 ± 3% vs. 94 ± 6%; p < 0,001), menor frequência de internação em UTI (29,7% vs. 73,5%; p < 0,001) e menor frequência de necessidade de VMI (8% vs. 77%; p < 0,001), vasopressores (5,8% vs. 70,8%; p < 0,001) ou hemodiálise (4,2% vs. 12,1%; p < 0,001; Tabela 3).
A frequência de óbitos, de uso de VMI e de internações em UTI foi, respectivamente, de 60,8%, 57,2% e 60,9% para os pacientes não vacinados (p < 0,001); de 39,9%, 39,0% e 44,9% para os pacientes vacinados com uma dose (p < 0,001); de 25,5%, 25,2% e 34,8% para os pacientes vacinados com duas doses (p < 0,001); e de 4,4%, 6,2% e 16,7% para os pacientes vacinados com três doses (Figura 1A). Quanto às variantes da COVID-19, os pacientes infectados pela variante Gama apresentaram maior frequência de óbitos, de uso de VMI e de internações em UTI (Figura 1B).
A frequência de óbitos, de uso de VMI e de internações em UTI foi, respectivamente, de 38,4%, 33,0% e 46,0% para aqueles cuja primeira dose foi da vacina AstraZeneca, e de 37,4%, 35,1% e 46,7% para aqueles cuja primeira dose foi da vacina CoronaVac (p > 0,05). A frequência de óbitos, de uso de VMI e de internações em UTI foi, respectivamente, de 23,4%, 20,7% e 38,3% (p < 0,001) para aqueles cuja segunda dose foi da vacina AstraZeneca, e de 31,4%, 31,4% e 45,9 % para aqueles cuja segunda dose foi da vacina CoronaVac (p < 0,001; Figura 1C). As vacinas CoronaVac, AstraZeneca e Pfizer foram aplicadas como primeira dose, respectivamente, em 45,7%, 45,0% e 6,6% dos pacientes; enquanto foram aplicadas como segunda dose, respectivamente, em 51,0%, 39,5% e 8,8%; e, como terceira dose, em 1,3%, 6,6% e 86,1% (Figura 1D).
Na análise do risco ajustado de mortalidade (medido por meio da odds ratio ajustada [ORa]) para todos os pacientes, aqueles submetidos à VMI apresentaram o maior risco de óbito (ORa = 14,6; IC95%: 8,1-26,2; p < 0,001), seguidos pelos pacientes > 80 anos de idade (ORa = 7,0; IC95%: 3,5-13,9; p < 0,001), pelos internados em UTI (ORa = 4,6; IC95%: 2,7-7,8; p < 0,001), pelos que necessitam de vasopressores (ORa = 2,8; IC95%, 1,6-5,1; p < 0,001) e pelos pacientes na faixa etária de 70-79 anos (ORa = 4,6; IC95%: 2,2-9,6; p < 0,001). O recebimento de três doses de vacina foi o melhor fator de proteção contra o óbito (ORa = 0,076; IC95%: 0,04-0,146; p < 0,001; Figura 2A).
Na análise do risco ajustado de mortalidade para os pacientes vacinados (Figura 2B), aqueles submetidos à VMI apresentaram o maior risco de óbito (ORa = 7,4; IC95%: 3,8-14,1; p < 0,001), seguidos pelos pacientes > 80 anos de idade (ORa = 7,3; IC95%: 3,4-15,4; p < 0,001), pelos que necessitaram de vasopressores (ORa = 5,6; IC95%: 2,9-10,9; p < 0,001), pelos pacientes na faixa etária de 70-79 anos (ORa = 4,6; IC95%: 2,2–9,6; p < 0,001), pelos internados em UTI (ORa = 3,7; IC95%: 2,2-6,1; p < 0,001), pelos que necessitaram de hemodiálise (ORa = 3,0; IC95%: 1,4-6,7; p < 0,001) e pelos na faixa etária de 60-69 anos (ORa = 3,1; IC95%: 1,5-6,4; p < 0,001). A presença de febre na admissão hospitalar (ORa = 0,63; IC95%: 0,42-0,96; p < 0,001) foi um fator de proteção contra o óbito.
Na análise do risco ajustado de mortalidade para os pacientes não vacinados (Figura 2C), aqueles submetidos à VMI apresentaram o maior risco (ORa = 11,2; IC95%: 6,3-20,2; p < 0,001), seguidos pelos que necessitaram de vasopressores (ORa = 2,9; IC95%: 1,6-5,4; p < 0,001) e pelos internados em UTI (ORa = 4,3; IC95%: 2,5-7,4; p < 0,001).
De acordo com as curvas de Kaplan-Meier (Figura 3A), as taxas de sobrevida em 28 dias foram de 38,2% e 62,9%, respectivamente, nos pacientes não vacinados e nos pacientes vacinados com uma dose (p < 0,001). As taxas de sobrevida em 28 dias foram, respectivamente, de 74,6% e 91,8% nos pacientes vacinados com duas e três doses (p < 0,001 para ambos; Figuras 3B e 3C).
DISCUSSÃO Neste estudo, os dados dos pacientes com COVID-19 hospitalizados após o início do programa de vacinação no Brasil mostraram maior proteção contra internação em UTI, uso de VMI e óbito a cada dose adicional de vacina, mesmo para os mais velhos e com mais comorbidades do que os pacientes não vacinados. Além disso, este estudo também demonstrou o perfil clínico dos não sobreviventes vacinados (pacientes mais velhos e com doença mais grave que frequentemente foram internados em UTI e fizeram mais uso de VMI, vasopressores e hemodiálise do que os sobreviventes vacinados).
Idade mais avançada, comorbidades e órgãos disfuncionais são os fatores de risco para óbito mais prevalentes entre pacientes hospitalizados com COVID-19.(2-4,11,12) As vacinas contra o SARS-CoV-2 foram efetivas na redução do número de novos casos de COVID-19, hospitalizações, internações em UTI e óbitos.(5,6,13) Nosso estudo mostrou que, após a análise de regressão multivariada, os fatores de risco para óbito, mesmo nos pacientes vacinados, foram doença crítica e necessidade de VMI, vasopressores ou hemodiálise, embora a obesidade e febre na admissão tenham sido fatores de proteção contra o óbito. No entanto, a frequência de internações em UTI, a necessidade de VMI e o número de óbitos foram significativamente maiores nos pacientes não vacinados do que nos vacinados. Assim, podemos inferir que o programa de vacinação contra a COVID-19 foi a medida mais importante para salvar vidas, controlar a transmissão do SARS-CoV-2 e reduzir os custos da assistência à saúde, independentemente da idade, das comorbidades e da gravidade da doença.
As vacinas contra a COVID-19 foram efetivas até mesmo na proteção de pacientes hospitalizados. (14) Entre esses pacientes, a vacinação foi efetiva na redução da mortalidade hospitalar,(14) do risco de desenvolver doença grave/crítica,(15) das hospitalizações de emergência,(16) e do tempo de internação,(17) mesmo em pacientes em VMI(14) e com diferentes variantes da COVID-19,(16) quando comparados a pacientes internados com COVID-19 não vacinados. Além disso, os benefícios cumulativos de um maior número de doses de vacina(18) e imunidade adquirida por infecção prévia(19) demonstraram proteção contra casos graves,(20) necessidade de VMI(21) ou óbito,(21,22) mesmo em pacientes mais velhos.(6) Nosso estudo também confirmou os benefícios progressivos das vacinas, pois foi constatada melhora na sobrevida global com o aumento do número de doses aplicadas, tendo como efeito a redução da frequência de internações em UTI, de uso de VMI e de óbitos (de 44,9%, 39,0% e 39,9% após a primeira dose para 16,7%, 6,2% e 4,4% após a terceira dose, respectivamente). Seria de se esperar que o programa de vacinação contra o SARS-CoV-2 fosse ampliado para a inclusão de crianças e adolescentes e que as doses de vacina fossem aplicadas duas vezes ao ano para controlar possíveis surtos recorrentes com novas variantes no futuro, uma vez que a proteção vacinal diminuiu consideravelmente após seis meses.(19)
Ainda há muitas pessoas sem acesso às vacinas(23,24) ou que estão evitando tomar as vacinas em todo o mundo. (1,24) Ter um grande número de pacientes com COVID-19 não vacinados leva não apenas a um maior risco de óbito, mas também a um maior risco de surgimento de novas variantes do SARS-CoV-2 e, consequentemente, novos surtos no futuro. (8) Infelizmente, os países de baixa renda ainda enfrentam desafios para vacinar completamente suas populações. (25,26) Mesmo no Brasil, no final de novembro de 2022, 12-13% da população nunca havia recebido nenhuma dose de vacina, e quase 20% apresentavam esquema vacinal incompleto.(1) No entanto, embora efeitos colaterais sistêmicos e locais de todas as vacinas contra a COVID-19 tenham sido relatados em quase um terço dos pacientes vacinados, os sintomas foram autolimitados e de curta duração,(27) e, portanto, não justificam evitar ou demorar para tomar doses adicionais de vacina anualmente.
Este estudo apresenta algumas limitações. Em primeiro lugar, teve desenho observacional retrospectivo com dados obtidos de um único centro, e os autores não tiveram acesso total aos dados sobre vacinação e histórico de infecção anterior por COVID-19 para todos os pacientes internados com COVID-19 do estudo; portanto, pode haver fatores de confusão. No entanto, o Hospital Alfa foi criado para prestar assistência médica especializada em casos de COVID-19 e adquiriu alto nível de especialização ao tratar quase 7.000 pacientes com suspeita ou confirmação de COVID-19. Em segundo lugar, os resultados dos testes de RT-PCR que confirmaram os casos de COVID-19 não puderam ser revisados, o que criou em certo viés em relação aos pacientes incluídos, embora todos os pacientes internados no Hospital Alfa tenham sido submetidos ao mesmo protocolo de diagnóstico da COVID-19. Em terceiro lugar, os autores não tiveram acesso total às informações sobre os efeitos adversos das vacinas, especialmente após doses múltiplas. Por fim, não foi realizado o sequenciamento do vírus, impossibilitando a definição de qual variante ocasionou a hospitalização. No entanto, nossa análise pode ser muito importante para melhorar o conhecimento sobre as vacinas em diferentes condições clínicas (ou seja, frequência e risco de óbito), especialmente nos pacientes internados com COVID-19, pois eles foram avaliados durante um longo período de tempo e apresentaram diferentes níveis de gravidade.
Este importante estudo brasileiro avaliou o perfil clínico, a gravidade da doença e os fatores de risco para óbito em pacientes internados com COVID-19 vacinados e não vacinados e determinou a sobrevida global dos pacientes vacinados que receberam uma, duas ou três doses de vacina. Essas informações podem fornecer subsídios importantes para uma melhor tomada de decisões por parte dos governos, instituições e/ou profissionais de saúde, a fim de estimular os pacientes a seguir o programa de vacinação, independentemente da idade, sexo e desempenho clínico.
Em suma, este estudo brasileiro mostrou que as vacinas contra o SARS-CoV-2 foram efetivas na redução da gravidade da doença e dos óbitos mesmo em pacientes internados com COVID-19, os quais geralmente apresentam doença mais grave, causando mais gastos para o sistema de saúde, e apresentam maiores taxas de mortalidade. Além disso, o uso de múltiplas doses de vacina conferiu proteção vacinal cumulativa a esses pacientes.
AGRADECIMENTOS Gostaríamos de agradecer a todos os pacientes e familiares que participaram deste estudo, bem como àqueles que acreditaram no programa brasileiro de vacinação contra a COVID-19. Somos também gratos pelo apoio da Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS) e da Secretaria Estadual de Saúde de Pernambuco.
CONTRIBUIÇÕES DOS AUTORES GJC, JRSJ, CCAS, TPFL, JICJ e MJTS: desenho, concepção e planejamento do estudo; interpretação das evidências; redação e revisão do manuscrito. CCAS, TPFL, MMC, MHOS e GCSC: concepção e planejamento do estudo; coleta de dados; interpretação das evidências; aquisição de dados. GJC, JRSJ, CCAS, TPFL, MMC, MHOS, GCSC, JICJ e MJTS: aprovação da versão final do manuscrito.
CONFLITOS DE INTERESSE Nenhum declarado.
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