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ISSN (on-line): 1806-3756

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Editorial

Eosinófilos e respostas terapêuticas a esteroides e agentes biológicos na DPOC: uma relação complexa

Eosinophils and therapeutic responses to steroids and biologics in COPD: a complex relationship

Parameswaran Nair1

DOI: https://dx.doi.org/10.36416/1806-3756/e20230360

 
O tratamento do componente inflamatório da DPOC sofreu mudanças significativas nas últimas duas décadas. Os corticosteroides inalatórios eram comumente utilizados, assim como na asma, até que seu uso foi desaconselhado por grandes ensaios clínicos, como o European Respiratory Society Study on Chronic Obstructive Pulmonary Disease(1) e o Copenhagen Lung Health Study,(2) que demonstraram modesta a nenhuma melhora de curta duração na função pulmonar, com efeito mínimo no declínio de longa duração associado ao tabagismo contínuo. O ensaio denominado ISOLDE(3) sugeriu que os benefícios são limitados a pacientes com obstrução grave do fluxo aéreo e exacerbações frequentes. O uso de esteroides inalatórios recebeu apoio adicional de estudos retrospectivos e de caso-controle que sugeriram que eles reduziram a mortalidade por DPOC.(4) Observações seminais de Suissa et al.(5) identificaram “um viés de tempo imortal” nesses estudos observacionais que reduziria os benefícios atribuídos ao uso de corticosteroides inalatórios. Com o crescente reconhecimento de efeitos adversos, particularmente pneumonias com o uso de corticosteroides inalatórios,(6) diretrizes internacionais, muito corretamente, não recomendam o uso regular de altas doses de esteroides inalatórios na maioria dos pacientes com DPOC.(7)
 
É, portanto, clinicamente importante ser capaz de identificar biomarcadores ou preditores de resposta aos glicocorticosteroides em pacientes com DPOC, para que sejam utilizados criteriosamente. Aproximadamente 25-30% dos pacientes com DPOC apresentam aumento do número de eosinófilos circulantes,(8) e 8-10% podem apresentar um número persistentemente elevado de eosinófilos no escarro.(9) Embora as correlações entre o número de eosinófilos no sangue e no escarro(10) ou tecidos(11) sejam fracas, ambos são preditores de exacerbações(12) e de resposta aos corticosteroides (orais e inalatórios).(13-15) Estudos clínicos iniciais(13) demonstraram que a melhora do VEF1 e dos sintomas com o uso de prednisona naqueles com contagem de eosinófilos no escarro acima de 3% é mais significativa do que a demonstrada com qualquer broncodilatador atualmente aprovado para DPOC. Estudos mais recentes demonstraram não só que a contagem de eosinófilos (> 2%) na circulação é um preditor de resposta aos corticosteroides,(16,17) mas também que o uso de corticosteroides naqueles com menor contagem de eosinófilos tem potencial para causar prejuízos.(16)
 
No entanto, diferentemente de na asma, os eosinófilos podem não estar contribuindo para as exacerbações, visto que os resultados de ensaios clínicos sobre anticorpos monoclonais anti-IL-5 em pacientes com DPOC e aumento do número de eosinófilos circulantes (> 150 ou 300 células/µL) foram decepcionantes. Ensaios clínicos utilizando o mepolizumabe demonstraram uma redução modesta e não estatisticamente significativa das exacerbações,(18) enquanto ensaios maiores utilizando o benralizumabe não atingiram o desfecho primário de redução das exacerbações.(19) No ensaio clínico METREX (ClinicalTrials.gov, número NCT02105948; n = 230 no braço eosinofílico e n = 604 nos braços não eosinofílico + placebo), o mepolizumabe na dose de 100 mg s.c. foi associado a uma redução de 18% nas exacerbações (p = 0,04). No entanto, no ensaio replicado METREO (ClinicalTrials.gov, número NCT02105961), a mesma dose de mepolizumabe (n = 223 no braço eosinofílico e n = 226 nos braços não eosinofílico + placebo) foi associada a uma redução não estatisticamente significativa de 20% na frequência de exacerbações (p = 0,07). Paradoxalmente, a redução de 14% nas exacerbações observada com a dose mais alta de mepolizumabe de 300 mg s.c. não foi estatisticamente significativa (p = 0,14). Em ensaios clínicos muito maiores com o benralizumabe — GALATHEA e TERRANOVA (ClinicalTrials.gov, números NCT02138916 e NCT02155660, respectivamente) – nem a dose mais baixa de 30 mg s.c. nem a dose mais alta de 100 mg s.c. foram associadas a reduções estatisticamente significativas das exacerbações, embora números mais altos de eosinófilos no sangue tenham sido associados à maior redução na frequência de exacerbações. Embora esses grandes ensaios clínicos de agentes antieosinofílicos não tenham conseguido demonstrar benefício clínico significativo, um estudo canadense relativamente pequeno, no qual 147 pacientes que receberam alta do PS foram aleatoriamente designados para receber doses diárias de 40 mg de prednisona ou placebo, demonstrou redução significativa das recidivas, bem como melhora do VEF1 e dos sintomas.(20) De fato, já havíamos demonstrado, em 20 pacientes com DPOC grave e enfisema confirmado por TC, uma melhora > 300 mL no VEF1 com o uso de prednisona por um curto período de cinco dias, mas nenhuma melhora no VEF1 após seis meses de tratamento com mepolizumabe na dose de 750 mg i.v. por mês.(21)
 
Apesar das observações de que pequenos estudos com 20-150 pacientes demonstraram benefício do uso de esteroides naqueles com aumento de eosinófilos no sangue ou no escarro, grandes estudos com 600-4.000 pacientes não conseguiram demonstrar benefícios de poderosos agentes biológicos antieosinofílicos, sugerindo que os esteroides podem estar agindo em algumas outras células ou vias que são suprarreguladas junto a eosinófilos. Os eosinófilos podem não estar contribuindo diretamente para as exacerbações, mas funcionam como um biomarcador para outro processo que está sendo alvo dos esteroides. Atualmente não temos certeza de quais podem ser esses processos celulares ou outros processos imunológicos. Estudos de retirada de esteroides, como o realizado pelo grupo de estudo GLUCOLD,(22) nos fornecem algumas evidências de que pode haver um aumento de células CD8+ ou de mastócitos com a redução da dose de esteroides e que as células CD8+ ou os mastócitos estão associados à piora dos sintomas. De fato, há evidências de associação dos mastócitos com os septos alveolares em pacientes com enfisema centrolobular e parasseptal.(23) Os mastócitos, os eosinófilos(24) e os basófilos(25) podem ser ativados pela IL-33 para secretar IL-13 que pode estimular a secreção de muco ou estimular diretamente os macrófagos a liberar metaloproteinase de matriz-12. A recente demonstração de que, diferentemente dos agentes biológicos anti-IL-5, o agente biológico anti-IL-4R (dupilumabe) pode reduzir em um terço as exacerbações em pacientes com DPOC,(26) eosinofilia e história de bronquite sugere que essa estratégia pode ser efetiva naqueles pacientes com aumento da atividade da IL-13 nas vias aéreas(24) e consequente secreção de muco contribuindo para sintomas e exacerbações.
 
Outras estratégias, como direcionar a sinalização de IL-33,(27,28) sugeriram melhoras modestas em ex-fumantes e naqueles com baixa contagem de eosinófilos no sangue. Também há especulações de que os benefícios do bloqueio da IL-33 possam ser influenciados por uma complexa rede de interação entre o microbioma e a inflamação das vias aéreas.(29) A eosinofilia observada no sangue (ou mesmo no escarro) pode nem sempre ser um processo patológico, mas pode também ser um reflexo da disbiose microbiana das vias aéreas(30) que pode também ser modulada por corticosteroides inalatórios ou orais. A associação entre eosinofilia das vias aéreas na DPOC e infecções mistas virais e bacterianas foi demonstrada há quase duas décadas,(31) e isso pode não ser criticamente dependente da IL-5.(32)
 
Em suma, a ativação das alarminas epiteliais por múltiplos estímulos, incluindo fumaça de cigarro, poluentes e certos micróbios, pode recrutar eosinófilos para as vias aéreas em pacientes com DPOC. Embora o aumento de eosinófilos no sangue e a DPOC sejam preditores de exacerbações e de resposta aos corticosteróides, esses efeitos podem não ser diretamente modulados pelos eosinófilos. Portanto, as terapias antieosinofílicas podem não ter muito efeito clínico, a menos que os pacientes tenham asma concomitante. No entanto, ter como alvo a via da IL-13, particularmente naqueles com eosinofilia, pode levar a benefícios clínicos, possivelmente reduzindo a secreção de muco nas vias aéreas. Isso precisa ser comprovado. Além disso, ter como alvo essa via ou a via da IL-33 pode diminuir a taxa de declínio do VEF1 (ou aumentar o espaço aéreo), reduzindo a atividade da metaloproteinase nas vias aéreas. Os efeitos benéficos podem ser modulados pela disbiose microbiana das vias aéreas. É, de fato, uma complexa interação de processos patológicos.
 
CONFLITOS DE INTERESSE
 
O autor recebeu honorários por conselhos consultivos científicos e palestras da AstraZeneca, Sanofi Regeneron, GSK, Roche, Genentech e Arrowhead, e sua universidade recebeu bolsas da AstraZeneca, Sanofi Regeneron, Teva, Roche, Metapharm e Cyclomedica.
 
REFERÊNCIAS
 
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