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Editorial

A doença pulmonar intersticial na esclerose sistêmica é lentamente progressiva?

Is systemic sclerosis interstitial lung disease slowly progressive?

Chitra Lal, Charlie Strange

Na maioria dos pacientes, a esclerose sistêmica (ES), também conhecida como esclerodermia, é uma doença lentamente progressiva. Contudo, em um subgrupo de pacientes, há um rápido declínio da função pulmonar e da qualidade de vida. Tais pacientes muitas vezes não entram em ensaios clínicos em razão da imposição de tentar uma determinada forma de terapia, mesmo que as opções terapêuticas sejam limitadas. Neste número do Jornal Brasileiro de Pneumologia, Lopes et al.(1) apresentam argumentos convincentes de que o declínio acelerado da função pulmonar é a regra e não a exceção em pacientes com doença pulmonar intersticial (DPI) associada a ES.

Por que esses pacientes com ES no Brasil apresentam um declínio tão rápido da função pulmonar? A primeira observação a ser feita é que, para inclusão no estudo de Lopes et al., foi necessária TC anormal. Com base em nossa experiência nos Estados Unidos e em resultados de um estudo realizado no Royal Brompton Hospital em Londres,(2) sabemos que a fibrose observada na TC de tórax é um forte preditor de progressão da doença pulmonar e de morte. O sistema de estadiamento de Brompton tem um valor prognóstico consistente independentemente de os pacientes estarem iniciando ou continuando o tratamento. Outra diferença é que Lopes et al. excluíram fumantes. Em fibrose pulmonar idiopática (FPI), o consenso é que o viés de tempo ganho (lead-time bias) imposto pela carga adicionada do tabagismo retarda a progressão da FPI.(3) Contudo, o impacto do tabagismo na pneumonite intersticial não-específica (PINE), a patologia mais comum em pacientes com ES, nunca ficou muito claro. Este estudo pode nos forçar a reexaminar os efeitos do tabagismo na apresentação e na progressão da DPI associada a ES. Por fim, não podemos minimizar o papel da farmacoterapia nas diferenças observadas. Dois estudos, um realizado nos Estados Unidos e outro, no Reino Unido, obtiveram resultados quase idênticos com o uso da ciclofosfamida, administrada pelas vias oral e intravenosa, respectivamente.(4,5) Embora a magnitude das alterações da função pulmonar tenha sido pequena em favor da utilização da ciclofosfamida, essa droga é frequentemente utilizada em outras partes do mundo quando a função pulmonar está em declínio. Quando a ciclofosfamida é utilizada em quadros de declínio agudo da função pulmonar, os benefícios podem ser muito mais robustos.(6)

Outro aspecto interessante do estudo de Lopes et al. é o valor prognóstico do faveolamento. O faveolamento é mais comumente visto na pneumonite intersticial usual (PIU) que pode ser encontrada na ES difusa.(7) Em razão de não termos a patologia para melhor embasar essa observação no estudo de Lopes et al., é possível que a maior prevalência de PIU na população com ES avaliada tenha sido responsável pelo fato de que o declínio da CVF foi mais rápido do que o observado em outros estudos. Não é de se estranhar que os pacientes com fibrose mais grave, possivelmente com PIU na TCAR basal, tenham apresentado os maiores declínios da CVF durante o período de tratamento de cinco anos.

Os resultados do estudo de Lopes et al. reforçam a idéia de que a extensão da doença na TC de tórax pode indicar a taxa de declínio fisiológico e funcional em DPI associada a ES. A força desse estudo longitudinal de cinco anos da história natural da ES exige que nós agora façamos um esforço para encontrar uma cura. Utilizando o faveolamento como um "biomarcador" de doença acelerada, talvez possamos selecionar uma população na qual os efeitos do tratamento sejam mais aparentes. Contudo, podemos também encontrar uma população, semelhante à de pacientes com FPI, na qual a fibrose resistente ao tratamento frustre ainda mais nossos esforços para encontrar uma cura.

Portanto, o pessimista em todos nós sugeriria que a realização de ensaios nessa população com faveolamento e doença rapidamente progressiva nós levará em direção à falha de tratamento em ES. Os otimistas insistirão que continuemos tentando encontrar todas as pistas que possam ajudar a estratificar o risco nessa doença problemática.


Chitra Lal
Médica.
Divisão de Terapia Intensiva e Pulmonar,
Alergia e Medicina do Sono
Universidade Médica da Carolina do Sul, Charleston, SC, EUA

Charlie Strange
Médico.
Divisão de Terapia Intensiva e Pulmonar, Alergia e Medicina do Sono
Universidade Médica da Carolina do Sul, Charleston, SC, EUA



Referências


1. Lopes AJ, Capone D, Mogami R, de Menezes SL, Guimarães FS, Levy RA. Systemic sclerosis-associated interstitial pneumonia: evaluation of pulmonary function over a five-year period. J Bras Pneumol. 2011;37(2):144-51.

2. Goh NS, Desai SR, Veeraraghavan S, Hansell DM, Copley SJ, Maher TM, et al. Interstitial lung disease in systemic sclerosis: a simple staging system. Am J Respir Crit Care Med. 2008;177(11):1248-54.

3. King TE Jr, Tooze JA, Schwarz MI, Brown KR, Chemiack RM. Predicting survival in idiopathic pulmonary fibrosis: scoring system and survival model. Am J Respir Crit Care Med. 2001;164(7):1171-81.

4. Hoyles RK, Ellis RW, Wellsbury J, Lees B, Newlands P, Goh NS, et al. A multicenter, prospective, randomized, double-blind, placebo-controlled trial of corticosteroids and intravenous cyclophosphamide followed by oral azathioprine for the treatment of pulmonary fibrosis in scleroderma. Arthritis Rheum. 2006;54(12):3962-70.

5. Tashkin DP, Elashoff R, Clements PJ, Goldin J, Roth MD, Furst DE, et al. Cyclophosphamide versus placebo in scleroderma lung disease. N Engl J Med. 2006;354(25):2655-66.

6. Silver RM, Warrick JH, Kinsella MB, Staudt LS, Baumann MH, Strange C. Cyclophosphamide and low-dose prednisone therapy in patients with systemic sclerosis (scleroderma) with interstitial lung disease. J Rheumatol. 1993;20(5):838-44.

7. Harrison NK, Myers AR, Corrin B, Soosay G, Dewar A, Black CM, et al. Structural features of interstitial lung disease in systemic sclerosis. Am Rev Respir Dis. 1991;144(3 Pt 1):706-13.

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