ABSTRACT
Objective: To determine the prevalence of asthma in a group of obese adult candidates for bariatric surgery and to evaluate the severity of asthma in this group of patients. Methods: This was a cross-sectional study involving 363 obese adults (body mass index ≥ 35 kg/m2) evaluated by a pulmonologist, using clinical evaluation as a diagnostic tool for asthma. All patients underwent clinical evaluation and spirometry and were divided into two groups (asthma and control). The patients with asthma were stratified by the severity of asthma. Results: The prevalence of asthma in the obese population studied was 18.5% (95% CI: 14.5-22.4). That prevalence was 20.4% (95% CI: 16.2-24.5) and 13.7% (95% CI: 10.1-17.2) in the women and the men, respectively. Asthma symptoms in the last twelve months were present in 8.0% (95% CI: 5.2-10.7), and the initial manifestation of asthma symptoms occurred during childhood/adolescence in 17.4% (95% CI: 13.5-21.3). In the asthma group, intermittent asthma was present in 29 patients (43.3%), mild persistent asthma in 7 (10.4%), moderate asthma in 25 patients (37.3%), and severe persistent asthma in 6 (9.0%). Conclusions: Using clinical evaluation as the diagnostic criterion, we found the prevalence of asthma to be high in this group of obese adults. Asthma was more common in females, and the initial manifestation of asthma symptoms more commonly occurred during childhood/adolescence. The severity of asthma in this group of obese adults was within the range of mean values predicted for the general population. Intermittent asthma, mild persistent asthma, and moderate persistent asthma predominated.
Keywords:
Asthma; Cross-sectional studies; Spirometry; Respiratory function tests; Obesity, morbid.
RESUMO
Objetivo: Determinar a prevalência de asma em um grupo de adultos obesos, candidatos a cirurgia bariátrica e avaliar a gravidade da asma neste grupo de pacientes. Métodos: Estudo transversal, envolvendo 363 pacientes obesos adultos (índice de massa corpórea ≥ 35 kg/m2) avaliados por um médico pneumologista, utilizando a avaliação clínica como instrumento diagnóstico de asma. Todos os pacientes foram submetidos à avaliação clínica e espirometria e foram divididos em dois grupos (asma e controle). Os pacientes com asma foram classificados conforme a gravidade da doença. Resultados: A prevalência de asma na população de obesos estudada foi de 18,5% (IC95%: 14,5-22,4). Essa prevalência nas mulheres e nos homens foi de 20,4% (IC95%: 16,2-24,5) e 13,7% (IC95%: 10,1-17,2), respectivamente. Havia sintomas de asma nos últimos doze meses em 8,0% (IC95%: 5,2-10,7), e houve manifestação inicial dos sintomas de asma na infância/adolescência em 17,4% (IC95%: 13,5-21,3). No grupo asma, asma intermitente estava presente em 29 pacientes (43,3%); asma persistente leve, em 7 (10,4%); asma moderada, em 25 (37,3%); e asma persistente grave, em 6 (9,0%). Conclusões: A prevalência de asma neste grupo de adultos obesos, utilizando-se a avaliação clínica como critério diagnóstico, mostrou-se elevada, com predomínio no sexo feminino e com manifestação inicial dos sintomas de asma na infância/adolescência. A gravidade da asma neste grupo de obesos adultos esteve entre os valores médios estimados para a população geral, com uma maior proporção de asma intermitente, asma persistente leve e asma persistente moderada.
Palavras-chave:
Asma; Estudos transversais; Espirometria; Testes de função respiratória; Obesidade; Obesidade mórbida.
IntroduçãoA asma é uma doença inflamatória crônica das vias aéreas inferiores, que resulta da interação entre fatores genéticos, exposição ambiental a alérgenos e irritantes e outros fatores específicos que levam ao desenvolvimento e à manutenção dos sintomas.(1,2)
A obesidade é uma doença inflamatória crônica sistêmica e é estabelecida como fator de risco para doenças cardiovasculares, síndrome da apneia-hipopneia obstrutiva do sono (SAHOS), diabetes mellitus, doenças músculo-esqueléticas e alguns tipos de câncer, além de afetar a função pulmonar.(3-9)
A prevalência de asma e obesidade tem aumentado nos últimos anos, com a obesidade alçando proporções epidêmicas em países desenvolvidos.(7,10,11) No Brasil, essas patologias têm se tornado um problema de saúde pública, onerando os custos de tratamento à saúde na assistência pública e privada.(1,8)
A maioria dos estudos de prevalência de asma tem sido realizada em populações infantis e adolescentes e tem se fundamentado principalmente no emprego de questionários, tais como International Study of Asthma and Allergies in Childhood (ISAAC) e European Community Respiratory Health Survey (ECRHS). Ambos os questionários demonstram uma ampla variação na prevalência de sintomas de asma entre os diferentes países e mesmo entre regiões de um mesmo país, e essa variação também tem sido observada no Brasil.(12,13)
Existem poucos estudos investigando a prevalência da asma na população adulta no Brasil,(12-15) e os questionários padronizados (ISAAC e ECRHS) não são utilizados em adultos de modo sistemático no Brasil.(12)
O estudo epidemiológico da asma em adultos oferece dificuldades adicionais, que incluem duração da doença, tipo e tempo de tratamento, exposição ocupacional e ambiental, tabagismo, comorbidades, entre outros.(12)
O diagnóstico de asma é clínico, e a chave diagnóstica está baseada em uma história clínica cuidadosa à procura de sintomas respiratórios sugestivos de asma, permitindo um diagnóstico razoavelmente certo ou alternativo.(1,2,16)
Devido ao fracasso no tratamento clínico convencional da obesidade (dieta, atividade física e uso de fármacos), tem crescido cada vez mais a indicação do tratamento cirúrgico para a obesidade.(8)
Uma vez que a prevalência de asma no pré-operatório de cirurgia bariátrica em adultos obesos não é conhecida em nosso meio, o objetivo do presente estudo foi determinar essa prevalência, utilizando a investigação clínica como instrumento diagnóstico, e avaliar a gravidade da asma nesse grupo de pacientes.
MétodosTrata-se de um estudo transversal, aberto, realizado na Universidade Federal de Sergipe, localizada no município de Aracaju (SE), no período entre janeiro de 2007 e junho de 2010. A pesquisa foi aprovada pelo comitê de ética em pesquisa da instituição, e um termo de consentimento livre e esclarecido foi obtido de cada um dos pacientes.
Os pacientes selecionados foram oriundos de uma instituição pública e de outra privada. Todos os pacientes foram encaminhados e avaliados consecutivamente, de acordo com a demanda do ambulatório, onde foram submetidos à avaliação clínica e à realização de espirometria para a avaliação de risco pulmonar no eventual tratamento cirúrgico da obesidade. Foram excluídos pacientes menores de 18 anos de idade e aqueles que não realizaram ou foram incapazes de realizar espirometria. Através de um questionário estruturado, foram avaliados os seguintes parâmetros: presença de comorbidades, presença atual ou prévia de pneumopatias, presença de dispneia, atividade física, tabagismo e procedência do paciente (instituição privada ou pública).
Considerando a prevalência de asma em crianças e adolescentes em 15-20%(1,17) e, em adultos,(13,14) em 5-10% em nosso meio, levantamos a hipótese de uma prevalência aumentada de asma na população adulta obesa. Foram utilizados para o cálculo do tamanho amostral(18) os seguintes parâmetros: prevalência estimada de asma em 20%, IC95%, erro amostral aceitável de 5% e acréscimo de 10% no tamanho da amostra para eventuais perdas e recusas. Definiu-se, portanto, uma amostra mínima de 290 pacientes.
A obesidade foi classificada conforme os critérios da Organização Mundial de Saúde pelo índice de massa corpórea (IMC), obtido através da equação peso/estatura2 (kg/m2), e as indicações para o tratamento cirúrgico da obesidade obedeceram às orientações da Organização Mundial de Saúde e do Ministério da Saúde do Brasil.(7,8) O peso corporal foi obtido com o indivíduo livre de roupas pesadas e calçado, e a estatura foi obtida utilizando-se um antropômetro acoplado à balança que preenchia os critérios de aferição de peso para obesos mórbidos.
Neste estudo foi utilizado o critério diagnóstico clínico de asma das IV Diretrizes Brasileiras para o Manejo da Asma,(1) realizado por um médico pneumologista na primeira consulta. A prevalência de asma foi determinada na população obesa estudada e em relação aos seguintes critérios: sexo, sintomas indicativos de asma nos últimos doze meses e idade da manifestação inicial desses sintomas (na infância/adolescência, até os 17 anos, ou a partir dos 18 anos de idade).
Na avaliação de pneumopatia atual ou prévia, foi investigada a presença de asma, bronquite alérgica, enfisema, DPOC, pneumonia, tuberculose ou qualquer outra doença que pudesse afetar a respiração. Os sintomas respiratórios avaliados foram sibilância, tosse, catarro, aperto no peito, ronco e dispneia. Investigou-se também o uso de medicações. Quando a resposta era afirmativa, determinava-se o tempo do início dos sintomas, sua duração e características.
As comorbidades investigadas no questionário eram asma, DPOC, SAHOS, hipertensão arterial, insuficiência coronariana, insuficiência cardíaca, diabetes mellitus, hipotireoidismo, doenças músculo-esqueléticas (osteoartrite na coluna vertebral, articulação coxofemoral e joelhos), depressão, ansiedade, doença do refluxo gastroesofágico, rinite alérgica, ou alguma outra doença referida pelo paciente como diagnosticada por um médico. Quando a resposta era afirmativa em relação a alguma patologia, o paciente era indagado quanto ao tempo do diagnóstico e às medicações em uso.
Em relação à atividade física regular, foi considerado não sedentário o indivíduo que realizasse atividade física regularmente, por, no mínimo, três vezes por semana, com um tempo mínimo de 30 min por sessão.
A espirometria foi realizada com um espirômetro computadorizado (modelo Microlab-3500; Micro Medical Ltd., Kent, Inglaterra) antes e após o uso de broncodilatador (salbutamol, 400 µg), com o paciente sentado e também utilizando um clipe nasal. A equação de referência de Hankinson et al.(19) foi utilizada para a espirometria, com as manobras expiratórias forçadas sendo realizadas por, no mínimo, três vezes e preenchendo os critérios de aceitabilidade e reprodutibilidade exigidos pelas atuais recomendações da Sociedade Brasileira de Pneumologia e Tisiologia,(20) sendo escolhida a melhor delas. Os valores foram expressos em litros e em porcentagem dos valores da normalidade.
Para efeito de análise estatística, os pacientes foram inicialmente divididos em dois grupos: grupo asma, para os portadores de asma brônquica, e grupo controle, para os demais pacientes. Em seguida, no grupo asma, foi verificado o resultado da espirometria (espirometria normal, distúrbio ventilatório obstrutivo, distúrbio ventilatório obstrutivo com redução da CVF, distúrbio ventilatório combinado e padrão sugestivo de distúrbio ventilatório restritivo). Para esse grupo, foi determinada a classificação da gravidade da asma segundo as IV Diretrizes Brasileiras para o Manejo da Asma.(1)
A análise estatística foi feita com o auxílio do software Statistical Package for the Social Sciences, versão 15 (SPSS Inc., Chicago, IL, EUA). Os resultados obtidos foram expressos em número de casos (proporção) e média ± dp. Foi realizado o cálculo do IC95% das prevalências avaliadas.
O teste do qui-quadrado e o teste t Student, respectivamente, foram utilizados para testar diferenças entre as variáveis categóricas e entre as variáveis contínuas. O nível de significância estatístico foi p ≤ 0,05, e todos os testes estatísticos foram bicaudais.
ResultadosForam encaminhados para avaliação pré-operatória 374 obesos adultos, residentes no estado de Sergipe. Desses, houve uma perda mínima, de 11 pacientes (2,9%), não havendo recusas. Foram incluídos neste estudo 363 obesos.
A Tabela 1 apresenta as características gerais da população estudada e compara os pacientes do grupo asma e controle. Não foram verificadas diferenças significativas entre os grupos quanto às características demográficas, características antropométricas, origem dos pacientes (privado/público), tabagismo, presença de dispneia, atividade física e comorbidades.
A prevalência de asma foi de 18,5% (IC95%:14,5-22,4) na população obesa estudada. Das 254 mulheres e dos 109 homens avaliados, 52 (20,4%; IC95%: 16,2-24,5) e 15 (13,7%; IC95%: 10,1-17,2) tinham asma, respectivamente. Sintomas de asma nos últimos doze meses foram referidos por 29 dos pacientes obesos estudados (8,0%; IC95%: 5,2-10,7), o que correspondeu a 43,3% dos 67 pacientes asmáticos. A manifestação inicial dos sintomas de asma na infância/adolescência foi referida por 63 pacientes (17,4%; IC95%: 13,5-21,3), e 4 pacientes (1,1%; IC95%: 0,02-2,10) referiram início de asma na vida adulta. Portanto, dos 67 pacientes asmáticos, 63 (94,0%) referiram início dos sintomas de asma na infância/adolescência. A Figura 1 descreve a prevalência de asma em adultos obesos, conforme os critérios utilizados, e os respectivos IC95%.
A Tabela 2 compara as variáveis espirométricas entre os grupos asma e controle. Não foram observadas diferenças significativas entre os grupos quanto a CVF pré e pós-broncodilatador. Os valores pré e pós-broncodilatador de VEF1, FEF25-75% e razão VEF1/CVF foram significativamente menores no grupo asma (p ≤ 0,0001).
Em nossa amostra, no grupo asma, quanto à classificação do tipo de distúrbio ventilatório pela espirometria, observou-se espirometria normal em 39 pacientes (58,2%), padrão sugestivo de distúrbio ventilatório restritivo em 16 (23,9%); distúrbio ventilatório obstrutivo em 6 (9,0%); distúrbio ventilatório combinado em 4 (6,0%); e distúrbio ventilatório obstrutivo com redução da CVF em 2 (3,0%). Em relação às variáveis espirométricas em % do previsto, 36 pacientes (53,7%) tiveram VEF1 ≥ 80%, 25 (37,3%) tiveram VEF1 de 60-79%, 6 pacientes (9%) apresentaram VEF1 ≤ 60%, e todos os pacientes apresentaram variação do VEF1 menor que 20% após o uso de broncodilatador. Quanto à classificação da gravidade de asma, realizada em conjunto com parâmetros clínicos, dos 67 pacientes do grupo asma, asma intermitente estava presente em 29 (43,3%); asma persistente leve, em 7 (10,4%); asma persistente moderada, em 25 (37,3%); e asma persistente grave, em 6 (9,0%). A Figura 2 apresenta a proporção de pacientes segundo a classificação da gravidade da asma.
DiscussãoO centro de todas as definições de asma é a presença de sinais e sintomas respiratórios sugestivos dessa patologia, reconhecidos através de uma investigação clínica cuidadosa, o que permite um diagnóstico razoavelmente certo de asma e a exclusão de diagnósticos diferenciais.(1,2,16) Não existe uma definição universalmente aceita e que englobe os diversos fenótipos da asma.(12,16) Na ausência de um padrão ouro para o diagnóstico de asma, o diagnóstico clínico permanece como o melhor método para o diagnóstico de asma.(1,2,16)
O presente estudo determinou a prevalência de asma, até então desconhecida, em um segmento da população brasileira adulta obesa, população essa que aumenta assustadoramente, sendo valorizado o diagnóstico clínico como instrumento diagnóstico, que foi realizado em todos os pacientes por um médico pneumologista na primeira consulta.
O importante sintoma de dispneia, utilizado em questionários escritos e na prática clínica para o diagnóstico de asma,(1,2) apresenta uma prevalência elevada na população obesa.(21) Em nosso estudo, encontramos uma prevalência de dispneia de 72,9%. Dessa forma, em obesos, uma avaliação clínica por um médico se faz necessária, procurando identificar outras causas de dispneia e melhor detalhar a presença, a periodicidade e a remissão dos sintomas respiratórios sugestivos de asma, haja vista a falta de especificidade dos sintomas indicativos de asma.
A prevalência de asma pode variar devido às distintas definições de asma, de acordo com a idade da população estudada (crianças e adultos) e dos diferentes instrumentos de medida (por exemplo, questionários escritos, diagnóstico médico, sintomas atuais e asma cumulativa), podendo-se, dessa forma, justificar as diferenças na prevalência de asma entre países e dentro de um mesmo país.(12,13,22)
O protocolo ISAAC, apesar do seu grande valor epidemiológico no estudo da prevalência de asma, é validado no Brasil para pacientes com idade entre 6 e 14 anos; entretanto, sua validação em adolescentes justifica sua aplicabilidade em adultos. Quanto ao questionário ECRHS, esse não é validado no Brasil e raramente tem sido utilizado.(13,15,23)
Em nosso meio, estudos anteriores de prevalência de asma em adultos demonstraram variabilidade de resultados conforme o instrumento diagnóstico utilizado. Madeira et al.(14) encontraram uma prevalência de asma em adultos de 7,3% no Distrito Federal. Macedo et al.,(13) utilizando diferentes critérios diagnósticos de asma em adultos, encontraram as seguintes prevalências: sintomas atuais, 6,0% (IC95%: 4,9-7,0); diagnóstico médico, 12,9% (IC95%: 11,4-14,4); e asma cumulativa, (autorreferida alguma vez na vida), 14,3% (IC95%: 12,7-15,8).
A análise comparativa da prevalência de asma em adultos com as de outras pesquisas, utilizando o diagnóstico médico como critério diagnóstico, revelou ser de 18,5% em nossa população de obesos, sendo superior às em Pelotas (12,9%), no Distrito Federal (7,3%) e em Bangladesh (3,5%).(13,14,22) Todavia, utilizando o relato de sibilos nos últimos doze meses, que é considerado o sintoma mais adequado para estimar a prevalência de asma,(24) foi demonstrada em nossa pesquisa uma prevalência de 8,0%, semelhante às de pesquisas anteriores, que relataram com esse critério diagnóstico prevalências de asma em adultos de 6%(13) e de 5,3% em adultos com idade entre 15 e 44 anos, assim como de 11%, quando acima dos 45 anos.(22) Esses dados valorizam a importância e a influência do tipo de critério diagnóstico utilizado para efeito de resultados na prevalência da asma em adultos.
A asma pode afetar o ser humano em qualquer idade, havendo predominância dos primeiros sintomas na infância/adolescência.(1,2,16) Em nossa pesquisa, observamos que 94% dos pacientes asmáticos iniciaram sua asma nessa faixa etária, e, dos 4 pacientes (6%) que iniciaram suas queixas na vida adulta, 3 estavam fazendo uso de betabloqueadores para hipertensão arterial.
A maior prevalência de asma em mulheres adultas obesas em nosso estudo pode ser explicada, teoricamente, pela maior prevalência de obesidade e asma no sexo feminino,(7,11) assim como pela maior procura por assistência médica e pela influência hormonal nas mulheres. Todavia, o papel do estrógeno em influenciar a inflamação das vias aéreas e sua interação com a leptina no cérebro, no tecido adiposo e na via aérea necessita de pesquisas futuras para sua melhor definição e esclarecimento.(10)
Não são todos os pacientes que cursam com apresentação clínica típica de asma; pacientes obesos podem apresentar sintomas respiratórios sugestivos de asma devido à obesidade, mas sem preencher os critérios fisiopatológicos de asma, gerando uma dúvida diagnóstica; nessas situações, a avaliação da função pulmonar pode ser necessária.(16,25)
A espirometria tem se tornando mais amplamente disponível, e por ser um exame prático, barato e praticamente isento de riscos, é o teste de escolha no auxílio diagnóstico de asma, caracterizando a obstrução ao fluxo aéreo e sua resposta ao uso de medicação broncodilatadora.(1,2,16) Os testes de broncoprovocação, apesar de sua importância para a decisão diagnóstica na prática clínica por apresentarem alta sensibilidade e elevado valor preditivo negativo para confirmar ou excluir o diagnóstico de asma, não têm sido indicados para o diagnóstico epidemiológico de asma, sendo indicados para pacientes sintomáticos respiratórios quando o diagnóstico clínico de asma é impreciso e a espirometria é normal.(1,2,16,20)
Em nossa amostra, todos os pacientes foram diagnosticados por critério clínico, e a espirometria não modificou a prevalência de asma previamente estabelecida, reforçando o conceito de que o diagnóstico de asma é fundamentado pela presença de sintomas respiratórios atuais ou prévios e justificando a ausência da espirometria em estudos de prevalência de asma. Todavia, a espirometria permanece sendo o principal método de escolha na determinação da limitação ao fluxo aéreo, no auxílio diagnóstico, na determinação da gravidade, na determinação do nível de controle e na monitorização terapêutica da asma.(1,2,16)
A obesidade, na ausência de pneumopatias, provoca efeitos mecânicos nos pulmões, reduzindo o volume pulmonar, a capacidade funcional e o diâmetro periférico das vias respiratórias.(5,6,10) Avaliando-se as variáveis espirométricas nos grupos estudados, observaram-se reduções significativas no VEF1, na razão VEF1/CVF e no FEF25-75% (antes e após o uso de broncodilatador) no grupo asma, expressando um maior comprometimento obstrutivo já esperado da função pulmonar em obesos com pneumopatias obstrutivas associadas.
Analisando a classificação da gravidade da asma em obesos com IMC ≥ 35 kg/m2 em nossa amostra, observamos que apenas 9% apresentavam asma persistente grave, havendo uma predominância de asma intermitente ou persistente leve e moderada (90%), semelhante à média estimada das gravidades de asma na população geral citada na literatura, que considera que 60% dos pacientes asmáticos sejam portadores de asma intermitente ou persistente leve; 25-30%, de asma moderada; e 5-10%, de asma persistente grave.(1) Existem controvérsias na literatura quanto à influência do aumento do IMC na gravidade da asma. Pelegrino et al. demonstraram ausência de correlação entre gravidade da asma e obesidade.(26) Em visão oposta, Akerman et al., avaliando obesos com IMC ≥ 30 kg/m2, demonstraram uma relação positiva entre o aumento da obesidade e piora da gravidade da asma.(27)
O fracasso dos tratamentos clínicos, assim como o sofrimento psíquico e orgânico causados pela obesidade, explica o interesse e a disposição dos obesos em querer realizar o tratamento cirúrgico da obesidade, justificando a ausência de recusas em nosso estudo.
Embora estudos demonstrem que a obesidade é um fator de risco independente para asma e que, recentemente, estudos indiquem também a obesidade como um fator independente para DPOC, os mecanismos básicos dessa associação em humanos ainda não estão estabelecidos.(3)
O envolvimento de diversos fenótipos da asma, a resposta inflamatória crônica de ambas as doenças e a influência dos hormônios da obesidade (leptina, adiponectina, resistina, citocinas, proteínas de fase aguda e outros mediadores) produzidos pelo tecido adiposo na relação entre asma e obesidade deverão ser mais bem esclarecidos em futuros estudos.(3,4,9)
Algumas limitações do nosso estudo devem ser citadas. Primeiro, por ser um estudo transversal, não podemos estabelecer uma associação entre obesidade e asma, apesar da condição inflamatória crônica e do aumento da prevalência de ambas. Segundo, apesar de as manifestações iniciais de asma terem ocorrido predominantemente na infância/adolescência e de esse relato ser novo na literatura em obesos adultos, nosso estudo é incapaz de determinar uma relação de causa e efeito, e não podemos concluir se a obesidade foi precedida de asma ou se a asma foi precedida pela obesidade. Apesar dessas limitações, nosso estudo desperta a atenção para a elevada prevalência de asma em uma população obesa adulta em avaliação pré-operatória para obesidade e valoriza o diagnóstico clínico realizado através de medidas simples e indispensáveis (anamnese e exame físico) para a boa prática médica.
Em conclusão, neste estudo, a prevalência de asma, em uma amostra de adultos obesos em avaliação pré-operatória de cirurgia bariátrica com IMC ≥ 35 kg/m2, utilizando-se o critério diagnóstico médico, mostrou-se elevada, com predomínio da manifestação inicial dos sintomas de asma na infância/adolescência e no sexo feminino. A gravidade da asma nesse grupo de obesos adultos esteve entre os valores médios estimados para a população em geral, com uma maior proporção de asma intermitente, asma persistente leve e asma persistente moderada.
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* Trabalho realizado na Universidade Federal de Sergipe, Aracaju (SE) Brasil.
Endereço para correspondência: Saulo Maia D'Avila Melo. Rua José Olívio do Nascimento, 82, Edifício Parque da Sementeira, apto. 201, Jardins, CEP 49025-730, Aracaju, SE, Brasil.
Tel. 55 79 3214-3593. Fax: 3214-3491. Email: smaia@infonet.com.br
Apoio financeiro: Nenhum.
Recebido para publicação em 28/10/2010. Aprovado, após revisão, em 13/4/2011.
Sobre os autoresSaulo Maia Davila Melo
Médico. Hospital Universitário, Universidade Federal de Sergipe; Preceptor da Residência de Clínica Médica, Hospital Geral Governador João Alves Filho Aracaju (SE) Brasil.
Valdinaldo Aragão de Melo
Professor Adjunto. Departamento de Medicina, Universidade Federal de Sergipe, Aracaju (SE) Brasil.
Raimundo Sotero de Menezes Filho
Médico Endocrinologista. Instituto da Previdência do Estado de Sergipe, Aracaju (SE) Brasil.
Antônio J. Alves Júnior
Acadêmico de Medicina. Universidade Federal de Sergipe, Aracaju (SE) Brasil.